segunda-feira, setembro 02, 2013

que a espionagem dos EUA tem a ver com a Globo, as teles, o Marco Civil e o Paulo Bernardo

por Renato Rovai em Política


Este fim de semana foi, digamos assim, curioso do ponto de vista da Globo. De um lado a emissora reconheceu que não deveria ter dado “apoio editorial” à ditadura militar, mas fez um zigue-zague imenso pra chegar nesse ponto tímido da auto-crítica depois de 39 anos do golpe. Em um dos momentos do editorial, teve a cara-de-pau de dizer que Roberto Marinho protegia os “seus comunistas”. Como se a Rede Globo não tivesse sido uma das sócias investidoras que mais recebeu dividendos de todos os horrores que foram realizados no Brasil durante mais de 20 anos.

A Globo era um grupo de comunicação menor antes do golpe. E ao seu final era um império. Durante o governo Sarney chegou a nomear ministros da economia. Se alguém dúvida, perguntem ao Mailson da Nóbrega como foi essa história. E em 1989 elegeu um presidente da República.

Mas se é verdade que a Globo era sócia investidora da ditadura também é verdade que os EUA eram os maiores interessados em tudo que acontecia por aqui.

Enquanto a Globo lucrava no varejo, os EUA lucravam no atacado. E a subserviência brazuca aos EUA era um projeto que tinha na Globo seu principal aliado.

Por isso é até curioso que o Fantástico de ontem tenha revelado provas apresentadas por Snowden de que o governo de Obama grampeou Dilma e o governo brasileiro. Algo que não é exatamente novidade. O governo dos EUA e a CIA sempre tiveram agentes secretos e colaboradores em todas as partes do mundo para coletar informações acerca dos países que por algum motivo representassem algum tipo de “risco” aos interesses do império.


Imagem de divulgação mostra CIA no controle do mundo

A questão é que hoje os EUA grampeiam de maneira moderna os nossos governantes. E de certa maneira com a conivência deles. O professor Sérgio Amadeu, por exemplo, demonstrou em recente estudo que ao instalar o Windows nos seus computadores, os ministros brasileiros estão autorizando a Microsoft a espionar de forma autorizada suas comunicações. Mas mesmo assim o software livre é defenestrado nos governos. O dinheiro que se gasta no Brasil com softwares proprietários poderia ser utilizado para investir num amplo programa de tecnologia nacional. É muito, mas muito dinheiro.

Acontece que nossos governantes parecem ignorar ou fazem de conta que ignoram que a internet é uma tecnologia de controle. E por isso é fundamental ter regramentos claros para impedir que o controle seja exercido de forma ilegal a partir dela.

Se o governo brasileiro não quiser que os fluxos informativos de seus interesses e do interesse dos seus cidadãos sejam utilizados de forma ilegal, o que é preciso fazer com urgência é aprovar um Marco Civil da Internet onde isso seja ponto central. Em que a neutralidade da rede e a privacidade do cidadão sejam garantidas com base em lei. Exatamente o contrário do que tem sido defendido pelo ministro da Comunicações, Paulo Bernardo, que entende a internet na esfera dos negócios e não dos direitos. Dos negócios que permitirão às teles, quase todas de capital estrangeiro, se adonar de todos as nossas conversas e interações. Se adonar de toda a possibilidade inventiva do povo brasileiro, já que é pela internet que hoje já passam boa parte das nossas produções culturais, educacionais, informativas etc. Já que será pela internet que boa parte da nossa soberania como país existirá ou deixará de existir.
Mas o que tem feito o ministério das Comunicações do ponto de vista estratégico? Tem fortalecido à inovação e a produção nacional ou têm feito acertos para garantir que o capital estrangeiro se fortaleça? Quanto o governo brasileiro investiu para que o país esteja disputando na área de hardwares e softwares de comunicação nos últimos anos? Quais são os programas para que universitários empreendam e disputem o mundo a partir da criação na sociedade da informação?

O grampo de Dilma precisa ser visto também neste contexto. Nas relações internacionais vale o “quem pode mais chora menos”. Não é na base do discurso que os homens bons se rendem aos argumentos. Diplomacia é demonstração de força e não de gogó.

Não vai ser com um programa entreguista nesta área que vamos conseguir ter voz global. O governo dos EUA vai ouvir os reclamos do Brasil e vai responder dizendo que em nome da segurança do seu povo e dos interesses do seu país vai continuar investigando quem achar que deve investigar. E como toda a nossa circulação de informação passa pelas tecnologias deles, vamos ter que fazer bico e continuar reclamando. No máximo.

Quanto a Globo, o pirão desandou lá pelas bandas do Jardim Botânico. A Globo percebeu que o Google, o Facebook e Youtube que entregam nossos dados pro governo Obama são seus inimigos da vez. Claro, junto com as teles. E que ela precisa buscar novos aliados para não perder muito do seu poder e das suas verbas publicitárias nos próximos anos.

E por isso os filhos do Roberto Marinho foram visitar o Lula. Eles querem o Lula na presidência porque acham que ele teria força pra enfrentar os grandões de lá. E que poderia encarar o Obama ou quem estiver de plantão na Casa Branca para defender não o povo brasileiro, mas os interesses dos nossos grupos de comunicação, como a Globo.

Parece uma loucura o raciocínio, mas a Globo sabe que não poderá brincar nos próximos anos. Ou vai ver seu patrimônio esfarelar.
E aí que o governo Dilma passa a ter uma janela de oportunidade para construir uma mudança completa na nossa regulação da comunicação. Mas para isso precisaria ter alguém com credibilidade e grandeza para operar esse projeto. Não, com todo o respeito, um Paulo Bernardo. Que vai para Veja xingar o seu partido e os militantes da área que dirige num momento em que mais de 1 milhão estavam nas ruas protestando.

O momento é muito oportuno para se construir um grande acordo que faça com que o Brasil se defenda dos grandes grupos internacionais e ao mesmo tempo amplie a democratização na área das comunicações e se desenvolva tecnologicamente. Mas isso não vai se conseguir no gogó. E nem xingando os aliados.

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