terça-feira, março 30, 2010

“PM embarcou em Osasco no ônibus dos professores; é um P2″



Será que esse indivíduo não estudou em escola pública?

Isabel Azevedo Noronha, presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) recebeu nesta segunda-feira, logo cedo, uma ligação de um colega da subsede de Osasco: “Aquele rapaz que socorreu a policial é um professor daqui da cidade. Nós vamos encontrá-lo, para esclarecer tudo isso”.

Diretores de subsede da Apeoesp de Osasco passaram a manhã e a tarde investigando. Lembravam-se de tê-lo visto em Osasco em meio aos professores. Conferiram listas dos que vieram para a assembleia da sexta-feira, 26 de março, no Palácio dos Bandeirantes. Conversaram com muitos colegas.

No começo desta noite descobriram que o suposto professor é um policial militar do serviço reservado (ou secreto) da Polícia Militar paulista. É um P2, como são chamados.

A caráter para não levantar suspeitas (garotão barbado, jeans, mochila nas costas), o jovem policial infiltrado embarcou no ônibus dos professores de Osasco, como se fosse um deles. Daí o pessoal da subsede de Osasco ter achado inicialmente ele que era um colega.

A descoberta da Apeoesp derruba três versões oficiais da PM paulista.

A primeira, no sábado, a Terra Magazine, de que o PM não-identificado “era um dos policiais da região, que estavam empenhados na operação” .

As outras duas são de hoje. Ao Viomundo, disse que o policial militar à paisana “estava no local”. A Terra Magazine, informou que ele estava “passando” pela manifestação.

Aos poucos a verdade sobre a foto famosa da manifestação dos professores vai se revelando. Mas ainda há muitas perguntas sem respostas. Por exemplo, qual era a missão dele na assembleia dos professores? Levantar informações sobre o andamento do movimento? Fazer provocação? Ou o quê? A mando de quem? Qual a intenção? Criminalizar a Apeoesp?

“A partir dessa noite uma das hipóteses que passamos a considerar é a de armação para sensibilizar a sociedade e jogá-la contra os professores”, lamenta a presidente da Apeoesp. “A figura da policial feminina, frágil, indefesa atacada por nós, professores, uns bárbaros. Curiosamente o capacete dela está direitinho. A roupa alinhada, como se tivesse saído da lavanderia. Para quem levou uma paulada, como disse a PM, é estranho. Os dois muito arrumadinhos, ajeitadinhos…Esquisito demais. ”

“O fato é que seremos mais rigorosos na fiscalização de quem entra nos nossos ônibus ”, cogita Isabel Noronha. “Talvez passemos a exigir o holerit, para ter certeza de que aquela pessoa é professora mesmo e essa história não se repita.”

por Conceição Lemes



COMENTÁRIO E & P

Em qualquer país do mundo em que a imprensa não esteja comprada e seja parte de um projeto ideológico mercantil de um governo que só destruiu o Estado de São Paulo iria exigir a renúncia do governador. José Serra virou o ditador de São Paulo. a imprensa não repercutirá o fato dele ter mandado policiais à paisana para causar tumulto e depois jogar a culpa nos professores. Serra deveria ser destituído do governo. Mas o Estado vive em exceção, o governador pode tudo, que será blindado pela mídia e não será questionado pelo Ministério Público do Estado. É isso que os tucanos e elite paulista querem para o país? Um governo incompetente, fadado em factóides e mentiras que só prejudicam o cidadão paulista?

Será que esse indivíduo, que recebe dinheiro como policial para proteger o cidadão, não estudou em escola pública? Com seu salário como P2 ele pode manter seu filho numa escola particular ou um dos professores que estava nessa manifestação pode ser o mesmo que leciona para seu filho? Ele tencionava assim como as SS nazistas provocar tumulto para dar motivo para a Polícia Militar reprimir os professores?

Serra depois de copiar os métodos de goebbels na imprensa agora quer continuar usando os demais métodos de Hitler?

É vergonho, perceber essa degeneração da civilização brasileira. É ISSO.

segunda-feira, março 29, 2010

Tenham uma linda guerra, rapazes






por John Pilger


Aqui vão notícias da Terceira Guerra Mundial. Os Estados Unidos invadiram a África. Tropas estado-unidenses entraram na Somália, estendendo a sua frente de guerra desde o Afeganistão e o Paquistão até o Iémen e agora o Corno da África. Como preparativo para um ataque ao Irão, foram colocados mísseis americanos em quatro estados do Golfo Pérsico e dizem que estão a chegar bombas destruidoras de "bunkers" à base dos EUA na ilha britânica de Diego Garcia, no Oceano Índico.

Em Gaza, a população abandonada e doente, principalmente crianças, está a ser sepultada atrás de muralhas subterrâneas fornecida pela América a fim de reforçar um cerco criminoso. Na América Latina, a administração Obama assegurou sete bases na Colômbia, para travar uma guerra de atrito contra as democracias populares na Venezuela, Bolívia, Equador e Paraguai. Enquanto isso, o secretário da "defesa" Robert Gates queixa-se de que "o público [europeu] em geral e a classe política" são tão opositores à guerra que eles constituem um "obstáculo" à paz. Lembre-se de que este é o mês do Coelho Louco [1].

Segundo um general americano, a invasão e ocupação do Afeganistão não é tanto uma guerra real e sim uma "guerra de percepção". Portanto, a recente "libertação da cidade de Marja" da "estrutura de comando e controle" do Talbian foi pura Hollywood. Marja não é uma cidade, não havia comando e controle Taliban. Os libertadores heróicos mataram os civis do costume, os mais pobres dos pobres. De qualquer forma, foi fraude. Uma guerra de percepção é feita para proporcionar notícias falsas para a gente lá de casa, para fazer uma aventura colonial fracassada parecer valiosa e patriótica, como se o filme Estado de Guerra [2]fosse real e cortejos de caixões envoltos em bandeiras através da cidade de Wiltshire, vindos de Wooten Basset [3]não fossem um exercício de propaganda cínico.

"Guerra é diversão", costumavam dizer com ironia negra os soldados no Vietname, o que significava que se a guerra fosse desvendada como não tendo qualquer finalidade senão justificar o poder voraz fanaticamente à procura de lucros, como o da indústria de armamento, havia o perigo de a verdade ser revelada. Este perigo pode ser ilustrado pela percepção liberal de Tony Blair em 1997 como alguém "que quer criar um mundo [onde] a ideologia se tenha rendido inteiramente aos valores" (Hugo Young, The Guardian ) comparada com a avaliação pública de hoje como um mentiroso e uma guerra criminosa.

Os estados guerreiros ocidentais, tais como os EUA e a Grã-Bretanha, não estão ameaçados pelos Taliban ou quaisquer outros membros de tribos introvertidos em lugares remotos, mas pelos instintos anti-guerra dos seus próprios cidadãos. Considerem-se as sentenças draconianas legadas a multidões de jovens que em Janeiro últimos protestavam contra o assalto de Israel a Gaza. A seguir a manifestações nas quais a polícia paramilitar encurralou milhares, réus primários receberam dois anos e meio de prisão por delitos menores que normalmente implicariam sentenças leves. Em ambos os lados do Atlântico, discordância séria a revelar guerra ilegal tornou-se um crime sério.

O silêncio em outros altos lugares permite esta moral travestida. Através das artes, literatura, jornalismo e do direito, as elites liberais, tendo corrido para longe dos resíduos de Blair e agora de Obama, continua a exibir a sua indiferença para com a barbárie e os objectivos dos crimes dos estados ocidentais ao promoverem retrospectivamente as maldades dos seus demónios de conveniência, como Saddam Hussein. Com Harold Pinter já falecido, tente compilar uma lista de escritores, artistas e advogados famosos cujos princípios não sejam consumidos pelo "mercado" ou neutralizados pela sua celebridade. Quem entre eles falou acerca do holocausto no Iraque durante quase 20 anos de bloqueio e assalto letais? E tudo isto foi deliberado. Em 22 de Janeiro de 1991, a US Defence Intelligence Agency previu com pormenor impressionante como um bloqueio destruiria sistematicamente o sistema de água potável do Iraque e conduziria a "incidências acrescidas, se não a epidemias de doença". De modo que os EUA começaram por eliminar a água potável para a população iraquiana: uma das causas, como observou a Unicef, das mortes de meio milhão de crianças iraquianas com menos de cinco anos. Mas este extremismo aparentemente não tem nome.

Norman Mailer certa vez disse acreditar que os Estados Unidos, na sua busca incessante de guerra e dominação, entrou numa "era pré-fascista". Mailer parecia hesitante, como se tentasse advertir acerca de alguma coisa que ele mesmo não podia definir bem. "Fascismo" não está correcto, pois invoca precedentes históricos inadequados, recorrendo mais uma vez à iconografia da repressão alemã e italiana. Por outro lado, o autoritarismo americanos, como apontou recentemente o crítico cultural Henry Giroux, é "mais matizado, menos teatral, mais astucioso, menos preocupado com modos repressivos de controle do que com modos manipulativos de consentimento".

Isto é o americanismo, a única ideologia predatória que nega ser uma ideologia. A ascensão de corporações tentaculares que são ditaduras em si próprias e de uma instituição militar que é agora um estado com o estado, ajusta-se por trás da fachada da melhor democracia que os 35 mil lobbystas de Washington pode comprar e uma cultura popular programada para divertir e imbecilizar, é sem precedentes. Mais matizado talvez, mas os resultados são tanto não ambíguos como familiares. Denis Halliday e Hans von Sponeck, responsáveis superiores das Nações Unidas no Iraque durante o bloqueio conduzido pelos americanos e britânicos, não têm dúvida de que testemunharam genocídio. Eles não viram câmaras de gás. Insidiosa, não declarada, apresentada mesmo de forma astuciosa como avanço do iluminismo, prossegue a Guerra do Terceiro Mundo e o seu genocídio, ser humano por ser humano.

Na próxima campanha eleitoral na Grã-Bretanha, os candidatos referir-se-ão a esta guerra só para louvar os "nossos rapazes". Os candidatos são múmias políticas quase idênticas amortalhadas na Union Jack e na Stars and Stripes. Como demonstrou Blair um tanto demasiado entusiasticamente, as elites britânicas amam a América porque a América permite-lhes insultar e bombardear os nativos e considerar-se um "parceiro". Deveríamos interromper a sua diversão.



25/Março/2010
NT
[1] March Hare: Referência a personagem de Alice no país das maravilhas, de Lewis Carroll.
[2] The Hurt Locker . O título do filme no Brasil é Guerra ao Terror.
[3] Wooten Basset: Pequena aldeia, próxima a uma base da RAF, que se tornou sinonimo dos voos de retorno com cadáveres de soldados britânicos.

O original encontra-se em http://www.johnpilger.com/page.asp?partid=570

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/pilger/pilger_25mar10.html .

domingo, março 28, 2010

Por que Datafolha cheira mal




Vários fatores estão gerando suspeita sobre a pesquisa Datafolha feita de afogadilho na quinta e na sexta-feira e publicada hoje, começando pela pressa e pelo sigilo que envolveram a sua realização.
O próximo fator que salta aos olhos é a conveniência dessa sondagem para o governador José Serra, notoriamente o candidato a presidente da família Frias, dona do grupo Folha, justamente na véspera de seu afastamento do governo do Estado e do lançamento da sua candidatura.
O terceiro fator está contido na análise do diretor do Datafolha, Mauro Paulino, na Folha, valendo-se da platitude de que “pesquisas são flagrantes do momento” e que podem mudar, pois parece plantar uma “explicação” para o previsível desmentido dessa pesquisa por outros institutos
O último fator, tão subjetivo quanto os anteriores, é o de que estamos falando de um instituto de pesquisas de opinião que pertence à Folha de São Paulo, aquele jornal que não hesitou em publicar, em sua primeira página, falsificação grosseira de ficha policial da grande adversária de Serra.
A pesquisa tenta se justificar exacerbando os pontos mais frágeis da ministra Dilma Rousseff, como a maior dificuldade dela entre as pessoas do mesmo sexo e do Sul do país, arrematando com as propagandas de Serra na TV e sua intensa incursão nos programas de auditório, ou com ele ter admitido que é candidato e por estar chovendo menos em São Paulo.

