O objetivo deste blog é discutir um projeto de desenvolvimento nacional para o Brasil. Esse projeto não brotará naturalmente das forças de mercado e sim de um engajamento político que direcionará os recursos do país na criação de uma nação soberana, desenvolvida e com justiça social.
terça-feira, julho 04, 2017
A falácia liberal e o colapso do planeta
Laerte Fedrigo*
Adam Smith, que é considerado o pai da economia, preconizava que a mão oculta do mercado asseguraria o desenvolvimento em nível de pleno emprego das forças produtivas. Esse brilhante economista escocês acreditava que todo indivíduo reuniria as melhores condições para julgar em qual atividade aplicar seu capital, de modo que constantemente se dedicaria a descobrir a melhor aplicação para o seu capital, com vista ao seu próprio interesse. Com efeito, ao preferir a aplicação que lhe acarretaria as melhores vantagens, o indivíduo seria conduzido pela mão oculta do mercado a promover o interesse de toda a sociedade.
Na esteira de Adam Smith, David Ricardo, importante economista inglês, defendia com fervor um modelo de desenvolvimento calcado na Teoria das Vantagens Comparativas. Segundo esse modelo, amplamente difundido pelo centro do capitalismo, cada país deveria se especializar na produção em setores que possuíssem vantagens comparativas, trocando os excedentes produzidos. Além de estimular o uso mais eficiente das potencialidades naturais e a distribuição mais eficiente do trabalho, essa especialização uniria a sociedade global por laços de interesse e intercâmbio, estando universalmente associada ao bem comum.
Não obstante o brilhantismo desses dois economistas, o tempo mostrou as limitações desses ideais liberais. Graças aos impulsos individualistas, a economia avançou de forma triunfante, mas o desenvolvimento se mostrou utópico, já que o atraso tecnológico e a desigualdade social tornaram-se as marcas registradas, sobretudo na periferia do modo capitalista de produção.
Para o brasileiro Celso Furtado e o argentino Raul Prebisch, economistas da CEPAL, o modelo de desenvolvimento preconizado por Smith e Ricardo inseriu os países da periferia na divisão internacional do trabalho como economias primário-exportadoras. Como as economias periféricas eram orientadas apenas para o mercado externo, ao invés de promover o desenvolvimento econômico, as riquezas ali produzidas foram canalizadas para o centro do capitalismo, retardando o processo de industrialização.
Além da industrialização tardia, o modelo de desenvolvimento internacional baseado na Teoria das Vantagens Comparativas legou à periferia a convivência com o subdesenvolvimento. Para Furtado e Prebisch, ao contrário do que ocorreu no centro do capitalismo, onde o processo de industrialização transformou as estruturas sociais, permitindo a homogeneização social, na periferia, a assimilação de novas técnicas e o aumento da produtividade agravaram a concentração de renda, uma vez que os benefícios decorrentes da industrialização foram desfrutados apenas pela parcela que exerceu o controle direto sobre os segmentos afetados pelos ganhos de produtividade. Ademais, ao se especializar na produção primário-exportadora, acrescentam, o acesso da periferia ao progresso técnico se deu inicialmente pela via da importação de bens de consumo, chegando somente posteriormente à produção. Além de impedir a pressão assalariada por melhorias nas condições de vida dos trabalhadores, esse processo engendrou nas elites um padrão de consumo típico das economias centrais, de sorte que o processo de industrialização consolidou estruturas tradicionais de dominação, favorecendo a industrialização pela via conservadora, configurando a marginalização social.
Na segunda metade do século 20 houve uma mudança importante no processo de acumulação capitalista, quando o Estado passou a regular a economia por meio das políticas econômicas. Essa transformação do Estado foi responsável pelo boom que se estendeu do imediato pós-guerra ao início da década de 1970, pela redução do desemprego e pela melhora considerável nas condições de vida da população em geral, especialmente nos países centrais. Mesmo na periferia, essa ação coordenada pelo Estado provocou uma redução da desigualdade de riqueza, com efeitos positivos sobre os índices de pobreza extrema e moderada. Ainda assim, segundo dados da OIT, 36% da população dos países periféricos continua nesta situação.
Para piorar, como nos alertou Thomas Piketty em 2013, nos últimos anos o mundo apontou para um crescimento da desigualdade de riqueza, contrariando a tendência de décadas anteriores. Segundo dados do banco Credit Suisse, em 2010 o 1% mais rico da população adulta do planeta possuía 43% da riqueza mundial; em 2015 já era 50%. Enquanto isso, no período, a apropriação da riqueza dos 50% mais pobres caiu dos míseros 2% para menos de 1%.
Resta considerar a questão do aquecimento global. Desde a revolução industrial há uma elevação da temperatura média do planeta, provocada pela emissão de gases do efeito estufa, a exemplo do gás carbônico e do gás metano. É indiscutível, porém, que esse processo foi acelerado nos últimos anos. Os dados indicam que o século XX foi o período mais quente da história, com o aumento de 0,7ºC na temperatura média do planeta. Num cenário otimista, as previsões para o século XXI são de que a temperatura aumentará 1ºC, podendo chegar a 4ºC num cenário pessimista.
É importante lembrar que nas últimas décadas o modo capitalista de produção lançou mão de um conceito desenvolvido pelo economista austríaco Joseph Alois Schumpeter, “a destruição criativa”. Assim, a cada instante um modelo novo é colocado no mercado, forçando a sociedade ao consumismo desenfreado por meio do marketing agressivo, já que para além da publicidade e da propaganda, o marketing foi incorporado à estrutura física do mercado, a exemplo do shopping center, cuja entrada lembra o portal do paraíso. Assim, quem se dirige ao mercado vai ao encontro com Deus. Como não há racionalidade nessa relação, consome por impulso.
As consequências desse processo são catastróficas. Com o aumento da temperatura do planeta há o derretimento das calotas polares e com isso a elevação do nível dos oceanos, que por sua vez provoca vários desastres naturais, causando a redução da biodiversidade. As alterações climáticas exercem impacto também sobre a agricultura, já que o aumento da temperatura média do planeta ameaça o cultivo de várias plantas, que combinado com o excesso de chuvas em alguns períodos e longas estiagens em outros, pode agravar o problema da fome, já que o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) prevê uma redução de cerca de um terço da quantidade de comida disponível até 2050.
Eric Hobsbawm, nobre pensador egípcio, dizia que se quiséssemos ter um futura reconhecível, não poderia ser pelo prolongamento do passado ou do presente. Por esse caminho iríamos fracassar e o preço do fracasso seria a escuridão. Uma coisa é certa, correm turvas as águas deste rio,talvez já com suas margens indevidamente habitadas, talvez já sem oxigênio, talvez já sem peixes. Se nada for feito para inverter esta escalada destrutiva, países e populações pobres e vulneráveis serão os mais afetados. A história dirá!
*Mestre em Economia Política pela PUC-SP.
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