sexta-feira, maio 15, 2015

A América Latina na dinâmica da guerra global

Carta Maior


Na América Latina assistimos a um processo de crise muito profundo: convergem progressismos declinantes com neoliberalismo integralmente degradado.

Jorge Beinstein


Tudo ao mesmo tempo: em meados do mês de Março de 2015 os Estados Unidos deram um salto qualitativo de claro perfil belicista nas suas ações contra a Venezuela, também desenvolvem exercícios militares em países limítrofes com a Rússia na chamada operação "Atlantic Resolve", algumas dessas operações são realizadas a uns 100 quilómetros de São Petersburgo [1], além disso, intensificam-se informações acerca de uma nova ofensiva do governo de Kiev contra a região do Donbass [2], aumenta a circulação de naves de guerra da Otan no Mar Negro, continuam as velhas guerras imperiais no Iraque e no Afeganistão às quais se acrescentou a seguir a ofensiva contra a Síria (passando pela Líbia)... e muito mais...

Evidentemente o Império está lançado numa catastrófica fuga militar para frente estendendo suas operações a todos os continentes, encontramo-nos em plena guerra global. Nem os grandes meios de comunicação, nem os dirigentes internacionais mais importantes registaram publicamente o facto, todos falam como se vivêssemos em tempos de paz, só em alguns poucos casos surgem alguns deles a advertir sobre o perigo de guerra mundial ou regional. Uma exceção recente é a do Papa Francisco quando afirmou que atualmente nos encontramos perante "uma terceira guerra mundial" que ele descreve como a desenvolver-se "por partes" ainda que sem designar os contendores e fazendo vagas referências à "cobiça" e a "interesses espúrios" com a linguagem confusa e jesuítica que o caracteriza [3].

A cada mês acrescenta-se algum novo indiciar que anuncia a proximidade de uma nova recessão global muito mais forte e extensa que a de 2009. O capitalismo, a começar pelo seu polo imperialista, foi-se convertendo velozmente num sistema de saqueio onde a reprodução das forças produtivas fica completamente subordinada à lógica do parasitismo. As elites imperiais e suas lumpen-burguesias satélites "necessitam" superexplorar até ao extermínio seus recursos naturais e mercados periféricos para sustentar as taxas de lucro do seu decadente sistema produtivo-financeiro.

As tendências globais rumo à decadência econômica exprimem-se de múltiplas maneiras no dia a dia. Dentre elas, a volatilidade dos preços das matérias-primas, o petróleo, por exemplo, chave mestra da economia mundial, cujo estancamento extrativo (que não conseguiu ser superado pelo show mediático em torno do "milagroso" petróleo de xisto) combina-se com desacelerações da procura internacional como ocorre atualmente. A isso se somam golpes especulativos e geopolíticos que convertem os mercados em espaços instáveis onde as manobras de curto prazo impõem a incerteza.

O curto-prazismo especulativo hegemônico engendra pacotes tecnológicos depredadores como a mineração a céu aberto, a fratura hidráulica ou a agricultura com base em transgênicos acompanhados por operações políticas e comunicacionais que degradam, desarticulam sistemas sociais procurando convertê-los em espaços indefesos diante dos saqueios.

O otimismo econômico da época do auge neoliberal deu lugar ao pessimismo do "estancamento secular" agora apregoado pelos grandes peritos do sistema [4]. Eles indicam que a salvação do capitalismo não chegará a partir da economia condenada a sofrer recessões ou crescimentos insignificantes, o melhor é nem falar demasiado desses tristes temas. Então a guerra ascende ao primeiro plano, algum massacre protagonizado por tropas regulares ou mercenárias, algum bombardeio, alguma ameaça de ataque na Europa do Leste, Ásia, África ou América Latina. Os meios de comunicação nos esmagam com essas notícias, contudo ninguém fala da guerra global.

Tudo acontece como se a dinâmica da guerra se houvesse autonomizado mas empregado um discurso embrulhado, difícil de entender. Mas assim como os super-poderes dos homens de negócios dos anos 1990 não eram independentes e sim compartilhados no interior de uma complexa trama de poderes (políticos, mediáticos, militares, etc) que em termos gerais costuma-se denominar como "classe dominante", também a aparente autonomia do militar dificulta-nos ver as redes mafiosas de interesses onde se borram as fronteiras entre os seus componentes. As elites da era neoliberal sofreram mudanças decisivas, experimentaram mutações que as converteram em classes completamente degeneradas que, cada vez mais, só podem recorrer à força bruta, à lógica da guerra. Não se trata, portanto de a componente militar se autonomizar e sim, antes, de que as elites imperialistas se militarizam. Elas já não seduzem com ofertas de consumo mais algumas doses de violência, agora só propagam o medo, ameaçam com as suas armas ou utilizam-nas.

Progressismos latino-americanos
Dentro desse contexto global devemos avaliar os progressismos latino-americanos [5] que se instalaram na base das crises de governabilidade dos regimes neoliberais.

Os bons preços internacionais das matérias-primas durante a década passada, somados a políticas de contenção social dos pobres, permitiram-lhes recompor a governabilidade dos sistemas existentes. Em alguns desses casos desenvolveram-se ampliações ou renovações das elites capitalistas e em quase todos eles prosperaram as classes médias. Os governos progressistas iludiram-se supondo que as melhorias econômicas lhes permitiriam ganhar politicamente os referidos setores, mas, como era previsível, ocorreu o contrário: as camadas médias iam para a direita e, enquanto ascendiam, olhavam com desprezo os de baixo e assumiam como próprios os delírios mais reacionários das suas burguesias.

A explicação é simples, na medida em que são preservados (e ainda fortalecidos) os fundamentos do sistema e em que seus núcleos decisivos radicalizam seu elitismo depredador seguindo a rota traçada pelos Estados Unidos (e "Ocidente" em geral) produz-se um encadeamento de subculturas neofascistas que vão desde acima até abaixo, desde o centro até as burguesias periféricas e desde estas até suas camadas médias. Na Venezuela, Brasil ou Argentina as classes médias melhoravam seu nível de vida e ao mesmo tempo despejavam seus votos nos candidatos da direita velha ou renovada.

Estabeleceu-se um conflito interminável entre governos progressistas que tornavam governáveis os capitalismos locais e direitas selvagens ansiosas por realizar grandes roubos e esmagar os pobres. O progressismo, confrontado politicamente com essa direita qualificada de "irresponsável", cujos fundamentos económicos respeitava, chantageava aqueles na esquerda que criticavam sua submissão às regras do jogo do capitalismo utilizando o papão reacionário ("nós ou a besta"), acusando-os de fazerem o jogo da direita.

