segunda-feira, setembro 21, 2015

13 pontos sobre a situação política e as tarefas do Partido.

Valter Pomar*


1. Estamos sendo vítimas de uma operação de “cerco e aniquilamento”. Não estamos “apenas” diante do risco de perder o governo, agora ou em 2018. Nem “apenas” de levar uma sova nas municipais de 2016, apesar da ótima decisão do STF acerca do financiamento empresarial. Nem “apenas” diante da tragédia de ver nosso governo implementar, em crescente medida, o programa dos derrotados em 2014. Muito mais grave do que isto, estamos ameaçados de assistir a um retrocesso geral nas liberdades democráticas, nas condições de vida da classe trabalhadora e na política externa. Em particular, nosso Partido dos Trabalhadores e sua principal liderança estão sob ameaça de desmoralização e interdição.

2. Estamos sob ataque múltiplo. Não existe uma única operação conduzida por uma única direita. O grande capital, o oligopólio da mídia, a oposição de direita e inclusive setores da base do governo parecem cada vez mais unificados quanto aos objetivos finais (realinhar o país com os EUA, desfazer as conquistas populares, interditar a esquerda). Mas eles ainda estão divididos quanto ao que fazer de imediato. Moro, Cunha, Renan, Temer, Aécio, Serra, Alckmin etc. jogam papéis e expressam interesses diferentes, motivo pelo qual apostam em roteiros diferenciados. Mas isto, que poderia ser um fator positivo a nosso favor, converte-se na prática numa dificuldade adicional, uma vez que não existe de nossa parte uma política coordenada e centralizada de defesa. O que fica particularmente claro na nossa atitude (ou falta de) frente a berlusconiana Operação Lava Jato.

3. A manutenção da atual política econômica sabota o apoio popular ao governo. É muito difícil termos êxito na defesa do governo e das liberdades democráticas, contra as diferentes alternativas golpistas (impeachment, novas eleições, posse do vice, parlamentarismo), sem que ocorra uma alteração imediata na política econômica. É muito difícil engajar amplos setores populares em nossa defesa, se as ações do governo contribuem para a recessão e o desemprego. É praticamente impossível reavivar o apoio entusiasmado dos setores democráticos, quando os fatos apontam no sentido de que o governo desrespeitou o voto popular, aplica o programa dos derrotados, comete “estelionato eleitoral” como se diz cada vez mais. Lutaremos contra o golpismo em qualquer caso, mas a política econômica reduz as chances de êxito, tanto agora quanto depois.

4.Nosso problema não é de “narrativa”. Ganhamos quatro eleições presidenciais seguidas, não apenas devido aos nossos feitos, mas também devido à narrativa que contamos a respeito. Acontece que ganhamos a eleição em 2014 falando uma coisa e iniciamos o governo fazendo exatamente o contrário. Quais as causas disto? Não basta falar da crise internacional, da oposição de direita, dos erros do PT e da presidenta Dilma. Há outro aspecto fundamental: o esgotamento da estratégia de conciliação. Por isto, o que deu certo em 2003 não dará certo em 2015. Sem mudar de estratégia, sem abandonar a conciliação e as ilusões nos inimigos, a política de “apoiar e empurrar o governo” (para citar palavras ditas em recente reunião da FPA) vai resultar apenas e tão somente em patinar.

5. Não basta mudar a política econômica, é preciso mudar o conjunto da política. Mas insistir na atual política econômica, convertendo o ministro Joaquim Levy (e os setores do grande Capital que ele representa) em fiador de nossa continuidade no governo, arrasta o governo, o PT e Lula para o fundo do poço. Os fatos já demonstraram que o ajuste não resolve a questão fiscal nem contém a inflação, pelo contrário. Além disto, o ajuste derruba o crescimento, provoca desemprego, reduz políticas sociais e salários. Cria um ambiente hostil para o governo e também hostil para uma possível candidatura Lula em 2018. A popularidade da principal liderança popular do país terá muita dificuldade de resistir aos efeitos combinadas da atual política econômica, dos ataques da mídia e da Operação Lava Jato.