Nada explica, porém, que, tão repentina e intensamente, as mulheres e o Sul do país tenham descoberto que amam Serra. Duvido de que uma declaração dele de que é candidato ou acontecerem um pouco menos desastres em São Paulo lhe permitiriam angariar cerca de sete milhões de votos (cada ponto percentual vale 1,5 milhão de votos) tão rapidamente.

A pesquisa Datafolha é de uma conveniência inacreditável para Serra. Ele deve ser o político mais sortudo do mundo. Esses números serão usados para ajudar a fechar apoios políticos à sua candidatura e a soterrar resistências dentro do seu partido e entre seus aliados externos.
Finalmente, concluo que essa manipulação escandalosa permitirá ver até que ponto o PT está preparado para enfrentar uma campanha desse nível. Se o partido, de uma forma ou de outra, não encomendar pesquisas com celeridade, permitindo, assim, que o factóide surta efeito, será preocupante.
Por outro lado, se o PT mostrar que está antenado e disposto a enfrentar a guerra eleitoral que se avizinha, a Folha e seu grupo político poderão descobrir que fizeram uma aposta muito alta ao falsificarem uma pesquisa de forma tão grosseira.


Escrito por Eduardo Guimarães às

sábado, março 27, 2010

Professor demonstra solidariedade, mesmo com aqueles encarregados de reprimi-los

Jeito tucano de tratar a educação em São Paulo




É isso que queremos para o Brasil?

Emir Sader: Dilma ou Serra, é tudo igual?

26/03/2010
por Emir Sader, no seu blog
A candidatura da Marina, as do Psol, do PSTU, do PCB e outras eventuais do mesmo campo, têm algo em comum: tentar caracterizar que o PT e o PSDB seriam variações da mesma alternativa. Daí deduzem a necessidade de outra candidatura, buscando romper o que consideram uma falsa alternativa. Daí também, implicitamente, a posição de abstenção ou voto em um segundo turno em que se enfrentassem Dilma a Serra.
Essa tentativa de igualização das duas candidaturas é essencial para que se tente aparecer como superação do que seria uma falsa dualidade e aponta, entre outras coisas, para um voto branco em um eventual segundo turno entre Dilma e Serra, de forma coerente com essa análise. Foi o que aconteceu no segundo turno entre Lula e Alckmin.
Para nos darmos conta do absurdo dessa posição, basta fazer o exercício de imaginar o que teria sido do Brasil com quatro anos de mandato de Alckmin no lugar de Lula – incluindo o enfrentamento da crise internacional. Não se conhece nenhum balanço autocrítico dos setores de esquerda, o que supõe que a mantêm, agora com o agregado de Marina, que em 2006, ainda ministra do governo, fez campanha ativamente, no primeiro e no segundo turno, o que faz pensar que quando ocupava aquele cargo, sua posição era uma, quanto teve que deixar o governo, mudou de avaliacao sobre o governo Lula e também sobre o caráter do bloco tucano-demista, haja vista suas fraternais relações com estes atualmente. (Fazendo temer até mesmo que os apóie, expressa ou veladamente no segundo turno.)
A incompreensão das diferenças entre as candidaturas da Dilma e do Serra decorre da incompreensão da realidade brasileira atual, o que permite esse e outros equívocos. Considerar que o bloco tucano-demista é similar ao bloco governista e que um governo da Dilma ou do Serra seriam similares para o Brasil corresponde a não dar valor à política internacional do governo atual, às políticas sociais, ao papel do Estado, à inserção internacional do Brasil – entre outros tantos temas.
Quem não sabe localizar onde está a direita, corre o grave risco de se aliar a ela. Um aliado moderado – um governo de centro-esquerda – é radicalmente diferente de um inimigo. Ao contrário da avaliação dos setores radicais que deixaram o PT, o governo mudou e mudou para melhor, desde que Dilma Rousseff substituiu Palocci como ministro coordenador do governo. Quem acreditou que o governo estava em disputa e que era possível um resgate seu pela esquerda, acertou, enquanto que os que tiveram uma avaliação puramente moral, acreditando que o governo tinha “mordido a maçã” do pecado da traição, caminhando para ser cada vez pior, erraram, se isolaram e desapareceram do campo político, lutando agora apenas por uma sobrevivência mínima no plano parlamentar.
Considerar que um governo da Dilma ou do Serra seriam a mesma coisa – assim como consideraram que o Brasil com Lula, nestes quatro anos, é o mesmo que teria sido com 4 anos de governo de Alckmin – é não valorizar o que significa a prioridade da integração regional e das alianças com o Sul do mundo, em contraste com os Tratados de Livre Comércio – a que o governo de FHC levava o Brasil – e com as alianças prioritárias com os países do centro do capitalismo, objetivo dos tucanos.
É não levar em conta as diferenças de enfrentamento da crise do governo FHC – de que Serra foi ministro nos dois mandatos – e a forma de enfrentá-la do governo Lula, com um papel ativo do Estado, com a diminuição e não o aumento da taxa de juros, com os aumentos salariais acima da inflação, com a rápida recuperação do nível do emprego, com a manutenção das políticas sociais.
É não considerar as diferenças substanciais entre o Banco do Brasil comprar a Nossa Caixa, mantendo-a como banco público, evitando que um banco paulista mais fosse privatizado pelos tucanos – o Banespa foi vendido a um banco espanhol e a Nossa Caixa teria destino similar, não fosse o atuação do BB.
Esses e outros aspectos ajudam a diferenciar e a projetar governos muito distintos no futuro – veja-se a equipe econômica do Serra, para se ter idéia, além dos ministérios que entregaria para o DEM.
Quando uma força de esquerda se equivoca sobre a polarização do campo político, querendo desconhecê-la, conforme seus desejos subjetivos, se torna intranscendente, não acumula capacidade de intervenção política. E, pior, a ação que logra obter, pode perfeitamente favorecer a direita, seja de forma explícita ou implícita.
A incapacidade de compreender a polarização política no Brasil de hoje entre dois blocos de forças claramente diferenciados inviabiliza uma política de construção de uma frente ampla de esquerda, com o sectarismo fazendo com que nem sequer entre si os grupos mais radicais da esquerda consigam coligar-se.

sexta-feira, março 26, 2010

Relatório da China: EUA violam direitos civis e políticos

Em 11 de março de 2010, o Departamento de Estado dos Estados Unidos publicou seu Relatório por Países sobre Práticas de Direitos Humanos correspondente a 2009, erigindo-se, mais uma vez, em "juiz mundial dos direitos humanos". Publicamos nesta quinta-feira (25) a segunda parte do relatório chinês das violações dos Direitos Humanos nos EUA.
Como em outros anos, os documentos americanos estão cheios de acusações sobre a situação dos direitos humanos em mais de 190 países e regiões, inclusive a China. No entanto, é completamente omisso, ignora e inclusive encobre as violações dos direitos humanos em seu próprio território.

Para ajudar os povos de todo o planeta a entenderem melhor a situação real dos Direitos Humanos nos Estados Unidos, iniciamos nesta quarta-feira uma série com dados do Registro dos Direitos Humanos dos Estados Unidos em 2009, feito pelo escritório de Informação do Conselho de Estado da China.

Leia a seguir a segunda parte do relatório:

Segunda Parte: Sobre os direitos civis e políticos

Nos Estados Unidos, o governo restringe e viola gravemente os direitos políticos e civis dos cidadãos.

A polícia dos Estados Unidos utiliza com frequência a violência contra os cidadãos. Segundo os meios de comunicação, 315 agentes de Nova York foram submetidos a um processo de investigação interna pelo uso incontrolado da violência que cometeram durante o exercício da lei.

A cifrea era de apenas 210 em 2007. Nos últimos dois anos, o número de agentes de Nova York investigados depois de terem sido alvo de muitas críticas aumentou 50 (http://www.chicagodefender.com).

De acordo com um relatório do Departamento de Polícia de Nova York sobre o uso de armas de fogo publicado em 17 de novembro de 2009, a polícia dessa cidade americana disparou 588 balas em 2007, provocando a morte de dez pessoas e outras 354 em 2008, com 13 baixas (http://gothamist.com, 17 de novembro de 2009).

Em 3 de setembro de 2009, quatro agentes golpearam repetidamente com cassetetes um estudante da Universidade do Estado em San José e utilizaram pistolas Taser para dar-lhe dez descargas elétricas (http://www.mercurynews.com, 27 de outubro de 2009).

Em 22 de setembro de 2009 um estudante chinês de Eugene, no estado de Oregon, foi golpeado e ferido por um agente da polícia sem nenhum motivo. (The Oregonian, 23 de outubro de 2009, http://blog.oregonlive.com).

De acordo com a Anistia Internacional, a polícia matou 45 pessoas nos primeiros dez meses de 2009, devido ao uso descontrolado das pistolas Taser. A vítima mais jovem tinha apenas 15 anos. Desde o ano de 2001, os estadunidenses já mataram 389 pessoas com pistolas Taser (http://theduckshoot.com).

O abuso do poder é cumum entre aqueles encarregados de aplicar a lei nos Estados Unidos.

Em julho de 2009 o FBI abriu um processo contra quatro agentes da área de Washingoton, por terem supostamente aceito dinheiro em troca de proteger um local de apostas frequentado por alguns dos traficantes de drogas mais poderosos da região nos dois anos anteriores (The Washington Post, 19 de julho de 2009).

Em setembro de 2009 um policial que estava de folga e que circulava em uma bicicleta pelas ruas de Chicago atacou um motorista de ônibus que, supostamente, atravessou seu caminho (The Chicago Tribune, http://www.chicagobreakingnews.com, setembro de 2009).

Nesse mesmo mês, quatro ex-agentes de Chicago foram acusados de extorquir US$ 500 mil de um cidadão latino que dirigia um carro não registrado na cidade e de extorquir supostos traficantes de drogas em nome da lei. Esses policiais também ofereceram suborno a seus superiores (The Chicago Tribune, 19 de setembro de 2009).

Em novembro de 2009, um ex-chefe de polícia de Morningside, no condade de Prince George, foi acusado de vender uma arma de fogo roubada de um civil (The Washington Post, 18 de noviembre de 2009).

Nas grandes cidades americanas, a polícia para, interroga e revista mais de um milhão de pessoas por ano, uma cifdra muito mais alta que a média de alguns anos anteriores (http://huffingtonpost.com, 8 de outubro de 2009).

As prisões dos Estados Unidos estão abarrotadas. Segundo um relatório publicado pelo Departamento de Justiça, em 8 de dezembro de 2008, mais de 7,3 milhões de pessoas permaneciam sob o controle do sistema penitenciário do país até a data.

O número de pessoas ainda detidas nas instituições do sistema aumentou 0,5% em relação a 2007 (http://www.wsws.org).