Na realidade o progressismo é um grande jogo favorável ao sistema e em última análise à direita, sempre em condições de retornar ao governo graças à moderação, à "astúcia" aparentemente estúpida dos progressistas que por vezes conseguem cooptar esquerdas claudicantes cuja obsessão em "não fazer o jogo da direita" (e simultaneamente integrar-se no sistema) é completamente funcional à reprodução do país burguês e em consequência a essa detestável direita.

Agora o jogo começa a esgotar-se. Os progressismos governantes, com diferentes ritmos e variados discursos, acossados pelo arrefecimento económico global e pelo crescente intervencionismo dos Estados Unidos, vão perdendo espaço político. Em vários casos suas dificuldades fiscais pressionam-nos a ajustar despesas públicas (e de modo algum a reduzir os super lucros dos grupos económicos mais concentrados), a aceitar as devastações da mega-mineração ou a adotar medidas que facilitam a concentração de rendimentos.

No Brasil, o segundo governo Dilma colocou um neoliberal puro e duro no comando da política económica, encurralado por uma direita ascendente, uma economia oscilando entre o estancamento e a recessão e uma intervenção norte-americana cada vez mais ativa. No Uruguai o novo governo de Tabaré Vazquez mostra um rosto claramente conservador e no Chile a presidência Bachelet não precisa correr demasiado à direita, depois da sua rosada demagogia eleitoral afirma-se como continuidade do governo anterior e em consequência, passada a confusão inicial, herdará também a hostilidade de importantes faixas de esquerda e dos movimentos sociais.

Na Argentina, o núcleo duro agro mineral exportador-financeiro e os grupos industriais exportadores mais concentrados estão mais prósperos do que nunca enquanto a ingerência norte-americana amplia-se conduzindo o jogo de títeres políticos rumo a uma ruptura ultra-direitista. Na Venezuela a eterna transição rumo a um socialismo que nunca acaba de chegar não conseguiu superar o capitalismo ainda que torne caótico o seu funcionamento, forjando desse modo o cenário de uma grande tragédia. Por enquanto só a Bolívia parece salvar-se da avalanche, afirmando-se na maior mutação social da sua história moderna sem superar o âmbito do subdesenvolvimento capitalista mas recompondo-o integrando as massas submersas, multiplicando por mil o que havia feito o peronismo na Argentina entre 1945 e 1955 (de qualquer forma isso não a liberta da mudança de contexto regional-global).

Na América Latina assistimos a um processo de crise muito profundo onde convergem progressismos declinantes com neoliberalismo integralmente degradado, como na Colômbia ou no México, conformando um panorama comum de perda de legitimidade do poder político, avanços de grupos econômicos saqueadores e ativismo imperialista cada vez mais forte.

A este panorama sombrio é necessário incorporar elementos que dão esperança, sem os quais não poderíamos começar a entender o que está a ocorrer. Por debaixo dos truques políticos, dos negócios rápidos e das histerias fascistas aparecem os protestos populares multitudinários, a persistência de esquerdas não cooptadas pelo sistema (para além dos seus perfis mais ou menos moderados ou radicais), a presença de insurgências incipientes ou poderosas (como na Colômbia).

Nem os cantos de sereia progressistas nem a repressão neoliberal puderam fazer desaparecer ou marginalizar completamente esses fantasmas. Realidade latino-americana que preocupa os estrategas do Império, que temem o que consideram como sua inevitável arremetida contra a região possa desencadear o inferno da insurgência continental. Nesse caso o paraíso dos grandes negócios poderia converter-se num grande atoleiro onde afundaria o conjunto do sistema.

Geopolítica do Império, integrações e colonizações
A estratégia dos Estados Unidos aparece articulada em torno de três grandes eixos; o transatlântico e o transpacífico que apontam num gigantesco jogo de pinças contra a convergência russo-chinesa, centro motor da integração euro-asiática. E a seguir o eixo latino-americano destinado à recolonização da região.

Os Estados Unidos tentam converter a massa continental asiática e sua ampliação russo-europeia num espaço desarticulado, com grandes zonas caóticas, objeto de saqueio e super-exploração.

Os recursos naturais, assim como os laborais, desses territórios constituem seu centro de atenção principal, na elipse estratégica que cobre o Golfo Pérsico e a Bacia do Mar Cáspio estendendo-se em direção à Rússia encontram-se 80% das reservas globais de gás e 60% das de petróleo e na China habitam pouco mais de 230 milhões de operários industriais (aproximadamente um terço do total mundial).

A América Latina aparece como o quintal a recolonizar. Ali se encontram, por exemplo, as reservas petrolíferas da Venezuela (as primeira do mundo, 20% do total global), cerca de 80% das reservas mundiais de lítio (num triângulo territorial compreendido pelo Norte do Chile e Argentina e pelo Sul da Bolívia) imprescindível na futura indústria do automóvel eléctrico, as reservas de gás e petróleo de xisto do Sul argentino, fabulosas reservas de água doce do aquífero guarani entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina.

Uma das ofensivas fortes do Império na década passada foi a tentativa de constituição da ALCA, zona de livre comércio e investimentos que significava a anexação económica da região por parte dos Estados Unidos. O projeto fracassou. A ascensão do progressismo latino-americano somado à emergência de potências não ocidentais, sobretudo a China, e o atolamento estadunidense nas suas guerras asiáticas foram fatores decisivos que em diferentes medidas debilitaram a investida imperial.

Mas a partir da chegada de Obama à presidência os Estados Unidos desencadearam uma ofensiva flexível de reconquista da América Latina: foi posta em marcha uma complexa mescla de pressões, negociações, desestabilizações e golpes de estado. Os golpes brandos com êxito em Honduras e no Paraguai, as tentativas de desestabilização no Equador, Argentina, Brasil e sobretudo na Venezuela (onde se vai perfilando uma intervenção militar), mas também a tentativa em curso de extinção negociada da guerrilha colombiana e a domesticação de Cuba fazem parte dessa estratégia de recolonização.

A mesma é implementada através de uma sucessão de tentativas suaves e duras tendente a desarticular as resistências estatais e os processos de integração regional (Unasul, Celac, Alba) e extra-regionais periféricos (BRICS, acordos com a China e a Rússia, etc) assim como a bloquear, corromper ou dissolver as resistências sociais e as alternativas políticas mais avançadas, em curso ou potenciais. Tentando levar avante uma dinâmica de desarticulação mas procurando evitar que a mesma gere rebeliões que se propaguem como um rastilho de pólvora numa região atualmente muito inter-relacionada.

