O que está em jogo para os EUA, na agitação no Bahrain?
por Juan Cole, Informed Comment
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
1. O Bahrain é um dos principais centros de refino de petróleo (refina cerca de 270 mil barris/dia). Não é grande quantidade, mas considerados os apertados suprimentos de petróleo, com o preço do barril de Brent Crude acima de $100, qualquer interrupção no refino fará os preços mundiais dispararem.
2. Está instalada no Bahrain a base da 5ª Frota da Marinha dos EUA, importantíssima na arquitetura da segurança dos EUA para o Golfo Persa (os árabes chamam de Golfo da Arábia). Cerca de dois terços das reservas testadas de petróleo do mundo e 45% das reservas mundiais de gás natural estão na região do Golfo.
3. Bahrain é importante centro financeiro.
A maioria xiita tenta firmar-se ali. Um governo dominado pelos xiitas no Bahrain pode exigir o fechamento da base naval dos EUA. Não se criaria ali um estado-fantoche do Irã, na medida em que os xiitas são zelosos da própria independência e a maioria dos xiitas do Bahrain não seguem aiatolás; mas com certeza se a maioria xiita mantém relações cálidas com Teerã. Uma vitória xiita ali daria força política a outros estados xiitas do Golfo, no Kuwait, na Arábia Saudita e nos Emirados Árabes Unidos (todos esses estados nos quais os xiitas são minoria). Até aqui, o Irã beneficia-se de vantagens do poder brando (“soft power”) nas regiões xiitas.
O saldo pode ser favorável ao Irã ou, no mínimo, haverá alguma desvantagem para os EUA – que já atirou no próprio pé, quando ajudou a implantar um governo xiita em Bagdá que mantém excelentes relações com o Irã.
O governo do Bahrain tornar-se mais democrático e mais influenciado pelos xiitas incomodaria o Estado saudita wahhabista, que hoje considera o rei sunita do Bahrain como aliado estratégico.
Milhares de manifestantes xiitas saíram às ruas ontem, no Bahrain. Exigem a saída do primeiro-ministro Sheikh Khalifa bin Salman Al Khalifa. Tio do rei, Sheikh Khalifa foi nomeado primeiro-ministro há 40 anos. Os manifestantes xiitas querem primeiro-ministro eleito, que manifeste a maioria demográfica xiita.
A morte de dois manifestantes, um na 2ª-feira e outro ontem, ajudou a mobilizar a multidão. Numa concessão rara, o rei Hamad Al Khalifa pediu perdão ontem pelas duas mortes e prometeu que os que atiraram serão julgados.
Os manifestantes ocuparam a área central de Pearl Roundabout, e muitos prometem passar a noite ali. O principal partido político xiita, com 18 votos na Câmara baixa do Parlamento (40 membros) é o partido Wifaq. Na 3ª-feira, os deputados do partido Wifaq retiraram-se do Parlamento, como protesto pela morte de dois manifestantes.
A população do Bahrain é de pouco mais de 1,2 milhão de pessoas, 54% das quais são trabalhadores expatriados levados para lá, metade dos quais indianos. Lembro das vezes em que estive em Manama, que se viam cartazes em idioma malaio, e lojas e casas de câmbio enfeitadas com galões malaios. Os demais 568 mil habitantes são nascidos no Bahrain. Cientistas sociais estimam que, desses, cerca de 2/3, aproximadamente 374 mil, são xiitas.
E desses, por sua vez, cerca de 100 mil são Ajamis, i.e. xiitas de herança iraniana, hoje já transformados em árabes. O restante da população são Baharna, xiitas nativos do Bahrai, que seguem principalmente a escola conservadora Akhbari – que não reconhece a autoridade dos aiatolás. Muitos deles vivem em vilas rurais, fora da capital.
Restam 187 mil habitantes, que são sunitas do Bahrain, comunidade à qual pertence o rei Hamad Al Khalifah – que reina desde 2002, depois de ascender ao poder como emir, em 1999.
No Golfo, em geral, trabalhadores estrangeiros não votam e não recebem visto de residentes permanentes nem direito de cidadania, embora circulem rumores de que o monarca sunita Hamad Al Khalifa tenha outorgado a cidadania do Bahrai a alguns sunitas expatriados, numa até agora vã tentativa de acalmar a maioria sunita nativa.
A constituição do Bahrain permite que o rei sunita indique 40 membros da Câmara alta do Parlamento. A Câmara baixa também tem 40 membros, e nas eleições de 2010 o partido religioso xiita, Wifaq, liderado pelo clérigo Ali Salman, conquistou 18 lugares. Os demais 22 assentos ficaram distribuídos entre sunitas de várias tendências.
Assim, em país no qual cerca de 2/3 dos cidadãos são xiitas, os xiitas não são proporcionalmente representados no Senado, e são minoria até na Câmara Baixa, que é eleita. Não apenas a Câmara alta dominada pelos sunitas pode vetar medidas aprovadas pela Câmara baixa, mas o próprio rei pode vetar leis aprovadas e pode prorrogar o mandato dos representantes no Parlamento sempre que queira.
Muitos xiitas nas áreas rurais são muito pobres, apesar das riquezas do Bahrain, derivada de uma pequena indústria do petróleo, do setor financeiro que é vitalmente importante e da renda estratégica que o país obtém por manter ali a base da 5ª Frota da Marinha dos EUA. O partido Wifaq aspira não só a dar representação mais equilibrada para a maioria xiita, mas, também, a relações econômicas no país que prejudiquem menos os mais pobres.
A rede Aljazeera English mostra vídeo sobre o Bahrain em http://www.youtube.com/watch?v=XYaFh4CHaq4
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