Ao redor de 2,3 milhões de pessoas se encontram sob custódia nas prisões americanas, o que equivale a um em cada 198 habitantes do país, de acordo com o relatório.

Entre os anos 2000 e 2008, o número de prisioneiros aumentou 1,8% ao ano, em média. (http://mensnewsdaily.com, 18 de janeiro de 2010).

O governo do Estado da Califórnia chegou a sugerir a possibilidade de enviar dezenas de milhares de imigrantes sem documentos para o México para aliviar a pressão que o excesso de presos exerce sobre seu sistema penitenciário (http://news.yahoo.com, 26 de janeiro de 2010).

Nos Estados Unidos, os direitos básicos dos detidos não estão garantidos. Os casos de presos violados por empregados das instituições penitenciárias são abundantes. Segundo o Departamento de Justiça, o número de denúncias relacionadas com a "má conduta sexual" dos trabalhadores das 93 prisões federais do país aumentaram quase 100% nos últimos 8 anos.

Cerca de 40% dos 90 empregados julgados por ter abusado sexualmente de presos e presas foram condenados por outros crimes (The Washington Post, 11 de setembro de 2009).

O jornal The New York Times publicou em 24 de junho de 2009 os dados de um estudo que indica que 4,5% dos mais de 63 mil presos das prisões estaduais e federais entrevistados haviam denunciado abusos sexuais em, pelo menos, uma ocasião nos últimos doze meses.

O documento estimava que durante esse período aconteceram pelo menos 60 mil violações de presos.

A caótica gestão das prisões nos Estados Unidos também provoca o contágio de doenças entre os reclusos. de acordo com um relatório do Departamento de Justiça, 20.231 homens e 1.913 mulheres que cumpriam pena nas prisões federais e estaduais eram portadores do vírus HIV em fins de 2008.

A porcentagem de presos portadores do vírus era de 1,5% no caso dos homens e 1,9% no das mulheres (http://www.news-medical.net, 2 de dezembro de 2009).

Entre 2007 e 2008 o número de casos de aids nas prisões da Califórni, do Missouri e da Flórida aumentou em 246,169 e 166, respectivamente. Mais de 130 prisioneiros dos centros federais e estaduais morreram de causas relacionadas à aids em 2007 (http://thecrimereport.org, 2 de dezembro de 2009).

Um relatório do Human Rights Watch, publicado em março de 2009, assinalava que a prisão do estado de Nova York tinha o maior número de reclusos com aids e hepatite C do país e não garantia o acesso aos tratamentos de adição de drogas, já que impedia aos consumidores de droga receber tratamento, como uma forma de castigo (http://www.hrw.org, 24 de março de 2009).

Apesar de sua defesa da "liberdade de expressão", da "liberdade de imprensa" e da "liberdade na internet", o governo americano controla e restringe o direito de seus cidadãos à liberdade quando se trata de proteger seus próprios interesses e necessidades.

A liberdade dos cidadãos americanos de acessar a informação ou distribuila está estritamente controlada. De acordo com informações divulgadas pelo governo americano, a Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) começou a controlar as comunicações instalando equipamentos especializados de escuta e interceptando telefones, faxes e contas de correio eletrônico a partir de 2001.

Esse tipo de estratégia foi utilizada a princípio para vigiar cidadãos de origem árabe, mas logo começaram a ser empregada para controlar milhões de americanos de outras procedências.

A NSA estabeleceu mais de 25 centros de escuta em San José, San Diego, Seattle, Los Angeles e Chicago, entre outras várias cidades.

A agência também anunciou recentemente que está construindo um armazém com dados com mais de 9 milhões de metros quadrados e com um custo de US$ 1,5 bilhão de dólares em Camp Williams (Utah) e outro em San Antonio, para poder levar a cabo uma nova missão de "vigilância cibernética".

As mídias revelaram que um homem chamado Nacchio foi acusado de 19 infrações à Justiça do país e condenado a seis anos de prisão por ter se negado a participar no programa de vigilância da NSA (http://www.onlinejournal.com, 23 de novembro de 2009).

Depois dos ataques de 11 de Setembro, o governo dos Estados Unidos, em nome da "luta contra o terrorismo", autorizou os departamentos de inteligência a espionagem a entrar nas contas de correio eletrônico dos cidadãos, para vigiá-los e eliminar qualquer informação que possa ameaçar os "interesses nacionais".

A lei "Patriot Act" deu mais liberdade às agências encarregadas da aplicação da lei para grampear os telefones e controlar tanto as comunicações por correio eletrônico como os registros médicos e financeiros das pessoas.

A lei também ampliou a capacidade das autoridades de imigração e aplicação da lei para deter e deportar imigrantes suspeitos de terem cometido atos relacionados com o "terrorismo".

A lei ampliou além disso a definição de terrorismo, aumentando o número de atividades que as autoridades encarregadas da aplicação da lei poderiam proibir.

Em 9 de julho de 2008, o Senado dos Estados Unidos aprovou a Ata de Emenda à Lei de Vigilância da Inteligência Extrangeira, que outorgava imunidade legal às companhias de telecomunicações entre cidadãos estadunidenses e residentes no exterior sem necessidade de receber a aprovação de um tribunal para, assim, facilitar a luta contra o terrorismo (The New York Times, 10 de julho de 2008).

As estatísticas mostram que, entre 2002 e 2006, o FBI compilou milhares de registros de cidadão americanos em forma de correio eletrônico, notas e chamadas telefônicas.

Em setembro de 2009 foi estabelecido um organismo de "supervisão" da internet, o que fez os cidadãos pensaremque o governo pode usar a segurança na rede como uma desculpa para controlar e interferir nos sistemas pessoais.

Um funcionário do governo americano disse, em uma entrevista concedida ao New York Times em abril de 2009 que a NSA havia interceptado chamadas e correios eletrônicos privados em poucos meses, em uma escala que superava amplamente os limites legais estabelecidos pelo Congresso no ano anterior.

Além disso, a NSA também estava grampeando os telefones de políticos estrangeiros, funcionários de organizações internacionais e reconhecidos jornalistas (The New York Times, 15 de abril de 2009).

O Exército também participava nos programas de vigilância, segundo a cadeia de televisão CNN, uma organização militar de avaliação de riscos na internet, com sede na Virgínia, se encarregava de vigiar blogs oficiais e privados, documentos oficiais, informação pessoal de contatos, fotografias de armas e entradas nas bases militares e outras páginas web que poderiam supor uma ameaça à segurança nacional.

A suposta liberdade de imprensa" nos Estados Unidos está completamente subordinada aos seus interesses nacionais e é manipulada pelo governo. Durante as guerras do Iraque e do Afeganistão, o governo americano e o Pentágono plantavam ex-oficiais militares nos informativos de rádio e televisão para glorificar as ocupações, para guiar a opinião pública e fazer com que os cidadãos apoiassem a "guerra contra o terrorismo" (The New York Times, 20 de abril de 2009).

Em fins de 2009, o Congresso aprovou uma lei que impõe sanções a diversos canais por satélite de origem árabe, por emitir conteúdos que vão contra os Estados Unidos e "por promover a violência" (http://blogs.rnw.nl).

Em setembro de 2009, cidadãos que estavam utilizando mensagens de texto e a rede social Twitter para organizar manifestações enfrentaram a polícia em Pittsburgh, durante a realização da cúpula do G20. Elliot Madison, de 41 anos, foi acusado de dificultar a detenção dos manifestantes via internet. A polícia também fez registros em sua casa (http://www.nytimes.com, 5 de outubro de 2009).

Vic Walczak, diretor da União de Liberdades Civis da América (ACLU, em inglês) na Pensilvânia comentou que essa mesma conduta seria qualificada em outros países de "violação dos direitos humanos", enquanto que nos Estados Unidos ela é definida como um "controle necessário do crime".

Leia também a primeira parte das denúncias de violações dos direitos humanos nos Estados Unidos:

quinta-feira, março 25, 2010

Os presos políticos dos Estados Unidos

Os Estados Unidos, muito preocupados em transformar presos comuns cubanos em patriotas, mediante uma campanha mediática mundial, resulta ser um evidente desconhecedor dos direitos humanos dos presos políticos que estão em seus presídios.

Em muito pouco tempo milhões de palavras foram escritas ou pronunciadas nos meios de difusão controlados por Washington para apoiar essa arremetida contra Cuba, na qual participam os setores latino-americanos e europeus mais conservadores.

Tem sido muito difícil aos organizadores de tal campanha conseguir convencer sobre o caráter patriótico de pessoas que se desgarram de uma sociedade baseada na justiça social para alinhar-se, por interesse econômico, com aqueles que querem destruí-la.

Além disso, o tratamento recebido por verdadeiros presos políticos nos Estados Unidos, encarcerados por causas relacionadas com a luta contra a desigualdade, a exploração, o terrorismo ou a opressão é bastante conhecido.

Casos emblemáticos são, por exemplo, os dos estadunidenses Mumia Abu-Jamal e Leonard Peltier, o primeiro com uma pena de morte ainda não executada, mas que está aguardando há 27 anos em uma cela de isolamento e o segundo que foi condenado a duas cadeias perpétuas pela falsa acusação de ter assassinato dois agentes do FBI.

Abu-Jamal, jornalista e ex-militante do movimento Panteras Negras, denuncia continuamente as condições carcerárias subumanas na quais vive e Peltier, com problemas de saúde graves e dolorosos, também as sofre e não conhece clemência.

E o que dizer das notícias difundidas sobre a chegada de um grupo de cinco homens na Geórgia e na Suíça que foram seqüestrados e, durante oito anos, sofreram tortura e prisão na prisão de Guantánamo, libertados agora sem acusação nem julgamento por serem inocentes.

Nessa instalação repudiada ainda estão outras 183 pessoas, às quais não se pôde provar nenhum delito e já passaram uma década de suas vidas isolados do resto do mundo e sem direito legal algum por decisão expressa do governo estadunindense.

Da mesma maneira se encontra o grupo de uma dezena de independentistas porto-riquenhos condenados até 105 anos de privação de liberdade, que denunciam as visitas restringidas de suas famílias, que são privados de comunicação entre eles e, inclusive, de participar do funeral de um familiar.

Presos políticos são, sem sombra de dúvidas, os cinco antiterroristas cubanos que receberam desproporcionadas penas por terem se infiltrado nos grupos violentos de origem cubana radicados na Flórida, precisamente para evitar ações terroristas contra seu país.

Antonio Guerrero, René González, Fernando González, Ramón Labañino e Gerardo Hernández sofrem não só essas sanções injustas, senão também a crueldade de serem impedidos de contato com seus familiares. Um deles está impedido há 11 anos da visita de sua esposa e outro durante vários anos sequer pode ver sua filha.

A história destes homens nas prisões estadunidenses passa por celas solitárias durante longos períodos de tempo, haver sido separados em centros penitenciários de diferentes estados e julgamentos cheios de ilegalidade com limitações a sua defesa.

De nada valeram os pedidos de 10 Prêmios Nobel e centenas de personalidades políticas e culturais, organizações de direitos humanos, congressos e governos de diversos países e até sentenças de agências da ONU, que declararam que a detenção e julgamento dos mesmos foi arbitrária.

Neste caso, nas administrações estadunidenses pesaram mais os sentimentos de rancor com uma Cuba independente que os pedidos provenientes do mundo todo pela libertação dos CINCO, como ficaram conhecidos internacionalmente.

Esta série de exemplos põe em crise toda a tentativa de um acusador sem moral de apresentar esta nação caribenha como violadora dos direitos humanos, os quais respeita escrupulosamente.

