Por Laerte Fedrigo*
A exemplo do temeroso, o atual governo busca, a todo custo, aprovar a contrarreforma da previdência, propondo, entre outras atrocidades, elevar o tempo de contribuição para 40 anos e a idade mínima da aposentadoria para 65 anos para os homens e 62 para as mulheres, além de igualar os trabalhadores do campo e da cidade.
A justificativa continua sendo o déficit, visto como uma falácia por analistas e pesquisadores, segundo os quais, de acordo com os artigos 194 e 195 da Constituição Federal, a previdência não deveria ser bancada apenas pelas suas contribuições, ou seja, a folha de pagamento. A lei incluiria outras fontes, como a COFINS a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, o Imposto de Importação de Bens e Serviços e as loterias. Considerando essas fontes, o sistema seria superavitário. Isso sem contar os R$ 450 bilhões devidos ao INSS por empresas privadas, conforme apurou CPI do Senado.
De qualquer modo, se aprovada como está, a contrarreforma da previdência aprofundará as desigualdades. Se considerarmos a distribuição da população por idade, os dados indicam que enquanto no Sul e no Sudeste cerca de 11% da população têm mais de 65 anos, no Norte a porcentagem não chega a 7%. Se esta lei estivesse vigorando hoje, 11% da população poderia estar recebendo aposentadoria no Sul e no Sudeste, contra 6,8% na região Norte.
E não é preciso ir longe para avaliar a perversidade da proposta. Em São Paulo, enquanto nos bairros nobres a expectativa de vida beira 80 anos, na periferia não chega a 55. Quem se aposentaria nos bairros mais pobres?
Quer outro exemplo? Enquanto na população de até 59 anos, a proporção de negros é maior que a de brancos, na população de 60 anos ou mais, a proporção se inverte. Em prevalecendo a proposta, a população negra trabalhará e contribuirá por mais tempo, mas usufruirá menos da aposentadoria.
As mulheres serão as mais prejudicadas com a contrarreforma. Normalmente, elas se aposentam por idade (aos 60 anos), uma vez que não conseguem atingir o tempo mínimo de contribuição, hoje de 15 anos. Isso porque têm menor taxa de participação no mercado formal de trabalho. Pela proposta encaminhada, o tempo mínimo de contribuição passa para 20 anos. Ainda assim, a aposentada receberá 60% do benefício. Para receber 100% terá que contribuir por mais 20 anos. Algo impossível, considerando que as mulheres agregam o trabalho doméstico ao emprego remunerado.
Em lugar de mercantilizar a questão social, transformando a previdência em negócio, portanto, o governo deveria cobrar caloteiros, acabar com os privilégios e com as desvinculações de receitas e primar pela seguridade social, cumprindo o que estabelece a Constituição.
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* Bacharel e Mestre em Economia pela PUC/SP e Especialista em Gestão de Políticas Públicas pela Fundação Santo André.