6.É preciso “romper o cerco”. Para usar uma analogia militar: se ficarmos onde estamos, seremos destruídos. É preciso mudar de posição. Isto parece arriscado e é. Mas muito mais arriscado é o imobilismo. Romper o cerco exige escolher o ponto por onde vamos tentar escapar. Em minha opinião, o ponto onde podemos romper o cerco com mais chances de êxito –tanto imediato quanto posterior-- é a política econômica. É preciso mudar imediata e radicalmente a política econômica. Mudar a política envolve alto risco, mas a alternativa em curso é muitas vezes pior. Sem outra política econômica, tão cedo não haverá reversão do quadro de recessão e desemprego. Quem acha errado dar “cavalo de pau” na política econômica precisa lembrar que isto significa apenas e tão somente desfazer o cavalo de pau dado após a eleição, na contramão da opinião majoritária no eleitorado. Por outro lado, é preciso lembrar os efeitos positivos – tanto econômicos quanto políticos—da inflexão que fizemos depois de 2005 e da reação que tivemos frente a crise de 2008. Lá foi necessária uma inflexão. Agora será preciso algo mais. Por fim: sem mudar a política, não há como mudar o discurso atual, que piora o que já é ruim, que joga para baixo nosso ânimo.

7.É possível fazer diferente. Embora vá ser muito difícil, não é verdade que não tenhamos força para fazer diferente. Muito menos é verdade que não saibamos o que fazer. Sem prejuízo de discutir a proposta econômica debatida pela CUT e a que vem sendo debatida com a participação da FPA, no curto prazo o que necessitamos é – em grande medida-- retomar, aprofundar e principalmente atualizar um caminho que já começamos a trilhar antes e ideias que foram apresentadas durante a campanha de 2014. Do ponto de vista emergencial, trata-se de reduzir a taxa de juros, alongar o pagamento da dívida pública, estabelecer controle de câmbio, lançar mão das reservas internacionais, tributar fortemente as grandes fortunas, cumprir o orçamento, retomar o papel da Petrobrás e do Minha Casa Minha Vida. Numa palavra, parar o ajuste e colocar o Estado à serviço do crescimento com e através da distribuição de renda. Quanto ao desenho geral de nossa alternativa: a) sem indústria forte e tecnologicamente avançada, não há como implementar nosso programa e estratégia; b) sem um setor financeiro poderoso e público, não teremos capital para fazê-lo; c) sem resolver a questão agrária e universalizar as políticas sociais, será impossível conciliar desenvolvimento econômico com elevação do bem-estar social; d) sem fazer tudo isto junto e misturado, será impossível no médio prazo derrotar a direita e sua ofensiva contra as liberdades democráticas conquistadas pela classe trabalhadora, nem tampouco sustentar uma política externa soberana e de integração regional.

8.Ao mesmo tempo que buscamos convencer o governo a mudar de política, o Partido precisa subir muito o tom contra o golpismo. Para além do que se faça no Congresso Nacional para garantir uma minoria de parlamentares que impeça a aprovação do impeachment; para além das mobilizações que a Frente Brasil Popular está convocando; é preciso que o PT deixe claro para nossa base social e militante que estamos sob risco iminente. Temos que desencadear esta semana uma vigília permanente em defesa das liberdades democráticas e contra o golpismo. Ao mesmo tempo, precisamos fazer a direita perceber que haverá muita resistência. Gestos simbólicos – como esvaziar os “pixulecos” -- devem ser estimulados publicamente. Nossos parlamentares precisam mudar de postura e dar exemplo de combatividade. Não podemos deixar nenhum ataque sem resposta. E basta de ilusões acerca do que está em jogo, não apenas em relação ao governo, mas também em relação ao PT e Lula. É verdade que não estamos em 1947 nem em 1964; mas também é verdade que nas duas ocasiões a maior parte da esquerda demorou muito a perceber qual a real disposição da direita, o que contribuiu para o desfecho.