Prensa Latina

quarta-feira, março 24, 2010

Políticas Econômicas

Amir Khair[1]


Boa parte das análises atribui o sucesso da política econômica do governo ao fato de ter dado continuidade ao tripé constituído pelas metas de inflação, pelo câmbio flutuante e pelo elevado resultado primário (receitas menos despesas exclusive juros). A questão do crescimento econômico seria uma consequência deste tripé, pois não é citada nestas análises como parte integrante e fundamental de uma política econômica.

O tripé efetivou-se em 1999 quando da troca de comando no Banco Central, que passou a adotar o regime de metas de inflação e o câmbio flutuante. O resultado primário elevado surgiu como exigência do FMI para a obtenção de empréstimos que visavam salvar o País do default nas contas externas.

Para satisfazer esta exigência, o governo elevou a carga tributária, que passou da média de 26,8% do Produto Interno Bruto (PIB) no período 1995 a 1998 para 30,6% no período 1999 a 2002, com crescimento de 3,8 pontos percentuais do PIB (pp). Nesta mesma base de comparação o resultado primário passou de um déficit de 0,2% do PIB para um superávit de 3,3%, ou seja, cresceu entre estes períodos 3,5 pp. (ver quadro)

Já o crescimento econômico médio anual no período 1999 a 2002 foi de 2,1%, pouco abaixo do verificado na média do primeiro mandato do governo anterior (1995 a 1998) que foi de 2,4% quando não existia o tripé e a inflação era controlada pela âncora cambial. No atual governo, o crescimento médio anual até 2009 foi de 3,6%.

Será que o que caracteriza a política econômica é o tripé ou existem também outras políticas que merecem reflexão? Por exemplo, o estímulo ao consumo, à produção e ao investimento, que são políticas ligadas à economia real. Neste caso, pode-se notar uma diferença entre o governo anterior e o atual.

No anterior a política adotada foi a de atrair o capital estrangeiro como mola mestra para o crescimento. Foi marcada pela fase de intensas privatizações com entradas maciças de capital externo para adquirir controle ou participação nas estatais de então. O foco foi o estímulo ao investimento, para a ampliação da oferta de bens e serviços.

Já no governo atual, a política tem sido de estímulo ao consumo como mola mestra para gerar o crescimento econômico. É a elevação do salário mínimo, a intensificação de programas de distribuição de renda, a adoção do crédito consignado e o uso dos bancos oficiais para ampliação do crédito e redução dos juros. Com esta política ampliou-se a massa de consumidores com a incorporação de milhões de pessoas na classe C, gerando em consequência o crescimento da produção e do investimento. O foco foi no consumo.

Há divergências se a ênfase deve ser dada aos investimentos ou ao consumo. Como a maior parte dos investimentos é feita pelo setor privado e este só investe quando prevê crescimento do consumo, as políticas de estímulo ao consumo parecem ser mais eficazes para criar os investimentos, e com isso um crescimento econômico sustentável.

Outra política econômica de substantiva importância é a do comércio exterior. Aí também há diferenças marcantes. No governo anterior a política econômica foi preferencialmente na direção do eixo Estados Unidos – Europa, maiores consumidores mundiais. Caso fosse seguida neste governo a crise poderia ter efeitos mais perversos.

No atual, a política foi a conquista de novos mercados, especialmente aqueles dos países emergentes, que há mais de duas décadas apresentavam taxas de crescimento econômico superiores e onde se tem verificado um aumento real e potencial mais expressivo de novos consumidores.

Enfim, as políticas de estímulo à economia real são tão ou mais importantes que as do tripé e se somam a ele com o objetivo de se conseguir explorar de forma mais efetiva o potencial econômico do país.

Ficar apenas considerando política econômica restrita ao tripé, que basta adotá-lo que o desenvolvimento econômico irá cair do céu, é empobrecer o debate.

terça-feira, março 23, 2010

Finkelstein: Em Gaza, Israel foi longe demais

“A devastação de Gaza pelos israelenses, contra uma população civil cercada – e usando bombas, dinheiro e cobertura diplomática dos EUA – foi tão brutal e horrenda que mudou para sempre o modo como o mundo vê o conflito no Oriente Médio” [Glenn Greenwald, blogueiro de Salon.com, durante a guerra de Gaza].

por Norman Finkelstein, em Counterpunch

A indignação mundial gerada pela invasão de Gaza não nasceu do nada nem foi repentina. De fato, foi a culminação de uma curva que há muito tempo marcava o crescente declínio do apoio a Israel em todo o mundo. Como mostram dados de pesquisas recolhidos nos EUA e Europa, todos os públicos, de judeus e não-judeus, foram-se tornando cada vez mais críticos das políticas israelenses ao longo de toda a última década. As imagens horrendas de morte e destruição mostradas pela televisão em todo o mundo durante a invasão de Gaza aceleraram aquele processo. “A frequência brutal e sempre crescente de guerra naquela região volátil fez mudar a tendência da opinião internacional” – escreveu o britânico Financial Times em editorial, um ano depois da invasão de Gaza –, “fazendo lembrar que Israel não está acima da lei. Israel não pode continuar a ditar os termos dessa discussão.”

Pesquisa feita nos EUA logo depois do ataque israelense a Gaza mostrou que o número de eleitores norte-americanos que se autodefiniam como apoiadores de Israel havia caído de 69% antes do ataque, para 49% em junho de 2009; e o número de eleitores que acreditavam que os EUA deveriam continuar a apoiar Israel, caiu de 69% para 44%.

Consumida pelo ódio, cheia de arrogância e confiante de que poderia controlar ou intimidar toda a opinião pública, Israel atacou Gaza com fúria de assassino que confia que jamais será apanhado, mesmo que promova assassinatos em massa à luz do dia. Mas, embora o apoio oficial a Israel não se tenha alterado no ocidente, a carnificina fez crescer uma onda sem precedentes de indignação popular em todo o mundo. Seja porque o ataque contra Gaza veio depois da devastação que Israel provocou no Líbano, ou por causa da incansável perseguição contra o povo de Gaza, ou seja, porque o ataque a Gaza foi ataque covarde, fato é que o ataque a Gaza em dez.-jan. 2009, parece ter marcado um ponto de virada na opinião pública em relação a Israel. O mesmo tipo de mudança aconteceu também depois do massacre de negros em Sharpeville, em 1960, na África do Sul.

Nas organizações oficiais da diáspora judaica, que têm laços antigos com Israel, o apoio continuou como sempre, cego. Ao mesmo tempo, contudo, organizações de judeus progressistas começaram a afastar-se de Israel, umas mais, outra menos. Enquanto, antes, todos os judeus mais conhecidos no mundo sempre apoiaram as guerras de Israel, muitos, dessa vez, mostraram-se ambivalentes durante a invasão, com uma maioria mais idosa e declinante que saiu em defesa de Israel e uma minoria crescente, mais jovem, que declaradamente fez oposição à invasão de Gaza. Entre o crescente incômodo dos mais jovens em face do belicismo israelense e as muitas vacilações ante a tarefa de apoiar Israel, o massacre de Gaza marcou uma primeira grande fissura no, antes, irrestrito apoio dos judeus a todas as guerras de Israel. Muitos constataram que, ao mesmo tempo em que em todo o ocidente as manifestações contra os ataques a Gaza foram sempre multiétnicas (com a presença de muitos judeus), as demonstrações ‘pró’ Israel sempre reuniram quase exclusivamente judeus.

A evidência de que a oposição ativa à política de Israel – por exemplo, nas universidades – já extrapolou os limites do mundo árabe-muçulmano e já alcançou públicos aos quais antes não chegava, ao mesmo tempo em que encolheu o apoio ativo a Israel, já confinado a uma fração do núcleo mais conservador dos judeus étnicos, é importante indicador da direção para a qual as coisas estão andando. A era da “bela” Israel já passou, parece que para sempre; foi substituída por uma Israel desfigurada que, nos últimos tempos ocupa a consciência pública e provoca embaraço cada dia maior. Não se trata apenas de Israel agir ainda mais mal do que antes, mas, sobretudo, de as ações de Israel terem ultrapassado o limite do que as consciências toleram.

Já não é possível negar ou desqualificar o que todos veem. A documentação do conflito árabe-israelense estabelecida por historiadores conhecidos conflita com versões popularizadas por livros como Êxodo de Leon Uris. Há evidências de inúmeras violações por Israel dos direitos humanos básicos dos palestinos, todas documentadas por organizações conhecidas; essas evidências não confirmam os discursos israelenses e o muito alardeado compromisso com “a Pureza das Armas” [heb. Tohar HaNeshek; ing. Morality in Warfare; é o código ético do Exército de Israel: “moralidade/pureza na guerra”]. As deliberações de corpos políticos e jurídicos respeitados manifestam graves dúvidas quanto ao alardeado compromisso de Israel com a resolução pacífica de conflitos. Por muitos anos, os ‘apoiadores’ de Israel conseguiram evitar o impacto da documentação que se foi acumulando; na maioria dos casos, ocultaram-se por trás de duas espadas gêmeas sempre em riste: o Holocausto e um “novo antissemitismo”.

Houve quem dissesse que os judeus não poderiam ser avaliados pelos padrões morais/legais comuns, depois do inexcedível sofrimento pelo qual passaram durante a II Guerra Mundial e que toda e qualquer crítica às políticas de Israel seriam sempre motivadas por um jamais extinto ódio aos judeus. Quanto a isso, além do desgaste que sofrem todos os argumentos excessivamente usados, esse argumento perdeu muito da eficácia que algum dia teve quando as críticas às políticas de Israel chegaram, afinal, às correntes mais amplas da opinião pública. Incapazes de responder àquelas críticas, os apologistas de Israel conjuram hoje as mais bizarras teorias para explicar o ostracismo ao qual se condenaram. Para George Gilder, guru ‘econômico’ do governo Reagan, o sistema de livre mercado teria modo específico para desencadear os potenciais humanos; e que portanto, sob sistemas de livre mercado, os judeus deveriam “estar sempre representados não proporcionalmente nos escalões superiores”, porque seriam seres humanos naturalmente mais bem dotados que outros. Inversamente, se os judeus não estiverem no comando, comprovar-se-ia que o sistema econômico não alcançou a perfeição.

O antissemitismo brotaria do ressentimento provocado pela “superioridade e excelência dos judeus” e pela “manifesta supremacia dos judeus sobre todos os demais grupos étnicos”; e o ódio contra Israel, do fato de Israel ter evoluído (sob a inspirada tutela de Benjamin Netanyahu) num perfeito sistema de livre mercado que “concentra o gênio dos judeus,” fazendo de Israel “uma das potências capitalistas mundiais líderes” e inveja do mundo: “Israel é odiada sobretudo por suas virtudes.”

Se há judeus que criticam Israel, tratar-se-ia de pura inveja: “os judeus destacam-se tanto e tão rapidamente nos campos intelectuais, que deslocam e derrotam todos os rivais antissemitas.” O ocidente deve tratar, isso sim, de proteger Israel e os israelenses contra “as quimeras mundiais de soma-zero e as fantasias de vingança e morte dos jihadistas”, e contra “as massas bárbaras”, porque foram os talentos e dotes dos judeus que levaram a humanidade “a crescer e prosperar”; em conclusão, porque os judeus são “decisivos para a raça humana”.