Sabem muito bem que em muitos países da região a substituição de governos "progressistas" por outros abertamente pró-imperialistas significa a ascensão de camarilhas enlouquecidas que a curto prazo causariam situações de caos que poderiam desencadear insurgências perigosas. Alguns estrategistas do Império acreditam poder neutralizar esse perigo com o próprio caos, desenvolvendo "guerras de quarta geração" instalando diferentes formas de violência social desestruturante combinadas com destruições mediático-culturais e repressões seletivas. Nesse sentido, o modelo mexicano é para eles (por agora) um paradigma interessante.

Temem, por exemplo, que um cenário de caos fascista na Venezuela derive numa guerra popular que os obrigaria a intervir diretamente num conflito prolongado, o que somado às suas guerras asiáticas os conduziria a uma super extensão estratégica ingovernável. É por isso que consideram imprescindível obter o apaziguamento da guerrilha colombiana, potencial aliada estratégica de uma possível resistência popular venezuelana.

O panorama é completado com o processo de integração colonial dos países da chamada Aliança do Pacífico (México, Colômbia, Peru e Chile). A isso se somam os tratados de livre comércio de maneira individual com países da América Central e outros como o Chile e a Colômbia e o velho tratado entre EUA, Canadá e México.

Integração colonial e desarticulação, manipulação do caos e fortalecimento de polos repressivos, Capriles mais Peña Nieto, Ollanta Humana mais Santos mais bandos narco-mafiosos... tudo isso dentro de um contexto global de decadência sistémica onde a velha ordem unipolar declina sem ser substituída por uma nova ordem multipolar. Tentativa de controle imperialista da América Latina submersa na desordem do capitalismo mundial.

O cérebro do Império não consegue superar as mazelas do seu corpo envelhecido e enfermo, os delírios reproduzem-se, as fugas para frente multiplicam-se. Evidentemente encontramo-nos num momento histórico decisivo.
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Jorge Beinstein é doutor em economia e professor catedrático das universidades de Buenos Aires e Córdoba, na Argentina, e de Havana, em Cuba. É autor de Capitalismo senil: a grande crise da economia global, publicado no Brasil pela editora Record (2001). Dirige o Instituto de Pesquisa Científica da Universidade da Bacia do Prata e publica regularmente em Le Monde Diplomatique (em castelhano).

Notas
[1] Finian Cunningham, "NATO's Shadow of Nazi Operation Barbarossa", Strategic Culture Foundation, 13/03/2015

[2] Colonel Cassad, "Ukraine: Reprise de la guerre au printemps?", http://lesakerfrancophone.net/ le 13 mars 2015

[3] "El papa Francisco advirtió que vivimos una tercera guerra mundial combatida 'por partes' ", http://www.lanacion.com.ar , 13 de septiembre de 2014

[4] Laurence H Summers, "Reflections on the 'New Secular Stagnation Hypothesis'" y Robert J Gordon, "The turtle's progress: Secular stagnation meets the headwinds" en "Secular Stagnation: Facts, Causes, and Cures", CEPR Press, 2014.

[5] Utilizo o termo "progressista" no sentido mais amplo, desde governos que se proclamam socialistas ou pró socialistas como na Venezuela ou Bolívia até outros de corte neoliberal-progressista como os do Uruguai ou Brasil.

A pobreza sai às ruas nos EUA mais que no Brasil

Carta Maior


Os críticos do país não usam óculos, resistem ou não querem ver direito, embora haja casos que merecem internação definitiva para recuperação ocular e mesmo cegueira. Não só da oposição política propriamente dita mas da midiática também. Enxergam qual país? Qual deles é o que vale?

Falar mal do país virou tônica diária dos oposicionistas. Como prato principal e sobremesa. Nem os cafezinhos nos intervalos do trabalho escapam. O país para eles afunda em corrupção e economia fraca, decadente.

Bom, mas disso tudo já sabíamos, infelizmente, desde o final do primeiro governo de Dilma. O pior é que não se cansaram, nem se cansam, querem ou ganhar no tapetão ou criar dificuldades diárias, permanentes, até secar as expectativas de aposta política e recuperação econômica.

Tentaram bandeiras, faixas, panelas, reportagens falsas, notícias mentirosas, denúncias sem provas, samba do crioulo doido como diria Stanislaw Ponte Preta nos idos dos anos 60. A baderna política na busca de perdurar imagens caricatas do governo eleito democraticamente.

O pior é que não só deturpam a realidade. Não enxergam como convém com nenhum dos olhos o que ocorre no país tampouco no vizinho que tanto adoram, onde mora o Tio Sam. Diria minha avó, para que enxergar direito se eles querem mesmo é ver errado?

Pois bem, enquanto já caem de pau sobre a performance do PIB brasileiro no 1o trimestre desse ano, com queda prevista de 0,5% em relação à leve alta de 0,1% no 3o trimestre de 2014, os EUA registraram queda de 0,2% diante de alta de 2,2% nos mesmos períodos (fonte: Federal Reserve, o banco central norte-americano).

Desaceleram ambas as economias, tendo sido o tombo mais acentuado nos EUA. O Brasil está pelo menos de farol baixo desde a 2a metade do ano passado por várias razões, inclusive pela pressão política dos empresários nacionais sobre a política econômica como tentativa de reversão do quadro sucessório.

A mesma fonte norte-americana de informação indica que ocorre naquele país um período de estagnação econômica após o curto surto de recuperação, ao qual se apegaram muitos países em dificuldades e que agora não sabem bem para onde caminhar.

As exportações recuaram nos EUA, o que mostra a menor procura do setor externo: China em ritmo menor de crescimento, a Zona do Euro pior, às voltas com a austeridade, e os emergentes boiando meio que na expectativa. Já o consumo interno igualmente volta atrás, o que revela a atenuação dos ganhos de renda da população americana.

Guardadas as devidas e honrosas proporções, fenômeno semelhante ocorre no Brasil, apimentado ademais pela quadra difícil dos embates jurídicos com relação aos desvios na Petrobras, o resultado do pleito presidencial ainda atravessado na garganta da oposição e o ataque feroz e diário da mídia desde o ano passado. Qualquer economia sofreria o mesmo tranco.
Carta Maior

Na meca do capitalismo, 45 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza. Mas parece que os arautos do american way of life não querem ver.

