Robert Parry, Consortium News
http://consortiumnews.com/2013/09/06/obamas-syrian-doomsday-machine/
Entreouvido na Vila Vudu:
O que aí se lê pode ser só delírio e excesso de ‘análise’. E pode não passar de ‘obamismo’ tresloucado. Mas o que aí se lê é a hipótese que mais bem explica os movimentos erráticos de Obama, cansativamente ‘analisados’ por ‘analistas’ fascistas burros e incompetentes como Demétrio Magnolli e William Waack & canalha adjunta.
A imprensa-empresa, por sua vez, aparece, mais uma vez, como TOTAL INUTILIDADE, na melhor das hipóteses; ou como ativa máquina de guerra, na pior.
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Mesmo com o presidente Barack Obama fazendo lobby no Congresso para obter autorização para guerra ‘limitada’ contra a Síria, há membros de sua equipe de segurança que contam com que a crise internacional possa ser usada para romper o impasse diplomático que pôs fim às conversações de paz para a Síria. Para tanto, contam com encurralar a Arábia Saudita.
Segundo esses assessores de Obama, a Arábia Saudita e, especialmente, o chefe da inteligência saudita, príncipe Bandar bin Sultan, revelaram-se como principais obstáculos a um cessar-fogo e às conversas de paz. Bandar, ex-embaixador saudita nos EUA e personagem muito bem relacionado, é visto como principal financiador dos islamistas jihadistas mais radicais que lutam para derrubar o governo sírio e rejeitam qualquer tipo de negociação. (Bandar admitiu ter-se encontrado com Osama bin Laden, líder da al-Qaeda, antes dos ataques de 11/9; e, depois do 11/9, foi ele quem coordenou os detalhes da rápida partida de membros da família de bin Laden, para fora dos EUA.)
Assim, o desafio seria hoje pressionar Bandar e os extraordinariamente ricos sauditas, para que sejam forçados a cooperar numa estratégia para cortar o fornecimento de armas e dinheiro para os jihadistas extremistas, o que forçará os ‘rebeldes’ a aceitar as negociações de Genebra-2 e criará possibilidades para um arranjo de partilha do poder entre o governo Assad e a oposição moderada.
Você não leu na imprensa-empresa norte-americana, mas o presidente Bashar al-Assad da Síria repetiu inúmeras vezes que aceitava participar de conversações de paz e analisar propostas para uma nova estrutura de governo. A oposição apoiada pelos EUA é que sempre se recusou a conversar e, para impedir as negociações, impôs várias e várias precondições.
Mesmo assim, a narrativa preferida da imprensa-empresa norte-americana sempre foi que o governo Obama deveria apertar a pressão militar sobre Assad, o que o ‘forçaria’ a aceitar as negociações – manchetes que combinam bem com a bem-amada fantasia de que os EUA seriam eternos pacificadores, contra ditadores sanguinários.
Por exemplo, o colunista Nicholas D. Kristof, do New York Times, é o mais recente “falcão liberal pró-guerra” a exigir que Obama bombardeie o governo sírio e assim contenha imediatamente as perdas que os ‘rebeldes’ estão sofrendo. Na 5ª-feira, Kristof escreveu que o regime Assad “tem obtido alguns sucessos na luta, e ataques aéreos o farão mais interessado em negociar alguma paz.”
Kristof e outros jornalistas que insistem em promover essa fantasia só fazem desinformar os norte-americanos, como tantos outros jornalistas fizeram há uma década, para forçar a invasão ao Iraque. Na Síria, a verdade é que os EUA não conseguiram convencer a oposição a negociar, depois que os russos persuadiram Assad.
Os líderes ‘rebeldes’ inventaram as mais diferentes desculpas para impedir o início de conversações de paz: antes, queriam que o governo dos EUA lhes fornecessem armamento sofisticado; depois ‘exigiram’ que os combatentes do Hezbollah se retirassem da Síria; depois, só aceitariam negociar quando estivessem em posição vitoriosa nos combates; depois, immpuseram como precondição para negociar a paz, que Assad renunciasse.
Em outras palavras, os vários grupos ‘rebeldes’, dos quais os combatentes mais efetivos são aliados da al-Qaeda, não querem conversações nem paz; preferem esperar que os EUA ou outro exército de fora seja arrastado para a guerra síria e force a deposição de Assad.