E prossegue: “se Israel for destruída, toda a Europa capitalista morrerá; e os EUA, epítome do capitalismo criativo e produtivo empurrado pelos judeus, estará sob grave risco”; “Israel é a vanguarda da próxima geração de tecnologia; está na linha de defesa de uma nova guerra racial contra o capitalismo, contra a individualidade e o gênio judeu”; “Assim como o livre mercado é necessário à sobrevivência das populações humanas sobre a face da Terra, a sobrevivência dos judeus é necessária para garantir o triunfo das economias livres. Se Israel for calada ou destruída, todos sucumbiremos ante as forças que hoje combatem o capitalismo e a liberdade em todo o mundo.”

Do outro lado do Atlântico, Robin Shepherd, diretor de assuntos internacionais da Henry Jackson Society, sediada em Londres, garante que Israel foi alvo de críticas fortes pelo ocidente, não porque seja campeã da defesa dos direitos humanos, mas porque é Estado capitalista democrático obrigado a lutar na linha de frente, ao lado dos EUA, contra o islã radical que seria “ameaça civilizacional”: “Israel tornou-se inimiga não por algo que tenha feito”, mas “porque estava do lado errado das barricadas”. A “principal plataforma de energização no ocidente” para essa “maré incontrolável de histeria, mistificação e distorções contra o Estado judeu” são “os marxistas totalitários e a esquerda liberal, viajantes que, desapontados pelo proletariado ocidental e desiludidos das lutas de libertação do Terceiro Mundo, uniram-se em causa comum com “o islã militante” para destruir a ordem mundial liberal-capitalista. Embora esses críticos de Israel não sejam antissemitas no tradicional sentido “subjetivo” de desprezar os judeus por serem judeus, são agentes de um antissemitismo “objetivo”, porque Israel tornou-se fator central da identidade dos judeus no mundo contemporâneo.

Mas a oposição a Israel também emanaria dos ‘sangue-azul’ do antigo regime que sonham com restaurar as hierarquias do velho mundo, devolvendo-as ao ponto em que teriam sido rompidas pelos arrivistas judeus. Essa conspiração neoantissemita reuniria “quase todos” os que acusam Israel de ter cometido crimes de guerra e de outras violações das leis internacionais. Evidentemente, deve-se entender que, por trás da condenação de Israel pela Anistia Internacional e pela Corte Internacional de Justiça, Jimmy Carter e Mairead Corrigan Maguire ganhadores do Prêmio Nobel, o Financial Times e a BBC, age a mão oculta da gangue dos radicais esquerdistas fanáticos aristocratas islâmicos. Para os que queiram saber mais, Shepherd recomenda “fortemente” que leiam The Case for Israel, de Alan M. Dershowitz.

Embora falte credibilidade a essas explicações para o isolamento de Israel, não há dúvidas de que as ações de Israel entraram em queda livre. Embora Israel tenha conquistado muitos simpatizantes ocidentais depois de fulgurante vitória de junho de 1967, a verdade é que, nos anos mais recentes, já está reduzida a Estado pária, sobretudo entre os europeus. Pesquisa de 2003 feita pela União Europeia, classificou Israel como principal ameaça à paz do mundo. Em 2008, pesquisa de opinião pública global classificou Israel como o principal obstáculo à paz no conflito Israel-Palestina. Em pesquisa do BBC World Service, feita imediatamente depois da invasão de Gaza, 19 dos 21 países pesquisados manifestaram opinião negativa sobre Israel.

Simultaneamente, sob o título “Second Thoughts about the Promised Land” [“Pensando melhor sobre a Terra Prometida”][1], a revista The Economist reporta em 2007 que “embora a maioria dos judeus da diáspora ainda apóiem Israel, aumentaram as dúvidas e a ambivalência.” Vozes de judeus discordantes começam a fazer-se ouvir na Grã-Bretanha, na Alemanha e em outros países, desafiando a hegemonia das organizações judias oficiais que repetem como papagaios a propaganda israelense. Nos EUA as tendências ainda não são muito claras, mas nem por isso menos significativas. Avaliando-se pelos dados de pesquisa, pode-se dizer que os norte-americanos sempre tenderam consistentemente mais a favor de Israel que dos palestinos. Mas os norte-americanos cada vez mais claramente também apóiam que os EUA trabalhem para mediar o conflito; mais recentemente, já há pesquisas que mostram “níveis equivalentes de simpatia” pelos dois lados, e minoria já substancial opinou que as políticas dos EUA favorecem (ou favorecem muito) Israel; uma robusta maioria de norte-americanos “opinaram que Israel não está fazendo bem a parte que lhe cabe de esforços para resolver o conflito”; e já há muitos norte-americanos que pregam o uso de sanções para conter Israel.

Significativamente, a maioria dos norte-americanos também apoiaram um acordo de dois Estados sobre as fronteiras demarcadas em junho de 1967, com total retirada dos israelenses dos territórios ocupados na guerra de junho. “Sim, as pesquisas mostram forte apoio a Israel,” observou em 2007 M. J. Rosenberg, diretor de análises políticas do Israel Policy Forum, a respeito das tendências de então; contudo “esse apoio a Israel, como mostram as pesquisas, é amplo mas não é muito profundo.” Esse fenômeno observa-se quase todos os dias nas “Cartas do Leitor”. Cada vez que aparece alguma coluna sobre Israel, sobretudo se critica Israel, aparecem várias cartas de leitor. A maioria apoia a posição israelense. E quase sem exceção as cartas são assinadas por judeus. A vasta maioria [de não judeus norte-americanos] que se supõe que sejam também favoráveis às posições de Israel não escrevem. Conforme pesquisa de 2007 feita pela Liga Antidifamação [ing. Anti-Defamation League (ADL)] a opinião de norte-americanos a favor de Israel é acentuadamente menos favorável do que suas opiniões favoráveis pró Grã-Bretanha e Japão; e é praticamente tão favorável quanto as opiniões pró Índia ou México. Quase a metade dos respondentes entendem que os EUA devem trabalhar aliados a Estados árabes “moderados”, “mesmo que isso contrarie Israel”.

Metade ou mais dos norte-americanos pesquisados culpam igualmente Israel e o Hizbollah pela guerra do Líbano, no verão de 2006, e apoiaram uma posição (mais) neutra dos EUA. Além disso, em anos recentes, vários grupos religiosos, como a Igreja Presbiteriana dos EUA, o Conselho das Igrejas, a Igreja Unida de Cristo e a Igreja Metodista Unida têm apoiado iniciativas, inclusive a favor do desinvestimento em corporações, para forçar o fim da ocupação da Palestina. Em pesquisa de 2005, feita por Steven M. Cohen, judeu, constatou-se que “a ligação dos judeus norte-americanos com Israel enfraqueceu de modo mensurável nos últimos dois anos, (…) seguindo tendência que se observava há muito tempo.” Menos respondentes, em relação a pesquisas anteriores, declararam prontamente seu apoio a Israel, que conversavam sobre Israel ou que participavam de atividades de apoio a Israel.

Significativamente, não houve declínio semelhante em outras mensurações de identificação com os judeus, incluindo práticas religiosas, observação de preceitos religiosos ou afiliação comunitária. A pesquisa mostrou 26% que se declaram “muito” emocionalmente ligados a Israel, menos que os 31% que se viram em pesquisa de 2002. Cerca de 2/3, 65%, declararam que acompanham de perto o noticiário sobre Israel, menos que os 74% da pesquisa de 2002; e 39% disseram que conversam regularmente com amigos judeus; menos que os 53% de 2002.

Israel também caiu nas pesquisas como componente da identidade judaica pessoal dos respondentes. Quando lhes eram mostrados vários fatores, entre os quais religião, justiça social e comunidade, ao lado de “preocupação com o destino de Israel”, e perguntados “quanto, de cada um desses fatores, pesa no seu sentimento de ser judeu?”, 48% responderam que Israel pesa “muito”; em 2002, foram 58%. Apenas 57% afirmaram que “a preocupação com o destino de Israel é parte muito importante do meu sentimento de ser judeu”; em pesquisa idêntica, de 1989, foram 73%. Pesquisa de 2007, feita pelo Comitê Judeu Norte-americano [ing. American Jewish Committee] mostrou que 30% dos judeus sentiam-se “distantes” ou “muito distantes” de Israel. “No longo prazo”, prevê Cohen, haverá uma “polarização nos judeus norte-americanos: um grupo cada vez menor de judeus mais fortemente religiosos cada vez mais ligados a Israel; e um grupo maior, que se afastará do grupo menor.”

Pesquisa de 2006 mostrou que, entre os judeus norte-americanos de menos de 40 anos, 1/3 declarou-se “distante” e “muito distante” de Israel; pesquisa de 2007 mostrou que, entre os judeus de menos de 35 anos, 40% declarou “fraca ligação” com Israel (apenas 20% declararam “forte ligação”). Surpreendentemente, menos da metade dos respondentes responderam “sim; a destruição de Israel seria vivenciada como tragédia pessoal.” O ex-presidente da Agência Judaica [ing. Jewish Agency] fez soar sinal de alarme, ao divulgar que “menos de 24% dos judeus norte-americanos jovens participam de organizações judaicas. Menos de 50% dos judeus norte-americanos com menos de 35 anos sentem-se profundamente ligados ao povo judeu. Menos de 25% dos judeus norte-americanos com menos de 35 anos autodefinem-se como sionistas.”

Nas universidades norte-americanas, observa-se a queda no apoio a Israel não só entre os alunos judeus em geral, mas também, e principalmente, entre os sionistas reunidos nos Hillels [ing. Hillel Foundation for Jewish Campus Life][2]. “Alunos universitários judeus são claramente menos ligados a Israel hoje do que em gerações anteriores”, dizem vários relatórios de organizações de propaganda pró-Israel. “Israel está perdendo a disputa pelos corações e mentes dos judeus.” De fato, dos cerca de meio milhão de alunos judeus que frequentam instituições de ensino superior, “apenas 5% mantêm qualquer conexão com a comunidade de judeus.”

Observa-se a conversão da ambivalência em aberta oposição em relação a Israel também em outros setores influentes da sociedade norte-americana, mesmo entre as vacas-madrinhas da vida intelectual nos EUA e no público de leitores. Pesquisa recente descobriu que uma maioria de líderes de opinião nos EUA apóiam Israel “movidos sobretudo por insatisfação com os rumos dos EUA” em todo o mundo. Em ensaio publicado em 2003 na New York Review of Books, o historiador judeu Tony Judt escreveu que “a Israel de hoje não é boa para os judeus” e pôs em dúvida tanto a viabilidade quanto a desejabilidade de um Estado judeu. John J. Mearsheimer, da Universidade de Chicago e Stephen M. Walt da Harvard Kennedy School são co-autores de um importante ensaio, de 2006, no qual atacam a imagem idealizada da história de Israel e afirmam que Israel está convertida em “risco estratégico” para os EUA. Livro do ex-presidente Jimmy Carter, provocativamente intitulado Palestine: Peace Not Apartheid, lamenta a política de Israel para os Territórios Palestinos Ocupado e culpa integralmente Israel pela deterioração do processo de paz.

Apesar dos contra-ataques vitriólicos que o lobby pró-Israel lançou contra aquelas intervenções – o discurso usual que acusa todos de serem negadores do Holocausto e antissemitas –, dessa vez os contra-ataques não foram eficazes.

Quando em 2006 as pressões do lobby levaram ao cancelamento de uma das palestras já agendadas de Tony Judt, o caso tornou-se imediatamente cause célèbre nos círculos intelectuais dos EUA. Críticos de Judt, como Abraham H. Foxman da ADL, foram descritos como “gente que se esconde atrás de acusações sem sentido de antissemitismo” e como “anacrônicos”. Carter, por sua vez, foi acusado de plagiador, de haver sido subornado por xeiques árabes, de ser antissemita, de fazer apologia do terror, de simpatizante dos nazistas, e pouco faltou para ser acusado de negar o Holocausto.