José Carlos Peliano


O Bureau do Censo estadunidense informa que a população que vive abaixo do nível de pobreza de lá está em torno de 14,5% ou 45 milhões de pessoas. Como se pode imaginar que a meca do capitalismo moderno apresenta quadro tão alarmante de pobreza? Pois é o que ocorre, o que os arautos do american way of life não querem ver, se emudecem ou olham de revés.

No Brasil**, em fins de 2013, a população em estado de pobreza era de 8,8% e em estado de extrema pobreza 4%, ou 12,8% na soma, cerca de 26 milhões de pessoas. A comparação é imperfeita porque a renda limite de lá é bem superior, mas o que vale são as condições vigentes em cada país, quanto ao custo de vida, as necessidades básicas e as oportunidades de ascensão social.

Daí o tamanho da pobreza aqui ser pouco mais da metade dos EUA. Não adianta o contra-argumento de que no limite de lá caberiam muito mais brasileiros porque os ricos daqui igualmente não chegariam aos pés dos de lá. Tudo relativo.

A grande diferença, contudo, está no fato de que nos EUA o contingente pobre aumentou, enquanto aqui no país ele declina. De 2006 a 2014 nos EUA o nível de pobreza veio de 12,3% a 14,5%, sem falar no contingente de sem teto que aumenta cada vez mais nas ruas das metrópoles. Enquanto no Brasil vem de 22,6% a 12,8% no mesmo período. Isso mostra que a política econômica brasileira privilegiou a população mais necessitada, enquanto nos EUA o benefício ficou para os abastados.

Os bons reflexos da economia chegaram ao custo da cesta básica no país ajudando a recuperação da renda real dos pobres. A relação custo da cesta básica/valor do salário mínimo evoluiu de forma descendente desde dezembro de 1995 até dezembro 2014. De 91,5% a 44,9% em São Paulo e de 72,7% a 35,6% em Fortaleza.

A grande dificuldade de recuperação estadunidense em relação ao Brasil, no que se refere ao mercado interno, sem depender da evolução das transações com o exterior, é o fato de que a população trabalhadora de lá tem um peso mais acentuado para as condições do país.

Em tempos recentes a criação de empregos americanos tem sido nos setores urbanos de comércio e serviços, onde os salários são menores. Daí para que a economia se expanda há que se criar mais e novos empregos com salários maiores, o que vai exigir projetos de médio e longo prazos nos setores industriais e de alta tecnologia. Vai demandar tempo.

Aqui no Brasil nem tanto. Um reforço ao mercado interno vai consolidar o que já existe, especialmente em relação aos trabalhadores com menores salários. Com a expansão de projetos de infraestrutura o impulso fica por conta dos setores de bens de capital e intermediários, que geram valor e reproduzem mais oportunidades de negócios, renda e emprego através do chamado efeito multiplicador dos investimentos.

De onde virá o impulso gerador? O primeiro ministro chinês anunciou esta semana a intenção da China investir US$ 53 bilhões no país em infraestrutura, exatamente a área que o governo federal anunciou como prioritária para expansão de projetos.

Além do banco dos BRICS com recursos para a mesma área e correlatas, que deve finalmente ser operacionalizado mês que vem em reunião na Rússia. Outros bilhões virão do Pré-Sal apesar da pressão de opositores que querem abrir o setor para a combalida economia americana.

Mas isso só será bem sucedido e em pouco tempo caso o ministro da Fazenda não segure mais e indevidamente as rédeas da economia brasileira. Outro da turma dos que precisam enxergar melhor o que se passa aqui e lá fora.
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José Carlos Peliano é colaborador da Carta Maior.

**Dados do Brasil são de Vinte Anos de Economia Brasileira 1995/2014, Gerson Gomes e Carlos Antônio Silva da Cruz, Centro de Altos Estudos Brasil Século XXI.


Indústria de Defesa no Brasil

quarta-feira, maio 13, 2015

“Se o Brasil abrir a operação para as estrangeiras no pré-sal, podemos dizer adeus aos royalties para educação e saúde”

Viomundo

Por Conceição Lemes


“Se o Brasil abrir a operação para as estrangeiras no pré-sal, podemos dizer adeus aos royalties para educação e saúde” - See more at: http://brasildebate.com.br/se-o-brasil-abrir-a-operacao-para-as-estrangeiras-no-pre-sal-podemos-dizer-adeus-aos-royalties-do-petroleo-para-educacao-e-saude/#sthash.arm66r0U.dpuf


Em entrevista no último domingo, 2 de maio, o ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB-AM), durante entrevista realizada antes da Offshore Technology Conference, em Houston, nos Estados Unidos, deixou abertas duas portas perigosas. Acenou com mudanças no marco regulatório do pré-sal e abrandamento da norma de conteúdo local, que determina à Petrobras a compra preferencial de equipamentos e serviços de origem nacional.

Verdadeira sinfonia para os ouvidos das grandes petroleiras estrangeiras, como Shell, ExxonMobil, Chevron, BP e Total.

Até agora, Eduardo Braga não desmentiu a entrevista, que saiu em vários veículos da mídia brasileira.

Para João Antônio de Moraes, diretor de relações internacionais da Federação Única dos Petroleiros (FUP), é muito grave a declaração de Braga nos EUA.

“Onde já se viu abordar uma questão estratégica para o Brasil, fora do Brasil, num lugar onde a disputa pelo petróleo é gigantesca?”, critica. “Se já está havendo pressão sobre o Congresso Nacional para flexibilizar a partilha, com essa declaração absurda, a tendência é que a pressão só aumente.”

Nota da FUP (na íntegra, abaixo) publicada nessa quinta-feira, 7, lembra: “Só o PSDB já tem três projetos em andamento no Congresso para alterar o modelo de partilha e retirar da estatal o papel de operadora única”. Têm projetos para abrir o pré-sal às petroleiras internacionais os senadores tucanos José Serra, Aloysio Nunes e o deputado federal Jutahy Júnior. O deputado federal Leonardo Picciani (PMDB-RJ) também projeto nessa linha.

Moraes adverte: “Flexibilizar a partilha, não garantir a Petrobras como operadora única do pré-sal e abrandar a exigência de conteúdo local, como prega o ministro, significam abrir as portas para o Brasil ser saqueado novamente nos seus recursos naturais por interesses externos como já aconteceu ao longo da história, com o pau-brasil, o ouro, por exemplo”.

Ele enfatiza: “A operação só nas mãos da Petrobras nos garante desenvolvimento, segurança ambiental e segurança energética. Essas três coisas ficariam fragilizadas se empresas estrangeiras entrarem na operação”.