Mas essa via faria da Síria a nova fortaleza do terrorismo no Oriente Médio e abriria a via para o genocídio da minoria síria alawita, ramo do Islã xiita que inclui a família Assad. Cristãos sírios, aliados de Assad, também temem ataques violentos, no caso de os ‘rebeldes’ predominantemente sunitas prevalecerem, sobretudo os armênios, cujas famílias fugiram do genocídio na Turquia, há um século.
A possibilidade real de que haverá atrocidades se os ‘rebeldes’ depuserem Assad ressurgiu na 5ª-feira, com a distribuição de mais um vídeo que mostrava ‘rebeldes’ executando soldados sírios capturados, ao som de ameaças de que os alawitas seriam também eliminados. O presidente russo Vladimir Putin também citou vídeo que mostra um comandante ‘rebelde’ comendo vísceras de um soldado sírio assassinado.
Não “desperdiçar crises”
Embora muitos dos senhores/senhoras “durões” do governo Obama ainda insistam em lançar mísseis contra a Síria, para punir Assad por um ataque com armas químicas que lhe foi atribuído, acontecido dia 21/8, ainda há alguns poucos conselheiros que esperam conseguir impedir esse ataque, e que a urgência internacional possa ser dirigida, afinal, na direção de acordo pacífico para o conflito.
Seria uma versão geopolítica do adágio do ex-chefe de gabinete de Obama, Rahm Emanuel: “não se deve desperdiçar uma crise séria”.[1] Tenho informação de que Obama procurou recolher informação e opiniões também fora de seu círculo, sobre se a nova manobra teria chances de sucesso, depois que se viu preso nas cordas, onde ele mesmo meteu-se, com a conversa claudicante sobre “linha vermelha”, e por não ter dado a atenção devida ao agravamento da crise síria no início do ano.
Apesar do contato aparentemente gelado entre Obama e Putin no G-20 em São Petersburgo, o que se diz é que ambos estão trabalhando em perfeita harmonia sobre a questão síria – o que a imprensa-empresa dos EUA recusa-se a informar, ou talvez, mesmo, também a ver. Essa cooperação EUA-Rússia é considerada crucial para superar os muitos obstáculos que ainda há contra solução negociada para a guerra na Síria.
A principal e maior dificuldade que ainda impede as conversações de paz são as obstruções criadas por Arábia Saudita e Israel. Sauditas e israelenses, que operam uma aliança de fato em inúmeras questões regionais, do Egito ao Irã, veem ainda muitas vantagens na prorrogação da guerra na Síria.
Se a Arábia Saudita sonha com vitória arrasadora dos ‘rebeldes’ e com estado sírio governado por sunitas – o que romperia o atual “crescente xiita”, do Irã, por Iraque e Síria, até o Hezbollah libanês –, os israelenses preferem que a Síria continue a sangrar, sem que nenhum dos lados se possa declarar vencedor.
Como disse o New York Times na 6ª-feira, “o ataque limitado do Sr. Obama só tem um aliado estrangeiro crucial: Israel.” Na visão dos israelenses, se os EUA enviarem força militar para combater contra Assad, também o Irã ficará na defensiva, o que talvez apresse o dia em que os EUA atacarão também o Irã.
Além disso, além de uma Síria enfraquecida obrigar o Irã a aplicar mais recursos para salvar Assad, também o Hezbollah libanês pró-Assad teria mais trabalho e deixaria o Hamás mais isolado na Palestina. O Hamás aliou-se aos ‘rebeldes’ sunitas contra Assad, o que também pressiona seus antigos aliados: Síria, Irã e o Hezbollah.
A estranha aliança assim formada entre Israel e Arábia Saudita também se mantém no apoio ao golpe militar no Egito contra governo eleito da Fraternidade Muçulmana, com Mohamed Morsi. Os sauditas já jogaram bilhões de dólares para salvar a economia egípcia, e os israelenses usam seu lobby em Washington para impedir que os EUA cortem a ajuda militar à junta militar no Egito.
