Cobiça sobre o petróleo nacional, invasão à privacidade da presidente da República e instabilidade no diálogo bilateral marcam estadia de Barack Obama na Casa Branca frente ao Brasil; nova embaixadora americana em Brasília, Lilian Ayalde é uma provocação de per si; em 2010, ela teve de justificar ao governo do Paraguai, onde chefiou a missão americana, informações sobre espionagem do país a candidatos a presidente; ali, com Lilian na embaixada, golpe parlamentar depôs em 72 horas presidente em exercício Fernando Lugo; na véspera da resposta de Obama a exigência de explicações feita por Dilma, nota oficial de espião-chefe James Clapper dá o tom sobre o que pode vir: "Não é segredo que coletamos informações sobre assuntos econômicos e financeiros"; aumento da importância do Brasil no mundo leva americanos a mandarem às favas as boas relações; muy amigo!
10 DE SETEMBRO DE 2013 ÀS 18:26
247 – Em 2010, quando era embaixadora dos Estados Unidos no Paraguai, a hoje embaixadora americana em Brasília, Lilian Ayalde, foi chamada pela chancelaria do país vizinho para explicar denúncias publicadas no site Wikileaks de que o serviço de espionagem dos EUA havia monitorado e feito perfis de todos os candidatos a presidente do país, entre eles o que efetivamente venceu as eleições, Fernando Lugo. Dois anos depois, ela continuava no comando da representação americana em Assunção quando Lugo foi deposto por um golpe parlamentar em menos de 72 horas entre acusação, julgamento e condenação. Ela assumiu o cargo em Brasília na semana passada.
No domingo 8, em meio à compreensível irritação do governo brasileiro diante das informações de que a Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA haviam invadido os computadores da Petrobras para extrair informações sobre o pré-sal, o diretor da NSA, James Clapper, emitiu nota oficial que registrava na primeira linha: "Não é segredo que a Comunidade de Inteligência coleta informações sobre assuntos econômicos e financeiros e sobre financiamento ao terrorismo" (íntegra abaixo). Uma espécie de dar de ombros às reclamações brasileiras.
Olhos nos olhos da presidente Dilma Rousseff, em encontro a parte durante a reunião do G20, o presidente Barack Obama afirmou que não sabia de nada sobre a invasão eletrônica feita pela NSA tanto nos computadores da estatal brasileira de petróleo como, conforme denúncia anterior, na correspondência pessoal e profissional de sua colega brasileira. Prometeu informações oficiais para a quarta-feira 11.
Que não se espera de Obama nenhum mea culpa. Como deixou claro o espião-chefe Clapper, os EUA não se importam que o mundo saiba que sua prática política inclui "sobre assuntos econômicos e financeiros". Em sua nota, ele separou as coisas, completando "e sobre financiamento ao terrorismo". Dois temas, duas espionagens. O mesmo discurso havia sido sustentado, no final do mês passado, em viagem oficial ao país, o secretário de Estado John Kerry, o jovem dos anos 1970 que era contra a guerra do Vietnã e que, agora, tornou-se arauto dos bombardeios à Síria.
Com a cobiça demonstrada pela espionagem ao petróleo brasileiro, a desconfiança revelada pelo monitoramento à Dilma e o desplante praticado pela nomeação de uma embaixadora que assistiu de perto, possivelmente sendo atora importante, um golpe contra um presidente de país vizinho, os Estados Unidos estão mandando um recado claro ao Brasil: o patamar das relações diplomáticas mudou. E mudou para um nível bem mais baixo do que antes.
De aliado incondicional e estratégico nos tempos da ditadura militar, o Brasil passou a ser visto pelos EUA, nas últimas décadas, como um poderoso adversário nos organismos multilaterais de negociação e decisão. Com um discurso ajustado às reivindicações do países em desenvolvimento, a diplomacia brasileira galgou, nesses últimos 20 anos, novos espaços, chegado ao auge de vencer uma eleição para o comando da influente Organização Mundial do Comércio (OMC). Antes desse clímax, o país já assumira papéis antagônicos ao dos EUA em diversos outros momentos, inclusive na negação de autorização, na ONU, para a invasão ao Iraque.
Em lugar de ajustar o diálogo de maneira civilizada, os EUA de Barack Obama engataram uma marcha à ré. Neste sentido, a embaixadora Ayalde pode ser a versão século 21 do tristemente famoso Lincoln Gordon, o embaixador americano que pilotou, na frente internacional, o golpe militar de 1964.
É senso comum, na diplomacia brasileira, que presidentes republicanos tradicionalmente se mostram mais simpáticos ao Brasil do que líderes democratas. Não se imaginava, porém, que sob a chefia de um presidente que se podia considerar progressista, os relações diplomáticas entre os dois países fossem jogadas ao nível mais baixo em muito tempo. O diálogo, a partir das revelações de espionagem, simplesmente cedeu lugar para a espionagem. Onde havia um país amigo, o que se vê agora é uma nação cujo comportamento é o de adversário político e comercial.
Sem uma resposta convincente sobre os métodos, os motivos e os fins da espionagem praticada contra o Brasil, assim como medidas correspondentes para determinar o fim dessa prática, tudo o que Obama vai ganhar é a frieza e o distanciamento de um decepcionado Brasil. Se era para estragar anos de trabalho para a reconstrução de um relacionamento cordial e honesto entre os dois países, Obama com sua política externa feita às escuras está fazendo tudo certo.
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