Ele denuncia: “Se o Brasil abrir a operação para as petroleiras estrangeiras, podemos dizer adeus aos royalties do petróleo para Educação e Saúde. No mundo inteiro, a história das petroleiras é uma história de não cumprimento da destinação social das riquezas”.

Segue a íntegra da nossa entrevista.

Viomundo — O que achou da declaração do ministro Eduardo Braga nos EUA?

João Moraes – Muito grave. Onde já se viu abordar uma questão estratégica para o Brasil, fora do Brasil, num país onde a disputa pelo petróleo é gigantesca? Se já está havendo pressão sobre o Congresso Nacional para flexibilizar a partilha, com essa declaração absurda, a tendência é que a pressão só aumente. Lembre-se de que há no Congresso vários projetos de tucanos que visam justamente flexibilizar o modelo de partilha no pré-sal.

Viomundo – O que acontece se o Brasil alterar o modelo?

João Moraes — Flexibilizar a partilha, não garantir a Petrobras como operadora única do pré-sal e abrandar a exigência de conteúdo local significam abrir as portas do Brasil para que seja saqueado novamente nos seus recursos naturais por interesses externos, como já foi ao longo da história, com o pau-brasil, o ouro, por exemplo.

Definitivamente, se o povo brasileiro não garantir esses três sustentáculos do modelo brasileiro, o ciclo econômico do petróleo vai repetir o que já aconteceu em outros ciclos econômicos. Vai embora o recurso natural, não fica o desenvolvimento aqui. Então, nós temos de realmente nos mobilizar para impedir que iniciativas para alterar o modelo de partilha tenham sucesso.

Viomundo – Em que setor do pré-sal as petroleiras internacionais podem atuar?

João Moraes – O modelo de partilha permite que elas invistam junto com a Petrobras. Foi o que aconteceu no campo de Libra, na Bacia de Campos, Rio de Janeiro. Em Libra, a Petrobras ficou com 40% dos investimentos, os europeus (Total e Elf), também com 40%, e os chineses com 20%.

Na verdade, o modelo de partilha só não permite atuar na operação. A declaração do ministro toca justamente nesse ponto. A declaração dele e os projetos dos tucanos no Congresso Nacional vão todos no mesmo sentido: o de abrir a operação do pré-sal para as petroleiras estrangeiras. Em resumo, é isso que eles e elas querem.

Viomundo – Qual o mérito da partilha?

João Moraes – As empresas estrangeiras podem investir junto com a Petrobras, mas quem vai operar é a Petrobras.

Viomundo — O que significa operar?

João Moraes – É a Petrobras que vai pegar esses investimentos, comprar os equipamentos, desenvolver os projetos e o mais importante – depois vai controlar a produção de petróleo. A Petrobras é que vai dizer se vai produzir 100 mil, 200 mil, 300 mil barris.

Viomundo — Com isso o que o Brasil tem a lucrar?

João Moraes – Primeiro, a garantia do conteúdo local, porque as empresas estrangeiras não estão cumprindo o conteúdo local nas áreas em que atuam.

Viomundo – Não estão cumprindo?!

João Moraes – Não. Elas encontram um monte de subterfúgios para não comprar aqui. A Shell, por exemplo, é a segunda produtora no Brasil. Ela tem ativos importantes nas áreas já licitadas do pré-sal. Mas a Shell não tem nenhuma plataforma encomendada aos estaleiros brasileiros.

Se flexibilizar o pré-sal vai acontecer o que já acontece com áreas licitadas antes da lei da partilha. As petroleiras estrangeiras não cumprem o conteúdo local. Não cumprindo o conteúdo local, elas não geram emprego aqui, não geram renda aqui, não geram desenvolvimento aqui. Essa é uma etapa importante do ponto de vista do desenvolvimento.

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Viomundo – O que Brasil tem a ganhar mais com o modelo de partilha?

João Moraes — Soberania energética e meio ambiente. Por que aconteceu aquele acidente importante da Chevron, no Campo de Frade, em 2012? Por que a Chevron avançou na produção além do que podia e dos equipamentos que detinha. Isso causou uma fratura no subsolo do oceano, provocando dano ambiental muito grande.

Viomundo – Mas a Petrobras não está livre de produzir danos ambientais.

João Moraes – Não está. Nenhuma petroleira está livre disso. Mas os mecanismos de pressão do povo brasileiro sobre a Petrobras são muito maiores do que sobre as petroleiras estrangeiras. Então, a Petrobras como operadora única nos dá uma garantia ambiental muito maior do que as estrangeiras.

Viomundo – O que mais o Brasil tem a lucrar mais com a partilha?

João Moraes – Impedir a produção predatória. Qual é o grande dilema que a Argentina vive hoje em dia? A Argentina privatizou a YPF. A maior empresa que assumiu foi a Repsol espanhola. A Repsol começou a ter produção predatória , não investiu em desenvolvimento de novas reservas nem em novas tecnologias. Resultado: hoje a Argentina é dependente da importação de petróleo e gás.

Viomundo — Por quê?

João Moraes — Justamente porque não era uma empresa estatal nacional que detinha a operação. Então esse é outro aspecto muito negativo dos projetos dos tucanos que estão no Congresso e buscam garantir a entrada de estrangeiras na operação.

A operação só nas mãos da Petrobras nos garante desenvolvimento, segurança ambiental e segurança energética. Essas três coisas ficariam fragilizadas se empresas estrangeiras entrarem na operação.

Viomundo – Pela lei da partilha foi criado um fundo social – o Fundo Social Soberano – que prevê a destinação dos royalties para Educação e Saúde. As petroleiras estrangeiras fariam isso?

João Moraes – De jeito nenhum. A história das petroleiras no mundo é uma história de não cumprimento da destinação social das riquezas. Então, essa batalha importante que tivemos para garantir os royalties para Educação e Saúde vai para o espaço se a operação do pré-sal for aberta para as empresas estrangeiras. Portanto, é muito ruim se acontecer isso que o ministro Eduardo Braga disse.

Viomundo – Nos últimos meses, estamos assistindo ao acirramento na disputa do petróleo brasileiro. Teria a ver com as denúncias da Lava Jato?

João Moraes – Tudo isso é fruto da campanha de desmoralização da Petrobras desenvolvida pela grande imprensa nos últimos meses. Não tem a ver com corrupção. É uma campanha antinacional. É uma campanha antipatriótica como se as nossas grandes redes de comunicação fossem de outros países e estivessem fazendo aqui uma campanha de interesse delas.

