Antônio de Souza: Nossa saída está na economia política mas sem retrocessos
publicado em 30 de junho de 2015 às 14:48
european-crisis
por Antônio de Souza, especial para o Viomundo
Os brasileiros acordaram e descobriram a crise da Grécia nas páginas de nossos principais jornais. Mais ainda, estão sendo informados agora que a crise econômica global ainda existe e pode piorar.
Mas como assim? A crise do capitalismo internacional de 2008 não tinha sido debelada? Os Estados Unidos não estavam crescendo fortemente, saindo da crise? A crise na Europa não era apenas um caso pontual, provocado pela leniência dos países ao sul do continente — Grécia, Portugal, Espanha e Itália?
É isso, caros leitores, pelas lentes, microfones e textos de nossa mídia, a crise internacional foi um assunto menor nos últimos anos. A globalização do capital, como num passe de mágica, deixou de existir, bem como seus efeitos sobre a economia brasileira.
Esta narrativa da mídia brasileira esconde que, segundo o FMI e o BID, 60% do crescimento econômico advêm do fator externo. E que são estes elementos que ainda podem fazer piorar a nossa situação e aprofundar a crise em todos os países ao redor do mundo.
Em outras palavras: a crise grega e a irresponsabilidade de políticas neoliberais adotadas (ajustes fiscais e políticas monetárias restritivas), inclusive aquelas que estão sendo tomadas agora no Brasil, podem atingir ainda mais a nossa economia.
O objetivo desta narrativa da mídia brasileira era, claro, internalizar a crise e dizer que a culpa era exclusivamente da Presidência da República. Mais precisamente da forma como os governos Dilma e Lula conduziram o país nos últimos anos.
O aparato midiático, em apoio ao mercado financeiro, utilizou-se disto para fazer a famosa “guerra de expectativas”. Queriam políticas econômicas internas que ajudassem ainda mais na acumulação financeira. Juros altos, cortes de despesas e do crédito. A terapia que está justamente criando crises econômicas, políticas e sociais no continente europeu. De tanta pressão interna que exercem, estão conseguindo.
De qualquer modo, sempre é necessário dizer que parte desta crise vem do sumiço de pelo menos US$ 1 trilhão do mercado de crédito internacional, com seus efeitos sobre todas as economias do mundo e também a brasileira. Sem crédito, as economias param.
Por isso o governo federal teve que ampliar o crédito público nos últimos anos para minimizar a crise econômica. Por isso o mercado financeiro e seu aparato midiático vêm criticando tanto as políticas econômicas implantadas pelo governo federal nos últimos anos. Não foi à toa que estes setores foram ao ataque contra o BNDES, visando ampliar a crise e permitir a vitória da oposição em 2014.
Temos que dizer claramente que o mundo não conseguiu sair da crise econômica internacional, e que estamos em outro momento de acirramento da mesma crise que se iniciou em setembro de 2008.
O episódio grego é fundamental para entendermos a engrenagem da crise.
Para evitar o colapso do sistema bancário, os governos tiveram de se endividar ainda mais desde 2008.
A partir de 2010, em outro surto neoliberal, o governo alemão acreditou que a austeridade seria a forma de se evitar a crise e fez uma política draconiana na Europa, com corte de gastos públicos, que não resolveram a crise econômica e muito menos diminuíram a dívida pública dos países (aqui e aqui).
A Grécia perdeu um quarto de sua riqueza desde 2008, ou seja, os cidadãos da pátria da democracia perderam um quarto de seu patrimônio neste período seguindo as políticas de ajuste fiscal. Por isso, não querem mais recessão e se negam a continuar seguindo o receituário neoliberal.
A crise grega acaba envolvendo todos os outros países, ainda mais quando a economia americana dá sinais de fraqueza – com queda do PIB de 0,7% - e a crise econômica persiste no Japão e na Europa, além do enfraquecimento da economia chinesa.
Por isso, se a Grécia decretar moratória e não pagar a sua dívida – calculada hoje em 340 bilhões de euros – causará problemas em todos os bancos europeus, particularmente os alemães. Provavelmente a Grécia sairá do Euro, e a porta ficará aberta para que a Inglaterra e outros países também saiam.
Esta situação pode nos levar a uma ampliação dos conflitos na Europa e ao redor do mundo, com a emergência de um novo fascismo, já visível, apresentando-se como uma saída possível, o que já ocorreu nos anos 30 e 40 do século passado.
Temos duas certezas sobre isto: é fácil entrar em uma recessão e em uma ditadura fascista, mas será difícil e custoso sair dessa situação. Desde 2010, podemos observar o crescimento do movimento fascista pelo mundo e também em nosso país.
Aqueles que amam a democracia devem se unir, visto que poderemos assistir à ampliação da intolerância e a destruição do Estado de Direito.
É isto que estamos assistindo a cada dia.
Os governos Lula e Dilma esgotaram quase todos os instrumentos que tinham à disposição para enfrentar a crise mundial desde 2008: ampliação do crédito, redução dos juros, ampliação das políticas sociais, renúncia fiscal, barateamento de tarifas, desoneração tributária. Mantiveram o emprego e a renda quase intactos. Mais do que isso só com reformas mais profundas – a tributária, por exemplo, taxando os mais ricos e o capital financeiro e desonerando a classe média, a classe trabalhadora e os investimentos produtivos e em infraestrutura – em meio a um debate político mais amplo.
O governo Dilma antecipou-se à situação crítica na Grécia e suas consequências mundiais, implantando um forte ajuste fiscal. Diante do novo ápice da mesma crise de 2008, o governo brasileiro terá que se voltar para um pacote mais amplo, abrindo discussões sobre a implantação de um sistema tributário mais justo que permita a implantação de uma nova política de crescimento econômico em bases mais sólidas.
Nossa saída está na economia política, sem retrocessos.
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