Mesmo assim, o livro de Carter chegou rapidamente à lista dos mais vendidos do New York Times e lá permaneceu durante vários meses, tendo vendido mais de 300 mil cópias encadernadas. Embora duramente criticado pelo presidente da Universidade Brandeis, o ex-presidente Carter foi recebido pelos estudantes com uma retumbante ovação, ao chegar para falar naquela universidade judaica tradicional. (E metade da plateia levantou-se e saiu quando Alan M. Dershowitz, professor de Direito de Harvard, levantou-se para discursar em resposta à palestra de Carter.) Mearsheimer e Walt contrataram a publicação de seu livro com a editora Farrar, Straus and Giroux, e seu livro, The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy, também esteve por muito tempo na lista dos mais vendidos do Times.

Demonstração extra de que a sorte de Israel está mudando é que, durante o mandato do primeiro-ministro Ehud Olmert, nem Foxman nem Elie Wiesel, perene apoiador de Israel responderam publicamente à evidência de que Israel não se dedicava suficientemente em busca da paz. A crescente insatisfação pública em relação à política de Israel nos últimos anos chegou a ponto de ebulição e converteu-se em indignação manifesta durante a invasão de Gaza. Apesar da cuidadosamente orquestrada blitz de propaganda israelense; apesar de a cobertura jornalística ter sido, como sempre, marcadamente tendenciosa pró-Israel, sobretudo nos primeiros dias do ataque; e apesar do apoio oficial do ocidente ao ataque contra Gaza – apesar de tudo isso, houve enormes manifestações de rua por toda a Europa Ocidental (na Espanha, Itália, França e Grã-Bretanha), tão grandes que encobriram as pequenas manifestações de apoio a Israel.

Estudantes ocuparam universidades por toda a Grã-Bretanha, inclusive nas universidades de Oxford, Cambridge, Manchester, Birmingham, na London School of Economics, na School of Oriental and Asian Studies, Warwick, King’s, Sussex e Cardiff. Mesmo em tradicionais bastiões de apoio a Israel, como no Canadá, onde é particularmente intenso o viés de apoio a Israel da extrema direita e do establishment político e da mídia, os mais diferentes grupos de opinião pública manifestaram-se contra o ataque a Gaza; e o Sindicato Canadense de Servidores Públicos [ing. Canadian Union of Public Employees] aprovou moção em que pede um boicote acadêmico contra Israel.

Declarando depois do cessar-fogo que “os eventos em Gaza nos chocaram profundamente”, um grupo dos 16 juízes e investigadores mais experientes do mundo – entre os quais Antonio Cassese (Primeiro Presidente e Juiz do Tribunal Criminal Internacional para a ex-Iugoslávia e Chefe da Comissão de Investigação da ONU para o Darfur) e Richard Goldstone (Promotor-chefe do Tribunal Criminal Internacional da Comissão de Investigação da ONU para o Kosovo) – pediram que se instalasse “investigação internacional que examine as graves violações da legislação internacional de guerra cometidas pelos dois lados no conflito de Gaza.”

Como sempre, invariavelmente, os apologistas de Israel atribuíram ao crescimento do antissemitismo a crescente indignação contra a ação israelense em Gaza. Deve-se registrar que, como regra geral, quanto mais profundamente violenta é a conduta criminosa de Israel, mais aumentam, em decibéis, as ‘denúncias’ de antissemitismo. Os judeus estariam enfrentando “uma epidemia, uma pandemia de antissemitismo”, declarou Abraham H. Foxman. “É a pior, a mais intensa, a mais global onda de antissemitismo que nossa memória registra.” Não que esse tipo de diagnóstico seja novidade para Foxman que, em 2003, não se cansava de repetir que “a ameaça à segurança do povo judeu é tão grande hoje quanto foi nos anos 30s.”

Como no passado, sempre aparecem dados de pesquisa que confirmam esses exageros, chamados “indicadores” das “mais perniciosas noções de antissemitismo”; por exemplo, uma pesquisa que descobriu que “grandes porções da opinião pública europeia continua a achar que os judeus falam demais sobre o que lhes aconteceu no Holocausto.” Segundo um “filósofo” midiático francês, Bernard-Henri Lévy, qualquer um que ponha em dúvida que o holocausto nazista “foi um ponto de virada irreversível da história da humanidade” deve ser considerado antissemita. Na Europa, poucas das manifestações ditas antissemitas foram além de manifestações covardes ou apenas desagradáveis, como emails ou graffiti, porque o antissemitismo europeu, por mais que se deixe ver vez ou outra, empalidece completamente se comparado à islamofobia no continente. (Observou-se de fato, recentemente, oposição crescente a judeus e muçulmanos – as duas curvas parecem estar correlacionadas –, resultado provável do ressurgimento do etnocentrismo entre os europeus mais velhos, menos letrados e de orientação política mais conservadora.)

Apesar de tudo, parece ser verdade que a execução, por um autoproclamado Estado judeu, de vários ataques assassinos no Líbano e em Gaza, e o apoio que esses ataques receberam de organizações oficiais de judeus em todo o mundo, determinaram um muito lamentável – embora absolutamente previsível – efeito de “respingamento” sobre todos os judeus, que parecem estar começando a ser, todos, considerados culpados. Se, como o Fórum Israelense de Coordenação da Luta contra o Antissemitismo [ing. Israeli Coordination Forum for Countering Anti-Semitism] afirmou “houve claro aumento no número e na intensidade de incidentes antissemitas” durante o massacre de Gaza; e se “com o cessar-fogo, houve marcado declínio no número e na intensidade dos incidentes antissemitas”; e “outro ataque semelhante à operação em Gaza determinará novo surto de atividade antissemita contra comunidades em todo o mundo”, então, método eficaz de combater o antissemitismo parece ser conseguir que Israel suspenda a prática de massacres.

Também é verdade que o crescente fosso entre apoio oficial aos belicistas israelenses e a rejeição popular aos mesmos belicistas parece estar servindo de combustível a mais teorias antissemitas conspiratórias. Na Alemanha, por exemplo, o establishment político e a mídia dominante não dão espaço a qualquer crítica contra Israel por causa do “relacionamento especial”, ideia que cresce na Alemanha, a partir do que se entende que seja “a responsabilidade histórica” da Alemanha. A chanceler Angela Merkel antecipou-se a outros líderes europeus na defesa de Israel durante a invasão de Gaza. Mesmo assim, pesquisas recentes mostraram que 60% dos alemães rejeitam a ideia de que os alemães tenham qualquer especial obrigação com Israel (entre os jovens, a porcentagem chega a 70%); 50% veem Israel como país agressivo; e para 60% Israel persegue seus interesses mediante métodos cruéis.

Em termos mais gerais, Gideon Levy lembrou “a cena surreal, no auge do brutal ataque contra Gaza, quando chefes de Estado da União Europeia vieram a Israel e jantaram com o primeiro-ministro, em manifestação de apoio unilateral ao lado que promovia matança e destruição.” E embora tenha sido Israel a quebrar o acordo de cessar-fogo e lançar a invasão, os líderes europeus fizeram coro aos EUA (e ao Canadá) e pregaram o desarmamento, não dos assassinos, mas das vítimas. É questão de tempo, e os europeus começarão a preocupar-se – se já não começaram – com os interesses que se escondem por trás das políticas internacionais de seus respectivos governos.

A acusação de antissemitismo contra os não-judeus que se indignaram contra o massacre de Gaza parece cada dia mais sem sentido e mais mal-intencionada, face à indignação crescente e claramente manifesta também entre os judeus. Ao mesmo tempo em que organizações oficiais de judeus lançavam manifestos de apoio a Israel na invasão de Gaza, por todos os lados surgiam manifestações contra o massacre de Gaza, e assinadas também por organizações de judeus.

Muitos judeus de alto prestígio na vida das comunidades judaicas criticaram também Israel, embora nem sempre essas falas tenham sido muito claras ou muito divulgadas. Quando Israel passou à ofensiva por terra, depois de uma semana de ataques aéreos, um grupo dos mais destacados judeus britânicos, que se autoapresentaram como “apoiadores profundos e apaixonados” de Israel, manifestaram-se “horrorizados” ante o crescente número de mortos dos dois lados” e conclamaram Israel a cessar imediatamente qualquer operação militar em Gaza. Em tom muito mais contundente, o deputado e ex-ministro de relações estrangeiras do “Shadow Cabinet” Gerald Kaufman declarou em debate na Casa dos Comuns sobre Gaza: “Minha avó estava de cama, doente, quando os nazistas chegaram à cidade dela, Staszow. Um soldado alemão matou-a a tiros, na cama. Minha avó não morreu para dar cobertura a soldados israelenses que assassinem avós palestinas em Gaza.” E acusou o governo de Israel de “explorar cruel e cinicamente o sentimento de culpa dos não-judeus pelo massacre de judeus no Holocausto, como justificação para o massacre de palestinos.”

Quase ao mesmo tempo, na França, Jean-Moïse Braitberg, escritor judeu muito popular exigiu que o presidente de Israel removesse o nome de seu avô do memorial no Yad Vashem dedicado às vítimas do holocausto nazista, “para que o nome do meu avô não continue a ser usado para justificar o horror praticado contra os palestinos.”

Na Alemanha, Evelyn Hecht-Galinski, filha de um ex-presidente do Conselho Geral dos Judeus na Alemanha, escreveu “Não o governo eleito do Hamás, mas o brutal exército ocupante (…) deve ser levado às barras do tribunal internacional de Haia”, ao mesmo tempo em que a seção alemã da organização Judeus Europeus a Favor de uma Paz Justa lançou manifesto em que se lia: “Os judeus alemães dizem NÃO à matança praticada pelo exército de Israel”.

No Canadá, oito mulheres judias que ocupavam o consulado de Israel conclamaram “todos os judeus a manifestar-se contra esse massacre”. E Anton Kuerti, aclamado pianista canadense declarou que “Os inacreditáveis crimes de guerra que Israel está cometendo em Gaza (…) fazem-me sentir vergonha de ser judeu.” Na Austrália, dois romancistas premiados e um ex-deputado assinaram declaração em que, como judeus, condenam “o ataque tão violentamente desproporcional de Israel contra Gaza”.

O governo Bush e o Congresso dos EUA deram absoluto apoio a Israel durante a invasão. Resolução culpando integralmente o Hamás por todas as mortes e pela destruição de Gaza foi aprovada unanimemente no Senado e por 390 votos a favor e 5 contra, na Câmara de Deputados. Praticamente toda a mídia corporativa nos EUA também ofereceu, sem qualquer pejo, total apoio a Israel. “No Dia de Ano Novo, o esquadrão de louvação a Israel ocupou todas as páginas de colunas assinadas de todos os principais jornais nos EUA, como se fossem quintal seu”, observou o jornalista Max Blumenthal. “De todas as colunas assinadas publicadas no Washington Post, no Wall Street Journal e no New York Times desde o início da guerra contra Gaza, apenas uma coluna manifestava alguma dúvida quanto à correção e justeza do assalto.”