Portanto, é um absurdo sem tamanho, nessa conjuntura, um ministro de Estado ir lá fora e dar uma declaração tenebrosa como a que deu.

Mesmo que o governo tivesse a intenção, o ministro não poderia fazer essa declaração. Porque ao fazê-lo, se um dia isso vier acontecer, a Petrobras vai estar com o preço rebaixado.

Olhando pela lógica do capital, mesmo que fosse uma decisão de governo fazer isso – o que eu não acredito que seja –, ele não poderia declarar isso no exterior. Realmente um despreparo, um absurdo. É um negócio descabido.

Viomundo – A FUP pretende fazer algo em relação a isso?

João Moraes — A direção da FUP está reunida, aqui, em Curitiba, nesta quinta e sexta, onde vamos discutir o assunto. Nós trouxemos a nossa reunião mensal para cá como forma de darmos a nossa solidariedade. Na quarta-feira, inclusive, participamos de atos de solidariedade aos professores.

Mas, desde já, a sociedade tem de estar ciente. Se houver flexibilização no modelo de partilha do pré-sal, o povo brasileiro pode dizer adeus ao Fundo Social e ao uso dos seus recursos para a Educação e Saúde.

Nota da FUP publicada na quinta-feira, 7, no boletim da entidade:

Tirem as mãos do que é nosso!
Em vez de fortalecer a Petrobrás, ministro de Minas e Energia quer flexibilizar partilha

Enquanto a Petrobrás recebia o prêmio OTC Distinguished Achievement Award for Companies, Organizations and Institutions, o maior reconhecimento de uma operadora offshore por tecnologias desenvolvidas e desafios vencidos, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, pregava publicamente a redução da participação da estatal na exploração do pré-sal.

Em entrevista coletiva aos jornalistas que cobriam o evento em Houston (EUA), o ministro do PMDB não mediu palavras e anunciou que o Congresso (onde seu partido comanda a Câmara e o Senado) está aberto a alterar o modelo de partilha.

“O que se discute é a obrigatoriedade da operação. Defendo que a Petrobrás tenha direito à recusa”, declarou, alegando que a empresa não tem condições hoje de “alavancar os investimentos que a economia brasileira necessita”.

Na mesma linha foi a diretora geral da ANP, Magda Chambriard, que também participou da feira de petróleo em Houston e defendeu “uma flexibilização muito bem calibrada” da lei do pré-sal, com vistas aos leilões futuros.

Declarações deste tipo reforçam e alimentam os ataques da oposição contra a Petrobrás. Só o PSDB já tem três projetos em andamento no Congresso para alterar o modelo de partilha e retirar da estatal o papel de operadora única.

A defesa intransigente da soberania é um compromisso que deve ser honrado por um governo eleito pelos trabalhadores. A hora é de fortalecer a Petrobrás para que siga avançando na exploração do pré-sal, cuja riqueza deve ser servir ao povo brasileiro e não às multinacionais.



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quinta-feira, maio 07, 2015

Brasil, Petróleo e Geo Política

Dia da Vitória!

Dia 9 de maio será comemorado o 70° aninversário da vitória do Exército Vermelho junto com os aliados sobre o nazifascismo que ameaçava o mundo. Morreram 9 milhões de soldados soviéticos e 17 milhões de cidadãos soviéticos. O mundo deve muito a eles por hoje não estar vivendo um mundo de horror como queriam os nazistas. Pouca gente sabe dos feitos dos soviéticos na Segunda Guerra Mundial, pois eles venceram a guerra, mas os estadunidenses fizeram os filmes. Batalhas como de Stalingrado, a primeira vitória dos aliados sobre os alemães, de Moscou, de Kursk, entre outras deveriam ser melhor conhecidas, pois milhões de pessoas se sacrificaram para que hoje as pessoas não fossem escravas, como era o objetivo do III Reich. No dia 9 de maio todas as pessoas do mundo deveriam comemorar essa vitória, que foi por nós.

A CIA e sua simpatia pela campanha contra Dilma

Do Carta Maior


Sibá Machado falou da proximidade entre Aécio Neves e venezuelanos acusados de conspiração e de sua desconfiança do envolvimento da CIA no Brasil.

Darío Pignotti - Página/12

Brasília - Washington apoia o movimento de desestabilização do governo de Dilma? Foi que o este diário perguntou a políticos e acadêmicos brasileiros que, invariavelmente, responderam que “sim”, mas quase todos sob condição de anonimato. Alguns solicitaram o sigilo alegando carecer de provas, outros, possivelmente, por temor às chicotadas da imprensa, que ridiculiza esse tipo de especulação relacionada à intervenção norte-americana.

O Brasil vive sob um estado de sítio midiático, onde se difama sumariamente qualquer um que apoie o governo, denuncie o golpe branco ou insinue que a presidenta recebe apoio externo. O chefe da bancada de deputados do PT, Sibá Machado, não se coíbe diante das críticas da imprensa tradicional e responde sem papas na língua ao que indagamos sobre uma eventual conexão estadunidense. “Tem que ser muito inocente para supor que uma campanha de desestabilização como essa não recebe nenhum tipo de apoio de fora. Chama a nossa atenção que nenhum dos meios de imprensa investigue esse tema, quando é bastante lógico pensar que tudo isso está manipulado desde altas esferas”.

– As “altas esferas” a que você se refere seriam as da Inteligência norte-americana?

– Já disse, e continuo dizendo, que trabalho com a hipótese de que a Inteligência golpista que está atuando na América do Sul não se limita à Inteligência de cada país. Estamos enfrentando interesses que vêm de fora da região em represália a vários governos sul-americanos que assumiram uma linha de maior independência dos Estados Unidos. Vejamos o que está se passando na Venezuela, no Brasil, na Argentina. Vemos muitas semelhanças nas ações contra esses governos, na linguagem utilizada, no papel dos grandes meios de comunicação, no papel jogado pelo Poder Judiciário.

Se olhamos para trás teremos mais exemplos, como o golpe contra Hugo Chávez (2002), o golpe com maquiagem institucional contra o presidente paraguaio Fernando Lugo (2012) e aqui também estamos vendo, agora, quando a oposição busca o parecer de juristas para justificar o impeachment (julgamento político) contra a presidenta Dilma.

– Existem documentos sobre a participação da CIA e da NSA?