9.Do ponto de vista institucional, a resistência inclui mudar a postura política e pública do governo. Um exemplo: a presidenta não apenas precisa vetar o financiamento empresarial, mas ir a público deixar claro os motivos. E devemos nos preparar para a reação de Cunha et caterva à decisão do STF, reação que será muito dura e envolverá chantagem política. Outro exemplo: ou o ministro da Justiça muda ou muda o ministro da Justiça. Não é possível aceitar impassível o comportamento predominante em setores da Justiça, do MP e da Polícia Federal, em conluio com determinados meios de comunicação, a começar por conhecida empresa criminosa que se fantasia de revista semanal. A atitude do Ministro da Justiça não é republicana, nem democrática, nem imparcial: se fosse, deveria garantir o acesso público a todas as informações, não assistir impassível o vazamento seletivo para as Veja da vida, nem o comportamento partidarizado de setores da PF, do MP e da Justiça.

10. O PT precisa reocupar espaço, tomar partido nos grandes debates, opinar e inclusive disputar o governo. Entre as muitas coisas que devem ser feitas, cito uma: construir imediatamente uma “agência de notícias”, articulada com as várias iniciativas de comunicação da Frente Brasil Popular, com a Rede Brasil Atual, com a imprensa sindical e popular. Basta de reclamar que o PIG não divulga o nosso ponto de vista, façamos nós por nossas mãos o que pode, deve e precisa ser feito. Mas para isto a política de comunicação do Partido precisa ser outra, completamente diferente da atual. Vale dizer, contudo, que o principal problema de comunicação do PT está na linha política (ou na falta de linha) adotada.

11.Aos inimigos nada, mas aos nossos amigos devemos desculpas e explicações. A direita nos ataca por nossos acertos e deles não temos que fazer autocrítica. Mas amplos setores democráticos e populares estão decepcionados conosco devido aos nossos erros, ao que fizemos e deixamos de fazer. É para estes setores democráticos e populares que estamos devendo uma autocrítica, principalmente devido à promiscuidade com a direita e suas práticas; bem como devido à insistência na já citada estratégia de conciliação. O PT não deve temer autocrítica. O que não faremos – ao contrário do que a direita pede e alguns ensaiam-- é pedir desculpas pelo que fizemos de certo, pedir desculpas pelo que somos, pedir desculpas por nossa história.

12.Temos que ampliar a presença do PT na construção da Frente Brasil Popular. Parte do êxito da Frente Brasil Popular dependerá de ampliarmos o engajamento da CUT, da UNE, do MST, do PT e do PCdoB. De imediato devemos jogar muito peso na mobilização do dia 3 de outubro, relacionada à defesa da Petrobrás. Na mesma linha, devemos dar toda atenção para o próximo Congresso nacional da CUT, cuja posição frente à conjuntura tem sido globalmente correta e continuará sendo extremamente importante.

13.Resumidamente: para derrotar a direita, é preciso derrotar a inação e a alienação. A alienação dos que minimizam os riscos e a inação dos que acham que a situação estaria tão ruim, que seria melhor não se mexer. É fato que a situação mudou para pior, desde o início do ano. Nosso partido deve reconhecer esta mudança e convocar um encontro nacional extraordinário: com outra linha e outro comportamento, temos como vencer mais uma vez.


*Contribuição baseada nos textos “O que não fazer” (http://www.valterpomar.blogspot.com.br/2015/08/contribuicao-ao-seminario-de.html); “O Partido dos Trabalhadores precisa defender outro caminho” (http://www.valterpomar.blogspot.com.br/2015/09/o-partido-dos-trabalhadores-precisa.html); e “Contribuição à discussão” (http://www.valterpomar.blogspot.com.br/2015/09/contribuicao-discussao.html) e também nos debates travados em recente reunião da FPA.

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