O máximo em matéria de ouvir os dois lados, para o New York Times, consistiu em publicar, lado a lado, os delírios de Jeffrey Goldberg sobre o mal absoluto representado pelo Hamás, e os conselhos de Thomas Friedman, para que Israel infligisse “pesadas dores à população de Gaza”. O rival novaiorquino do Times, o New York Daily News publicou coluna assinada pelo rabino Marvin Hier que conclamava os líderes mundiais a “nunca mais reconstruir Gaza”, apesar do sofrimento de “muitos civis”, porque “terroristas e gente que apóia terroristas não merecem qualquer mercê por sua desumanidade, crimes e cumplicidade.” Hier é fundador e líder do Centro Simon Wiesenthal e do Museu da Tolerância. Na névoa desse esquadrão de linchamento, até organizações de defesa dos direitos humanos dedicaram-se a condenar pesadamente o Hamás.

Apesar dessas doses massivas de veneno, pesquisas de opinião pública mostraram que, embora a maioria criticasse sempre muito pesadamente o Hamás, apenas 40% dos norte-americanos aprovavam o ataque israelense; e entre os eleitores do Partido Democrata (onde há grande número de judeus), a aprovação caía a 30%. Numa dramática manifestação de independência, que fez lembrar Jimmy Carter ao publicar seu Palestine Peace Not Apartheid, um ícone liberal, Bill Moyers, criticou Israel em seu programa de grande audiência, “Bill Moyers Journal”: “Ao matar indiscriminadamente idosos, crianças, famílias inteiras, ao destruir escolas e hospitais, Israel fez exatamente o que fazem os terroristas.”

Como Carter, Moyers imediatamente se tornou também alvo preferencial de Abraham H. Foxman, que o acusou de “racismo, revisionismo histórico e complacência com terroristas”; e do professor de Direito em Harvard, Alan M. Dershowitz, que escreveu sobre a “falsa equivalência moral” que Moyers teria construído entre o terrorismo do Hamás e o exército de Israel que “inadvertidamente matou alguns poucos civis palestinos usados como escudos humanos pelo Hamás.” Mas, outra vez como Carter, Moyers não cedeu e, depois que vários outros liberais saíram em sua defesa, conseguiu emergir sem arranhões, dessa fuzilaria de críticas e calúnias.

Enquanto avançava a invasão de Gaza, e as imagens de uma carnificina chocante transmitidas ao vivo pela rede Al-Jazeera já não podiam ser ignoradas, começaram a surgir fissuras na corrente dos apoiadores de Israel ditos ‘moderados’. Sob o título de “A Solução dos Dois Estados perdeu a hora e a vez?” o programa “60 Minutos”, dos mais vistos nos EUA, levou ao ar matéria sobre colonos judeus na Cisjordânia, em que se viam “residências de famílias árabes ocupadas por soldados do exército de Israel”. A página dos editoriais do Wall Street Journal, tradicionalmente de direita, publicou artigo assinado pelo professor de Direito George E. Bisharat sob a manchete “Israel comete crimes de guerra.” Roger Cohen, colunista do New York Times e incansável defensor de Israel, confessou em várias colunas que “estou envergonhado de ver as ações de Israel”. Noutra coluna, Cohen especulava: “a continuada expansão das colônias, o bloqueio contra Gaza, o muro de separação na Cisjordânia e o recurso à tecnologia de guerra” parecem ter sido planejadas precisamente para “humilhar os palestinos, quebrar-lhes a resistência e a autoestima, até que desistam de lutar por seus sonhos legítimos de alcançar um Estado, cidadania e dignidade.”

Para Andrew Sullivan, ex-editor de New Republic e autor conservador, o ataque dos israelenses contra Gaza “está longe do que se pode considerar atitude moral (…), nessa guerra que parece ser guerra de um lado só”. E chamou de “bárbaros” os judeus de direita que defendiam “a terrível carnificina que Israel pratica hoje (financiada em parte pelos EUA).” Philip Slater, autor de The Pursuit of Loneliness, estudo sociológico, declarou que “A Faixa de Gaza é pouco diferente de um grande campo de concentração comandado por israelenses, nos quais os palestinos são perseguidos e atacados, morrem de fome, não têm nem gasolina, nem água, nem energia elétrica – não encontram nem materiais de primeiros socorros. (…) Difícil, isso sim, seria respeitar os palestinos se não reagissem, pelo menos, com alguns foguetes de fabricação caseira”.

Enquanto isso, o Conselho Municipal de Cambridge, Massachusetts, enclave liberal, que abriga a Universidade de Harvard, adotou resolução “condenando os ataques contra e a invasão de Gaza pelo exército de Israel e os ataques com rojões de fabricação caseira lançados contra a população de Israel”; e um grupo de professores universitários nos EUA lançou campanha nacional conclamando ao boicote acadêmico e cultura contra Israel. Pesquisa feita pela organização American Jews descobriu que 47% dos entrevistavam apoiavam fortemente o ataque israelense, mas – em violento contraste com a ideia de que haveria massiva solidariedade a Israel – 53% dos entrevistados mostraram-se ambivalentes: 44% aprovavam ou desaprovavam “com reservas”; e 9% declararam-se “absolutamente contrários”.

Analistas experientes da comunidade dos judeus norte-americanos já detectam “mudanças pós-Gaza”. À parte “o segmento dos mais conservadores da comunidade pró-Israel”, observou M. J. Rosenberg do Fórum Israel Policy, “poucos manifestam abertamente apoio àquela guerra. Em Nova York, cidade na qual, no passado, se reuniram multidões de 250 mil pessoas em manifestações de ‘solidariedade’ a Israel, apenas 8 mil foram a Manhattan para uma manifestação “de judeus” num domingo de sol. Em confronto público com a liderança tradicional da comunidade, organizações de judeus consideradas hegemônicas, embora menos conhecidas, como a J Street, ficaram a meio caminho e “reconhecem que nem os israelenses nem os palestinos têm qualquer monopólio dos certos e errados”; e recomendaram “que se evitem as posições estreitas de ‘nós contra eles’, em todas as questões do Oriente Médio. ”

Fundada em 2008, a organização J Street aspira a ser um contraponto liberal ao American Israel Public Affairs Committee (AIPAC). É cedo demais para saber se J Street – que trabalha atualmente numa agenda vagamente progressista, embora também se defina como “mais próxima” do Kadima, partido político israelense liderado por Tzipi Livni – chegará a firmar-se como “oposição leal” ou se aprofundará o teor das críticas contra a política israelense à medida que se aprofundar o fosso que separa os judeus norte-americanos e o atual governo de Israel.

Por sua vez, o grupo American Jews for a Just Peace divulgou manifesto conclamando os soldados israelenses “a porem fim à prática de crimes de guerra”. Outro grupo (“Judeus dizem não!”) reuniu-se em manifestação em frente da sede da Organização Sionista Mundial e dos escritórios da Agência Judia. E o grupo “Judeus contra a ocupação” distribuiu panfletos no West Side em Nova York, em que se lia “”Israel, saia de Gaza, AGORA!” Nos círculos intelectuais judeus liberais, só os apoiadores perpétuos de Israel, a maioria dos quais foram arregimentados depois da guerra de junho e já passam hoje dos 70 anos, ousaram manifestar-se em defesa da invasão de Gaza.

Para Michael Walzer, filósofo, pareceu óbvio que Israel exaurira todas as alternativas não violentas antes de atacar; e culpa do Hamás, se morreram civis. Para Walzer, a única “questão relevante” seria se Israel fez tudo que poderia ter feito para diminuir o número de baixas entre os civis.

Como sempre, para Alan M. Dershowitz, Israel “empreendeu seus melhores esforços para não matar civis”, estratégia que falhou porque o Hamas investiu na “estratégia de matar bebês”, para forçar Israel a matar crianças palestinas e, assim, conquistar a simpatia da comunidade internacional.

Também como sempre, para Martin Peretz, editor de New Republic, que examinou os sapatos dos palestinos, o bloqueio de Gaza seria benigno: “É preciso examinar os pés dos palestinos, para ver que usam tênis novos e, evidentemente, caros.”

Paul Berman entendeu como óbvia “uma possibilidade” de que o Hamás algum dia venha a promover o genocídio de judeus, “se se permitir que o Hamás continue a prosperar, e se seus aliados do Hezbollah e do governo iraniano conseguirem prosseguir com seus planos para construir bombas atômicas”. Sendo isso óbvio, Berman conclui que Israel, sim, tem todo o direito de atacar os palestinos, como medida de prevenção. (…)

Mas houve um influente contingente de intelectuais públicos liberais judeus que não se calou: a nova geração de bloggers judeus liberais e colaboradores regulares dos websites liberal-Democratas (p. ex., Salon.com e Huffington Post). Quase todos, são editores, anunciantes, patrocinadores, animadores de redes sociais, todos judeus, mas que falam por uma geração que, em larga medida amadureceu em mundo no qual a mitologia sionista já havia sido deslocada e superada por pesquisa histórica sóbria. O establishment político israelense é hoje magro e reacionário. As práticas de Israel no quesito Direitos Humanos já foram acuradamente analisadas pelos especialistas em direitos humanos.

A paranóia induzida pelo Holocausto e o ‘argumento’ do antissemitismo colidiram contra a realidade cotidiana de uma triunfante assimilação dos judeus em toda parte, da Ivy League a Wall Street, de Hollywood a Washington, do clube de campo ao altar de casamento. Profissionalmente, mentalmente e emocionalmente emancipada dos antolhos do passado, esse judeus íntimos da internet partiram para a ofensiva contra a invasão de Gaza desde o primeiro momento.

Há aí um simbolismo que não se pode ignorar. Onde os apologistas mais linha-dura a favor de Israel, como Walzer, Dershowitz e Peretz embarcam ainda no barco dos sionistas, os mais jovens, uma geração de intelectuais públicos judeus que hoje fazem nome e currículos na internet já saltaram dele. “Tenho pena deles, que desprezam sua herança”, sibilou Peretz. “São fedelhos barulhentos.”

Aqui estão alguns dos fedelhos barulhentos, representados por mensagens redigidas por eles.

Ezra Klein (25 anos; blogueiro da página American Prospect), em msg postada no 2º dia da invasão de Gaza: “Os rojões lançados pelos palestinos com certeza “perturbam profundamente” os israelenses. Os postos de controle, os bloqueios nas estradas, a restrição ao direito de ir e vir, a desesperadora falta de empregos, a opressão cada dia mais cruel, as humilhações diárias, as colônias ilegais – desculpem, “os assentamentos” – tudo isso perturba muito mais profundamente os palestinos; e são agressão muito mais grave. E os 300 palestinos mortos, esses, então, nos deveriam perturbar mais profundamente, a todos.”

Adam Horowitz (35 anos; blogueiro de Mondoweiss) escreveu, no 4º dia da invasão, em resposta à coluna de Benny Morris no New York Times: “É evidente que ele só vê as reações, não a causa. Lista respostas a Israel e a ininterrupta colonização da Palestina histórica, sem mencionar que há um elefante na sala; que, se Israel está encurralada, foi Israel quem buscou essa situação.”

Matthew Yglesias (28 anos; blogueiro de Think Progress) escreveu, no 6º dia: “Enquanto Israel diz que quer deixar os palestinos em paz em seu enclave minúsculo, superpovoado, economicamente inviável, o ‘desengajamento’ de Gaza [em 2005] jamais significou que os palestinos passariam a controlar suas fronteiras ou exercer qualquer soberania significativa sobre a área. A proposta, de fato, foi clara: os palestinos abdicam da violência armada contra Israel e, em troca, a Faixa de Gaza será tratada como reserva de índios.”