– Não tenho documentos, estou formulando uma hipótese a partir dos antecedentes e elementos políticos. Trabalho com a hipótese de que a CIA e outros órgãos de Inteligência como a NSA estão operando, é algo que podemos perceber. E essa desestabilização regional tem interesses particulares no Brasil, onde o PT ganhou quatro eleições consecutivas, todas desde 2002. Vamos fazer uma retrospectiva. Não caiu bem para os norte-americanos a atitude da Dilma, suspendendo a visita de Estado a Washington, em 2013, devido à espionagem que ela sofreu por parte da Agência de Segurança Nacional (NSA). Os Estados Unidos tampouco viram com satisfação a nossa participação na formação dos Brics, na criação de um banco alternativo ao Banco Mundial, de uma agência alternativa ao FMI. Eles não aprovam nenhuma mudança mais importante na ordem geopolítica e econômica. Não gostaram dos investimentos na construção do Porto de Mariel, em Cuba, da diversificação dos mercados, do novo paradigma da política externa brasileira, entre outras coisas.

Aécio e os reacionários

Depois de ser derrotado nas eleições presidenciais de outubro de 2014, Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), adotou um discurso incendiário contra Dilma, exigindo sua destituição através de um processo de impeachment, considerado inapropriado até mesmo por caciques do seu partido, como o ex-mandatário Fernando Henrique Cardoso.

Durante a entrevista com Página/12, em seu escritório na Câmara dos Deputados, o petista Sibá Machado fala da proximidade entre Aécio e os dirigentes venezuelanos acusados de conspirar contra o presidente Nicolás Maduro. E mencionou a recente participação do líder opositor brasileiro no Fórum de Lima, onde ele confraternizou com grandes nomes da direita latina, como o ex-presidente uruguaio Jorge Batlle, o escritor peruano Mario Vargas Llosa e o cubano-estadunidense Carlos Alberto Montaner, paladino do pensamento reacionário de Miami.

– Como Aécio se articula com seus colegas latino-americanos?

– Por um lado, está a sua atividade pública. Esteve em Lima, onde se reuniu com familiares dos golpistas venezuelanos (as esposas de Leopoldo López e Antonio Ledezma, ambos processados). Pelo que vejo, Aécio está tomando o modelo da ultra-direita venezuelana. Na realidade, esses contatos internacionais me lembram muito a Operação Condor, quando as ditaduras atuavam em rede. E digo mais, suspeitamos que Aécio se comunica frequentemente com outros golpistas, que mantém reuniões clandestinas e que se articula para semear a instabilidade contra os governos progressistas.

– Uma das bandeiras de Aécio agora é a corrupção na Petrobras….

– Mas é curioso que logo o Aécio venha a criticar a Petrobras, pedindo o fim o novo marco regulatório da exploração do petróleo, implantado nos governos do PT. Aécio defende o mesmo discurso das empresas multinacionais com sede nos Estados Unidos. Estou convencido de que os norte-americanos não estão satisfeitos com a nova lei do petróleo, que dá muito poder à Petrobras. Eles preferiam o modelo anterior, de concessões, que era um paradigma entreguista conveniente para as multinacionais. No entanto, a lei que aprovamos garante que o petróleo é um patrimônio nacional.

– Dilma viajará a Washington em junho, mas até agora os EUA não deu satisfações ao Brasil sobre os documentos roubados dos arquivos da Petrobras.

– Digo novamente que não tenho documentos, mas desconfio que parte dessa informação roubada pela NSA a respeito da Petrobras tenha parado nas mãos de líderes da oposição. A NSA e a oposição golpista, não tem escrúpulos, jogam no vale tudo, o que eles querem é desmontar a Petrobras e as grandes empresas nacionais brasileiras. O que aconteceu aqui foi muito grave. A NSA roubou segredos de Estado, é possível que eles tenham tido conhecimento prévio dos descobrimentos dos gigantescos poços de petróleo em águas profundas, da zona do Pré-Sal (revelados pelo governo brasileiro em 2007), e que tenham manejado essa informação antes de o ex-presidente Lula anunciar isso publicamente.


"Катюша" Валентина Батищева

Hino Soviético da vitória sobre o fascismo na Segunda Guerra Mundial

terça-feira, maio 05, 2015

Baltimore é o retrato de décadas de desigualdade nos EUA

El País


Os helicópteros sobrevoam a cidade. A Guarda Nacional havia enviado seus soldados depois dos confrontos da segunda-feira passada. Centenas de jornalistas registravam nas ruas as patologias dos Estados Unidos: violência, marginalização, racismo. A dois quilômetros de distância, nos bairros de brancos de Baltimore, tudo aquilo parecia distante.

“Estão a um universo de distância”, afirmava Paul Taylor, residente de Bolton Hill, um bairro de ruas arborizadas, mansões de tijolos e cafés descolados. “Tão distantes quanto a lua”, destacou.

Esse passeio por esta Baltimore em estado de emergência — até domingo, quando a Guarda Nacional começou a se retirar, havia sido estabelecido um toque de recolher a partir das 22h— começa em Bolton Hill. Taylor, de 33 anos, conversa nos degraus de uma casa com Reuben Lee, seu vizinho. Ambos são brancos. Lee tem 80 anos e vivenciou todas as mudanças de Baltimore dos últimos cinquenta anos: de uma cidade de guetos étnicos —os irlandeses, italianos, judeus, poloneses, brancos— para uma região de maioria negra, depois que os brancos fugiram para os arredores nos anos sessenta e setenta.

Hoje existem duas Baltimore que se dão as costas. “Não é algo que estamos acostumados a ver ou sentir, nem que nos preocupe”, diz Taylor, respondendo à pergunta se os brancos entram nos bairros de West Baltimore, onde em 12 de abril Freddie Gray, negro, de 25 anos, foi preso. Morreu uma semana depois. A promotora de Baltimore, Marilyn Mosby, acusou seis policiais de homicídio.

A disparidade entre a Baltimore negra e branca é, como diz o morador de Bolton Hill, cósmica. Na galáxia branca está a Universidade John Hopkins, um centro avançado de ensino e pesquisas. “Apenas seis milhas separaram os bairros de Roland Park e Hollins Market”, disse há alguns anos Jonathan Bagger, vice-reitor da John Hopkins, fazendo referência aos 10 quilômetros entre um bairro rico e outro pobre. “Mas a diferença na expectativa de vida é de 20 anos.” Em Sandtown-Winchester, o bairro de Freddie Gray, a expectativa de vida é de 69,7 anos, o mesmo nível do Iraque. Desde janeiro, foram registrados 74 homicídios em toda Baltimore, uma cidade de 620.000 habitantes. Em 2014, houve 17 homicídios em Madri, uma cidade de mais de três milhões de habitantes. Nos Estados Unidos, os negros representam 13% da população e 30% das vítimas dos disparos da polícia.

