quinta-feira, março 29, 2007

Saiu no Economínimo III

Distribuir faz crescer
O cálculo mais apurado do PIB mostrou que o crescimento da economia era maior do que o informado na contabilidade anterior. A nova metodologia revelou que esse maior crescimento, principalmente nos anos recentes, tem sido em boa parte explicado pelo aumento no consumo – das famílias e do governo. Deixou claro também que o investimento era menor do que o imaginado (a queda em 2005, da série antiga para a séria nova, foi de quase 20% do PIB para pouco mais de 16% do PIB).
Vai daí que alguns já saíram concluindo que assim não vai dar. Uma economia que cresce pelo lado do consumo, mas avança pouco nos investimentos, ou fica rondado em falso e crescendo pouco ou acaba caindo no precipício inflacionário, o que, no fim das contas, dá no mesmo, com mais distorções.
Esses alguns não têm coragem de dizer com todas a letras, mas a conclusão deles é aquela mesma: é preciso fazer o bolo crescer antes de distribuir.
Eis aí uma conclusão lamentável, que resulta da mistura de ignorância com viés ideológico. Afinal, faz tempo a realidade empírica fulminou a “teoria do bolo”.
Quando se compara, historicamente, em diversos países, curvas de distribuição de renda e curvas de crescimento, encontram-se resultados de todos os tipos. Em resumo, é possível crescer distribuindo renda ou crescer concentrando renda, da mesma forma que é possível distribuir renda sem crescer ou crescendo pouco.
Há economias com alto crescimento e piora na distribuição, como o Brasil entre os anos 70 e 90, a Tailândia, na década de 80 e a China, dos anos 80 até hoje. Mas há também países com baixo crescimento e melhora na distribuição, caso de Cuba e Colômbia, na década de 80, do Marrocos e Sri Lanka, nos anos 60 e 70 … e, informações frescas nos informam, o Brasil, na primeira metade da década de 2000.
Um estudo já antigo (de fevereiro de 2000), mas ainda valioso, da economista britânica Frances Stewart, então diretoria do Centro de Estudos do Desenvolvimento, da Universidade de Oxford, levanta evidências de que, no reverso da “teoria do bolo”, distribuir faz crescer (aqui, em inglês, francês ou espanhol). Embora um baixo crescimento dificulte a desconcentração de renda, uma melhor distribuição de renda deriva mais da adoção de políticas próprias e específicas voltadas a esse objetivo e esta é, por sua vez, fator de crescimento.
Ao examinar a trajetória econômica de Coréia, Taiwan, Indonésia e Malásia, alguns dos chamados “tigres asiáticos”, nos vinte anos entre 1975 e 1995, Frances Stewart encontrou um quadro de crescimento per capita entre 4,5% e 7% ao ano. Ao cabo desse período, o coeficiente de Gini, nestes países, variava de 0,29 a 0,48 (o indicador vai de 0 a 1 e quando mais perto de 1 indica maior concentração de renda). Apenas para comparar, no Brasil, entre 2001 e 2004, ocorreu significativo recuo no coeficiente de Gini, que caiu de 0,59 para 0,56.
Agora, atenção para os fatores explicativos da mudança positiva, nos países asiáticos acima citados, de acordo com as pesquisas de Frances Stewart: o crescimento e a distribuição de renda se deram num ambiente que combinava reforma agrária, exportações intensivas em mão-de-obra e maciços investimentos em educação. Querem que repita o tipo de política que levou à distribuição de renda e ao crescimento que hoje tanto invejamos – inclusive os que resistem à reforma agrária, às políticas afirmativas e às políticas verticais – ou não precisa?
No Brasil, mesmo antes do atual período em que se verifica uma redução das desigualdades de renda em meio a um crescimento econômico relativamente baixo, estudos de economistas do Ipea, liderados pelo especialista Ricardo Paes de Barros, concluíam, em cima de simulações estatísticas que a adoção de políticas redistributivas teriam tão ou mais efeito para a desconcentração de renda do que o crescimento econômico em si.
A vida real está comprovando o acerto desses estudos. E, mesmo assim, ainda há quem invoque a “teoria do bolo”. É de doer.

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