A Fraternidade Muçulmana é movimento de sunitas, mas populista demais para o gosto dos monarquistas sauditas. Os príncipes sauditas temem que a democracia avance na região e preferem, muito, ter regime autoritário no Egito. Simultaneamente, Israel beneficia-se com governo militar no Egito que voltou a fechar a fronteira com Gaza, governada pelo Hamás. A Israel muito interessa poder ditar os termos de qualquer eventual paz a um movimento palestino enfraquecido.
Ameaçar com o Apocalipse
Nesse quadro, Obama parece estar vendo que são mínimas as chances de que um ataque militar dos EUA, que desestabilizará ainda mais a Síria, consiga romper esse paredão geopolítico contra a paz na região. A estratégia não conquistou a maioria das opiniões, apesar de Obama ter-se exposto como defensor.
Mas, para desmontar esse quadro, Obama tem de encontrar meio para forçar Bandar e os sauditas a desistir do apoio financeiro e militar que dão aos sunitas jihadistas na Síria, ao mesmo tempo em que convence os israelenses a ‘domar’ o poder que têm em Washington. Uma das vias consideradas foi convocar o ex-presidente George W. Bush, amigo íntimo de Bandar, para que agisse como intermediário.
Mas, por razões da política doméstica, Obama entende que tem de manter a imagem pública de que seu principal problema seria o governo Assad, para poder manter a pressão contra os sauditas. Essa hipótese explica, pelo menos, por que Obama ainda insiste em culpar Assad pelo ataque com armas químicas, enquanto as dúvidas sobre a qualidade da inteligência dos EUA só aumentam dia a dia.
O incidente em Ghouta, subúrbio de Damasco ocorreu há mais de duas semanas, e até agora não há qualquer prova consistente que prove alguma culpa de Assad e suas forças. Todos os detalhes são considerados sigilosos, só comunicados a membros dos Congressos, conhecidos e reconhecidos pela incapacidade para avaliar adequadamente esse tipo de acusação.
E, ao mesmo tempo em que o governo dos EUA é rápido ao inculpar Assar, não dá qualquer sinal de considerar outras provas – que apontam na direção oposta, e parecem já ter comprovado suficientemente que os ‘rebeldes’ usaram o gás sarin no ataque do dia 21/8. (...)
Falta, em todos os casos, que o governo Obama enfrente a questão de esclarecer como os ‘rebeldes’ obtiveram aquele gás sarin. Até os documentos oficiais do governo Obama fogem dessa questão: “Avaliamos que o cenário no qual a oposição teria executado o ataque de 21/8 é altamente improvável” – diz um dos documentos oficiais. “Nossas fontes de inteligência na área de Damasco não detectaram nenhum sinal antes do ataque de que grupos de oposição planejassem usar armas químicas.”
Ora! Por que as agências de inteligência dos EUA empregariam esse fraseado, investindo na ‘baixa probabilidade’ de um ataque dos ‘rebeldes’, se pudessem afirmar, com razoável certeza, que os ‘rebeldes’ não tinham acesso a armas químicas, e ponto final? O profundo envolvimento da inteligência saudita na Síria, isso sim, torna altíssima a probabilidade de que os ‘rebeldes’, sim, tivessem acesso àquelas armas ilegais.
Mas, ao mesmo tempo, esse profundo envolvimento dos sauditas torna também ainda mais difícil desmontar a operação de Bandar. A verdade é que Obama praticamente não tem elementos que possa usar contra Bandar, além de repetir que uma intervenção militar dos EUA na Síria pode facilmente escapar a qualquer controle, levando à interrupção no fornecimento de petróleo e a uma crise financeira global. Mas, dados os vastos portfólios dos reis sauditas, sabe-se que podem suportar pesadas perdas, como já se viu acontecer no colapso de Wall Street em 2008.
Nesse sentido, tudo sugere que o que Obama criou, no seu ‘cronograma’ para bombardear a Síria, foi uma espécie de “máquina do Apocalipse”, algo que pode gerar grave instabilidade econômica e geopolítica no mundo, se não for desarmada a tempo. E, se o Congresso autorizar o ataque e ligar a “máquina”, o momento “apocalipse” pode acontecer já nas próximas semanas.
Ou, alternativamente, o temor desse “apocalipse” conseguirá persuadir os sauditas e Bandar de que seus interesses econômicos mais amplos superam o furor sectário e a ânsia de causar sempre maior sofrimento ao Irã e seus aliados na Síria.
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