Haroldo Lima
A meta do desenvolvimento volta a polarizar amplos setores sociais, como em outras épocas. O governo federal tenciona suas forças para superar obstáculos incrustados na política econômica, o que não tem sido fácil. Divergências estão presentes, inclusive na definição do rumo do desenvolvimento. Mas sobressai a oportunidade, que não se quer perder, de um desenvolvimento diferente, com inclusão social, diminuição das desigualdades, respeito ao meio ambiente, integração sul-americana, política externa independente.
Esse desenvolvimento deve dar respostas inovadoras a grandes desafios, que precisam ser dimensionados. Um deles é o da expansão da base energética do Brasil.
Segundo a Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês), os países do mundo consomem por ano, em média, 1,86 tep/hab (tonelada equivalente de petróleo por habitante). Acima e abaixo deste índice estão os mais e os menos desenvolvidos. Os países do OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), os mais ricos do mundo, consomem 4,39 tep/hab por ano, em média; os da União Europeia ficam com 3,22 tep/hab no mesmo período, enquanto o Canadá e os Estados Unidos, no topo da lista, registram 9,7 e 7,1 tep/hab anuais, respectivamente.
Os integrantes do BRICS têm, entre si, situações bem diferenciadas. Quem nesse bloco consome mais energia é também quem consome mais energia no mundo: a China. Apesar disso, por ter a maior população do planeta, seu índice de consumo energético fica em 1,81 tep/hab por ano, um pouco abaixo da média mundial. Por razões semelhantes, a Índia tem 0,59 tep/hab por ano, enquanto a Rússia, com menor população, tem 4,95 tep/hab anuais, e a África do Sul, 2,74 tep/hab por ano.
O Brasil aparece com 1,36 tep/hab ao ano, segundo dados de 2010 do IEA, ou com 1,41 tep/hab ao ano, pelo balanço de 2012 da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Em qualquer hipótese, está bem abaixo da média
mundial. Para chegar ao nível de país desenvolvido, o Brasil deveria evoluir do atual 1,36 tep/hab por ano, para algo próximo aos 3 tep/hab anuais, ou seja, mais que dobrar esse índice.
Esta é uma meta audaciosa, sobretudo se levarmos em conta que, entre 2010 e 2011, o consumo de energia no Brasil aumentou acanhados 2,6%, abaixo do aumento de 2,7% do Produto
Interno Bruto, que por sua vez foi muito discreto. Mas, na década de 1990, esse índice foi superior aos 3%, batendo em 4,6% em alguns anos. Por isso, sem contar com impulso adicional, é uma simulação aceitável a que prevê a reedição demorada da marca média de 3% do crescimento do consumo energético no Brasil, o que poderia nos levar ao índice de 3 tep/hab ao ano, em 26 anos.
Ao colocarmos a expansão da disponibilidade energética como meta a ser perseguida, problemas se colocam.
Inicialmente, o de correlacionar esse objetivo com outro, diametralmente oposto, o de rebaixar o consumo de energia, pelo qual se empenham alguns países. Na verdade, os países que assim procedem tem consumo energético altíssimo e procuram elevar sua eficiência energética, sem prejuízo dos padrões já alcançados. Esse não é um problema nosso.
Depois, há o risco da distorção da nossa matriz energética. A meta da expansão da oferta de energia é imprescindível ao desenvolvimento, mas de forma alguma desobriga o Estado de regular e controlar com rigor a sustentabilidade energética que resulta da conjugação de três fatores: o uso simultâneo de diversas fontes energéticas, o emprego de fontes disponíveis e a abertura para fontes limpas. Hoje, nossa matriz é das mais limpas do mundo, exatamente porque conta com esses três requisitos.
Surge a questão dos recursos de que a nação dispõe para que essa arrancada energética seja sustentada. Ter 61% da nossa produção energética provenientes de fontes renováveis (hidráulica e biomassa) constitui uma retaguarda segura para a expansão requerida, por ser toda ela nacional e flexível, passível de crescimento. Além do mais, outras fontes limpas, como a eólica e a solar, tem conseguido incrementos muito elevados nos últimos anos. E não se pode perder de vista pesquisas e experiências pioneiras em curso sobre aproveitamento das marés, carros elétricos etc.
Mas a flexibilidade dessas fontes renováveis tem limites, físicos, ambientais e tecnológicos, e a extensão de seu emprego demanda tempo de maturação. Daí o realce diferencial do pré-sal.
É bem decantada a pujança extraordinária dessa província petrolífera recém-descoberta. Mas não é só. O desenvolvimento do pré-sal implicará na mobilização de grandes e numerosos empreendimentos, direta ou indiretamente envolvidos em sua exploração. Segundo a diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Magda
Chambriard, envolverá 12 a 18 plataformas, 60 a 90 navios de apoio e investimentos em infraestrutura da ordem de R$ 130 bilhões. Como, há poucos anos, nada disto existia,
segue-se que, com esse “reforço adicional”, a simulação feita acima, do crescimento do consumo energético na base dos 3%, poderá ser significativamente alterada, o que poderá antecipar nossa chegada a um patamar de país desenvolvido, se medidas de outra natureza também forem tomadas.
Haroldo Lima – é consultor na área de petróleo e foi diretor-geral da ANP.
Nenhum comentário:
Postar um comentário