Com nuances, as estatísticas citadas não são exclusivas de Baltimore: basta apenas se deslocar alguns quilômetros da Casa Branca para descobrir problemas semelhantes nos bairros de Washington.

Mas em Baltimore, onde os principais cargos políticos, do judiciário e da polícia são ocupados por negros, é preciso considerar certas sutilezas quando se buscam explicações unicamente racistas.

Alguns bairros, com residências abandonadas e casarões, parecem uma paisagem afetada por uma catástrofe natural. Tudo isso não começou agora, mas muito antes, com a desindustrialização, a epidemia do crack, a delinquência local e a repressão policial e, na década passada, com os abusos das hipotecas de alto risco, que atingiram as minorias.

Todos os negros entrevistados em Baltimore conhecem alguém que passou pelo vendaval. Em uma livraria nos arredores, Natashia Heggins lembra da mãe, professora, acompanhando as alunas ao médico: estavam grávidas.

“Estávamos esperando, estávamos esperando”, repete, ao comentar os confrontos, Keyon Johnson, morador de Oliver, um bairro de negros na periferia. Johnson, de 32 anos, diz que muitos amigos de infância morreram. Ele conseguiu se salvar através do basquete. Agora promove atividades esportivas para as crianças do bairro.

Em um escritório de advocacia central, o advogado negro Derrick Hamlin —terno listrado, lenço e gravata borboleta: um dândi da periferia— lembra sua juventude. “Se você via a polícia, saía correndo”, diz. Foi preso duas vezes quando menor e outra quando já era maior de idade.

“Meu pai passou parte da minha infância na prisão. Foi preso pelo menos 15 vezes, num período de 20 anos, por roubar um banco, assaltos ou drogas”, diz. Foi sua mãe quem o criou e o salvou. Entrou na universidade: em seu escritório estão pendurados diplomas de química e direito. A ausência dos pais é um traço comum na América negra.

Hamlin assumiu a defesa de alguns jovens presos nos distúrbios. “Não aprovo o vandalismo nem a destruição, mas entendo a ira”, escreveu. O passeio por Baltimore termina em um restaurante tailandês de um bairro burguês. Os clientes são brancos. As telas de TV estão sintonizadas na CNN, que faz a cobertura diretamente do local dos protestos. Parece um país remoto, mas está a menos de dez minutos de carro. Antes das 21h, com as pessoas ainda comendo, a garçonete traz a conta. “É por causa do toque de recolher”, explica.

Baltimore não é o Iraque nem a lua: está a 70 quilômetros da Casa Branca.

A cidade que matou o nazismo

DCM

por : Paulo Nogueira

Na Batalha de Stalingrado Hitler começou a desmoronar, e Drummond reconheceu isso num poema pungente.

E eis que a vitória russa sobre os alemães em Stalingrado completa 70 anos.

Hitler foi batido ali.

Os nazistas jamais se recuperaram da Batalha de Stalingrado, uma das mais sanguinolentas na história militar. Foram 2 milhões de mortos. A aura de invencibilidade alemã, tão vital no início da II Guerra, perdeu-se em Stalingrado.

Churchill e os ingleses ofereceram resistência épica aos nazistas, mas quem os derrotou foram os russos.

No Brasil, o poeta Carlos Drummond de Andrade dedicou um poema à cidade que dobrou os joelhos do nazismo, chamado Carta a Estalingrado.

O Diário se orgulha de publicá-lo, em memória dos que tombaram para que a humanidade se livrasse do nazismo.



CARTA A STALINGRADO

Stalingrado…
Depois de Madri e de Londres, ainda há grandes cidades!
O mundo não acabou, pois que entre as ruínas
outros homens surgem, a face negra de pó e de pólvora,
e o hálito selvagem da liberdade
dilata os seus peitos, Stalingrado,
seus peitos que estalam e caem,
enquanto outros, vingadores, se elevam.

A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais.
Os telegramas de Moscou repetem Homero.
Mas Homero é velho. Os telegramas cantam um mundo novo
que nós, na escuridão, ignorávamos.
Fomos encontrá-lo em ti, cidade destruída,
na paz de tuas ruas mortas mas não conformadas,
no teu arquejo de vida mais forte que o estouro das bombas,
na tua fria vontade de resistir.

Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos, resistes.
Que quando abrimos o jornal pela manhã teu nome (em ouro oculto) estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e aviões, mas valeu a pena.
Saber que vigias, Stalingrado,
sobre nossas cabeças, nossas prevenções e nossos confusos pensamentos distantes
dá um enorme alento à alma desesperada
e ao coração que duvida.

Stalingrado, miserável monte de escombros, entretanto resplandecente!
As belas cidades do mundo contemplam-te em pasmo e silêncio.
Débeis em face do teu pavoroso poder,
mesquinhas no seu esplendor de mármores salvos e rios não profanados,
as pobres e prudentes cidades, outrora gloriosas, entregues sem luta,
aprendem contigo o gesto de fogo.
Também elas podem esperar.

Stalingrado, quantas esperanças!
Que flores, que cristais e músicas o teu nome nos derrama!
Que felicidade brota de tuas casas!
De umas apenas resta a escada cheia de corpos;
de outras o cano de gás, a torneira, uma bacia de criança.
Não há mais livros para ler nem teatros funcionando nem trabalho nas fábricas,
todos morreram, estropiaram-se, os últimos defendem pedaços negros de parede,
mas a vida em ti é prodigiosa e pulula como insetos ao sol,
ó minha louca Stalingrado!

A tamanha distância procuro, indago, cheiro destroços sangrentos,
apalpo as formas desmanteladas de teu corpo,
caminho solitariamente em tuas ruas onde há mãos soltas e relógios partidos,
sinto-te como uma criatura humana, e que és tu, Stalingrado, senão isto?
Uma criatura que não quer morrer e combate,
contra o céu, a água, o metal, a criatura combate,
contra milhões de braços e engenhos mecânicos a criatura combate,
contra o frio, a fome, a noite, contra a morte a criatura combate,
e vence.

As cidades podem vencer, Stalingrado!
Penso na vitória das cidades, que por enquanto é apenas uma fumaça subindo do Volga.
Penso no colar de cidades, que se amarão e se defenderão contra tudo.
Em teu chão calcinado onde apodrecem cadáveres,
a grande Cidade de amanhã erguerá a sua Ordem.

[*] Extraído do livro A Rosa do Povo (poemas escritos entre 1943 e 1945). Rio de Janeiro: Record, 1987