Dana Goldstein (24 anos; blogueira de American Prospect) escreveu, no 12º dia: “Quero ainda acreditar que a experiência histórica, coletiva do judaísmo e do sionismo pode levar a alguma coisa melhor – algo mais humano – do que o que vi no Oriente Médio semana passada!”.

Glenn Greenwald (42 anos; blogueiro de Salon.com) escreveu no 13º dia: “Não é uma guerra. É o massacre de um lado pelo outro”. E depois, dia 30/1/2010: “É simplesmente impossível fazer progresso real nos objetivos domésticos de restaurar a Constituição e reverter as expansões militares e de espionagem dos israelenses, se, simultaneamente, continuarmos a apoiar cegamente as muitas guerras de Israel (porque acabamos nos afundando, nós mesmos, naquelas guerras).”

Dia 20/2/2009, Greenwald respondeu insinuação de Jeffrey Goldberg de que ele seria “odiador de judeus”, “carrasco de Israel”:

“Pessoas como Jeffrey Goldberg” (…) respondeu Greenwald, “já abusaram, manipularam, exploraram tanto as acusações de “odiador de judeus”, “carrasco de Israel” e acusações de ‘antissemitismo’, sempre para fins desavergonhadamente pessoais, sempre impróprios, que, hoje, aquelas expressões já nada significam, perderam todo o conteúdo crítico, foram trivializadas até se converterem em caricaturas. (…). De fato, pessoas como Goldberg vão se tornando cada vez mais ácidas, mais rançosas, mais agressivas naquela sua retórica, precisamente porque sabem que seus aparelhos de sevícia e tortura retóricas já não servem para nada.” (…) “Há mudança definitiva e importante nos debates políticos nos EUA sobre Israel”, concluiu Greenwald. “Eles já não conseguem semear cada vez mais discórdia com suas táticas de intimidação; e já sabem disso; por isso é que subiram o volume dos seus ataques e dos palavrões e xingamentos. A devastação de Gaza pelos israelenses, contra uma população civil cercada – e usando bombas, dinheiro e cobertura diplomática dos EUA – foi tão brutal e horrenda que mudou para sempre o modo como o mundo vê o conflito no Oriente Médio”. (…)

A metamorfose generacional em relação a Israel é ainda mais evidente nos campi universitários. “Em alguns campi universitários houve mudança profunda em direção a sentimentos mais claramente pró-palestinos ou anti-Israel”, lia-se no Inside Higher Ed, que continua: “Essa mudança foi provocada, em parte, pela guerra do último inverno em Gaza”. Anfiteatros lotados para assistir palestras de comentaristas que se opunham firmemente ao massacre dos habitantes de Gaza. Os grupos ‘pró’-Israel manifestavam dentro dos anfiteatros ou à entrada, sempre grupos pequenos, muitos dos quais nem foram vistos.

Alunos da Cornell University atapetaram as trilhas do campus com 1.300 bandeiras negras, uma para cada palestino morto em Gaza. (Depois, a instalação foi depredada.)

Nas universidades de Rochester, de Massachusetts, de New York, na Columbia University, no Haverford College, no Bryn Mawr College e no Hampshire College, os alunos organizaram abaixo-assinados, manifestações e ocupações [ing. sit-ins] exigindo que se oferecessem bolsas de estudo para alunos palestinos e ações de desinvestimento em indústrias fabricantes de armas e empresas que negociassem com as colônias ilegais exclusivas para judeus. No Hampshire College, os alunos conseguiram que os acionistas e patrocinadores da escola se manifestassem a favor de desinvestir em corporações norte-americanas que auferissem lucros diretamente da ocupação da Palestina.

Embora as organizações ‘pró’-Israel tenham repetido que “colégios e universidades (…) tornaram-se caldo de cultura para o crescimento de uma nova cepa de antissemitismo”, em praticamente todas as principais instituições os alunos judeus participaram ativamente das manifestações pró-palestinos, em comitês locais de “Estudantes pela Justiça para a Palestina” e de “Anarquistas na luta contra o Muro” [ing. Anarchists Against the Wall, além de participações individuais, como de Anna Baltzer, autora de “Testemunha na Palestina”, que visitou várias escolas, para falar pessoalmente do que vira acontecendo na Palestina.

Os laços de solidariedade que se criaram entre jovens judeus e jovens muçulmanos que se opõem à ocupação – em várias universidades, os grupos mais militantes reúnem radicais judeus não-religiosos e mulheres muçulmanas – permitem ter esperança de que será possível construir uma paz duradoura.

Depois de uma palestra que fiz numa universidade canadense, sobre o massacre de Gaza, recebi de presente dos organizadores um broche em que se lia “I ♥ GAZA.” Prendi o broche na minha mochila e parti para a aeroporto. Na fila para o embarque, um passageiro atrás de mim disse-me baixinho “Gosto do seu broche”. Vejam só, pensei eu, the times they are a-changing, como cantou Bob Dylan. Horas depois, pedi um copo d’água ao comissário de bordo. Ao me servir a água, o rapaz curvou-se e disse “Gosto do seu broche”. Hmm, pensei comigo, alguma coisa já está acontecendo por aqui.

* Nota dos editores:

Esse artigo é excerto de um capítulo do novo livro de Norman Finkelstein sobre o conflito de Gaza, This Time We Went Too Far – Truth and Consequences of the Gaza Invasion, publicado esse mês pela editora OR Books. Para comprar o livro, visite http://www.orbooks.com/. O livro não está à venda em livrarias nem em distribuidores de livros por internet.

[1] Em http://www.acbp.net/About/PDF/ARTICLE-Second%20thoughts%20about%20the%20Promised%20Land.pdf

[2] Organização de judeus, ativa em todos os campus universitários em todo o mundo; para conhecer, por exemplo, o Hillel de São Paulo, ver http://www.hillel.org/about/news/2003/20030520_new.htm

O artigo original, em inglês, pode ser lido aqui.

Tradução de Caia Fittipaldi

Programa do PSDB trará revisão do pré-sal

Caio Junqueira, de Brasília
do Valor Econômico
22/03/2010
O PSDB, caso vença as eleições presidenciais de outubro, deve rever a legislação que tramita no Congresso referente ao pré-sal. Os tucanos pretendem retomar as regras do marco regulatório do petróleo elaboradas no governo Fernando Henrique Cardoso em 1997, que estabeleceu o sistema de concessão da produção, e não de partilha, como defendido pela gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Avaliam, porém, que algumas alterações decorrentes da descoberta da camada do pré-sal e do consequente aumento da produção devem ser feitas. Entre as propostas já em debate estão o aumento das participações especiais (compensação financeira devida à União pelos concessionários nos casos de grande produção ou rentabilidade), dos atuais 40% do lucro líquido da exploração para até 70%. Isso poderia ser feito por meio de decreto presidencial, evitando o trâmite pelo Congresso.
Outra alteração seria incorporar as operações da estatal que o governo Lula quer criar para explorar o pré-sal num departamento da Petrobras, dispensando, assim, a criação de mais uma empresa pública. O partido aceita ainda rediscutir a distribuição dos royalties do petróleo, contanto que os contratos em andamento não sofram alterações e que atinjam apenas as licitações futuras do pré-sal, dentro de uma fórmula que não acarrete grandes prejuízos aos Estados produtores. Uma ideia adicional é fazer com que os royalties caiam em uma conta específica para investimentos, e não para financiar o custeio, como prevê a emenda Ibsen.
“Vamos restabelecer a racionalidade neste debate, discutir interesse nacional, interesse dos Estados federados, justiça tributária, política de desenvolvimento. Não vai ser essa bagunça. O debate que o governo patrocina não é sério. É superficial, demagógico e eleitoreiro. Não resiste a uma análise séria”, afirma o deputado federal Luiz Paulo Vellozo Lucas, presidente do Instituto Teotônio Vilela, o órgão de estudos do PSDB. Cotado a coordenar a elaboração do programa de governo tucano à Presidência, o deputado fala em nome do candidato a presidente, o governador José Serra, e diz que o partido está fechado na defesa do modelo de 1997 para a campanha.
Natural do Espírito Santo, Estado prejudicado com a emenda Ibsen, Vellozo Lucas afirma que três dos quatro projetos encaminhados pelo governo federal sobre o pré-sal foram “o maior erro de política de desenvolvimento desde a lei de reserva de mercado da informática de 1984″ e que seu partido deve reformá-los no caso de vitória na disputa eleitoral. O único projeto que ele preserva de maiores críticas é o que cria o Fundo Social.
Por outro lado, a capitalização da Petrobras é o maior alvo de ataques. “Não há como essa operação dar certo. As ações da Petrobras não se valorizam na expectativa da capitalização. Se os minoritários forem prejudicados na avaliação das reservas, o valor da empresa desaba. Se forem beneficiados, a operação será a maior ‘privataria’ da história do capitalismo e os operadores de Wall Street montarão um comitê da Dilma em New York”, diz.
Acrescenta ainda que a capitalização é a proposta do governo com maior potencial de irreversibilidade no futuro, mas que os danos que ele aponta como existentes poderiam ser reversíveis por medidas do Executivo contrárias a ela, como a não-emissão dos títulos do Tesouro que a operação pede. Outra maneira seria a via judicial, com as ações que ele prevê que os acionistas minoritários poderão entrar. É no Judiciário que ele também avalia que a emenda Ibsen vai parar, caso seus fundamentos sejam mantidos no Senado. As batalhas jurídicas arrastariam a indefinição do novo marco regulatório proposto pelos petistas para 2011 e, com a eventual mudança do governo, as rédeas do processo seriam retomadas pelos tucanos.
Vellozo afirma que a orientação do partido para a campanha será a defesa do modelo adotado em 1997, que diz ter permitido que o investimento anual do setor passasse de US$ 4 bilhões em 1997 para US$ 35 bilhões em 2009; que a participação do setor no PIB saltasse de 2% para 12%, que as descobertas quintuplicassem as reservas e que as receitas governamentais dos três níveis saíssem de R$ 200 milhões em 1997 para R$ 25 bilhões em 2008. “Mesmo com esse modelo vitorioso, vem o PT, acaba com as participações especiais e estabelece contrato de partilha, no qual a União fica com o bolo maior. Na verdade, o que eles pretendem é centralizar as ações da Petrobras e centralizar as receitas de petróleo na União.”
Durante a campanha eleitoral, Vellozo Lucas afirma não temer prejuízos ante o discurso nacional-desenvolvimentista que os petistas deverão abordar no que se refere ao petróleo: “A especialidade do PT é criar ‘pegadinhas’ políticas para o PSDB ter que escolher entre a racionalidade e a popularidade. Já aprendemos isso e não caímos mais. Vamos mostrar que nosso modelo é melhor.”

COMENTÁRIO E & P

Os tucanos estão loucos para entregar a Petrobras e o pré-sal aos gringos. Esse partido não representa o povo brasilerio. Os Estados Unidos são ricos porque usaram o ouro da Califórnia e o petróleo do Texas para o seu desenvolvimento. Não tinham traidores entre os estadunidenses. No Brasil, o ouro das gerais foi para Portugal e de lá para a Inglaterra, tornando esse país rico. E agora que a natureza nos presenteia com essa riqueza estupenda, que ajudará o país a superar o atraso social e econômico, aparece o PSDB querendo fazer o que a corte portuguesa fez, dar a nossa riqueza para que as transnacionais estadunidenses e européias deixem os seus países mais ricos do que são, enquanto o povo brasileiro continua na pobreza. E os idiotas ainda acham que isso é racionalidade! Ficar de quatro para os países estrangeiros é moda na direita brasileira.